Monitoramento por satélite mostra expansão da seca, enquanto estudos concluem que falta capacidade institucional dos municípios da região para enfrentar o problema
A seca causa profundos impactos sociais, econômicos e ambientais ao Nordeste brasileiro. Estudos mostram que falta capacidade institucional dos municípios da região para enfrentar a seca. Por essa razão, é necessário atuar no planejamento estruturado de ações para a convivência com a seca, utilizando informações seguras de monitoramento desses eventos climáticos e evitando maiores danos e prejuízos à região.
Uma radiografia da expansão da seca nos municípios nordestinos com mapas atualizados da cobertura vegetal da região é o foco de uma série especial em quatro partes publicada, a partir de hoje, pelo Nossa Ciência. O material foi publicado originalmente pelo site Letras Ambientais. O conjunto de informações, obtido por meio de monitoramento por satélite, foi reunido pelo Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis). O trabalho mostra que a maioria dos municípios do Nordeste brasileiro já enfrenta situação de seca grave ou moderada. Imagens de satélites inéditas mostram que, no início de agosto, 53% dos municípios do Nordeste enfrentam seca – 952 do total de 1.794 municípios da região.
Ações emergenciais
Uma pesquisa recente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), sobre o Perfil dos Municípios Brasileiros (Munic), mostrou que, no período de 2013 a 2016, a região Nordeste apresentou a maior proporção de municípios afetados pela seca (82,6%). Do total de 1794 municípios do Nordeste, foram registrados eventos de seca em 1481 deles.
Apesar de esses eventos climáticos serem frequentes, intensos e com profundos impactos socioeconômicos no Nordeste, a pesquisa do IBGE mostra que apenas 15,7% dos municípios da região possuem um plano específico de contingência e/ou prevenção à seca.
A maioria dos municípios da região adota ações emergenciais para evitar ou minimizar os danos causados pela seca. Uma das ações mais comuns, segundo o estudo, é a distribuição regular de água, através de caminhões-pipa, adotada em 65,5% dos municípios da região. Em seguida, está a construção de poços (61%) e de cisternas (49%).
Um século de secas
O pesquisador Humberto Barbosa, coordenador do Lapis, ressaltou que essa falta de planejamento nos municípios, para o enfrentamento da seca, é o que faz com que o evento climático se torne desastre natural. Ele comenta: “mesmo esses 15% dos municípios que possuem um plano específico para lidar com a seca, ainda não analisamos o teor e a qualidade desse instrumento de planejamento, ou seja, não sabemos se realmente as ações planejadas fogem da pauta emergencial, em direção a um projeto permanente para convivência com a seca”.
Barbosa é um dos autores do Livro “Um século de secas: por que as políticas hídricas não transformaram o Semiárido brasileiro?” e destacou: “Na obra, observamos que, historicamente, a ausência de participação social no processo de planejamento das políticas para a região semiárida foi um dos fatores comuns para que a seca continue sendo enfrentada apenas com ações emergenciais. No entanto, são fundamentais ações estruturais e coordenadas para que a população possa conviver melhor com a seca”.
Prejuízos e danos materiais
Segundo um Relatório do Centro de Estudos e Pesquisas em Engenharia e Defesa Civil (Ceped), no período de 1995-2014, os danos materiais e prejuízos (públicos e privados) causados por desastres naturais, derivados de eventos climáticos no Brasil, foram estimados em R$ 100 bilhões. Deste total, cerca de 75% estão diretamente vinculados às estiagens e secas, a afetarem frequentemente o Nordeste e as demais regiões do Brasil.
No Nordeste, o custo total de danos e prejuízos, derivados de eventos climáticos, foi cerca de R$ 47 bilhões. O valor inclui os prejuízos privados nos setores da agricultura, pecuária, indústria e serviços.
Na estação chuvosa de 2018 (fevereiro a maio), as chuvas atingiram a maior parte dos municípios do Semiárido brasileiro, aliviando a seca que já durava sete anos. No entanto, o meteorologista Humberto Barbosa explicou que o volume de chuvas foi inferior à média histórica, sobretudo nos estados da parte sul do Nordeste (parte de Pernambuco, Alagoas, Bahia e parte do sul do Piauí). “Essas chuvas foram insuficientes para diminuir o déficit de precipitação que a região vem sofrendo há sete anos, decorrentes dos impactos das secas meteorológica e hidrológica nos anos anteriores”, observou.
Recentemente, o IBGE divulgou os primeiros resultados do novo Censo Agropecuário. A região Nordeste foi a única a registrar queda na área destinada à produção agropecuária. No período de 2006 a 2017, a área ocupada pela agropecuária avançou 5% no Brasil, ocupando 16,6 milhões de hectares adicionais, área maior que a do estado do Ceará (14,9 milhões de hectares). No Nordeste, porém, houve uma redução de 9,9 milhões de hectares na área de produção agropecuária, o que equivale a aproximadamente o estado inteiro de Pernambuco a menos na agropecuária local. Os sete anos de seca na região influenciaram diretamente essa redução.
O gráfico a seguir mostra o atual ranking da seca nos estados do Nordeste, com os respectivos números de municípios afetados pelo evento climático.
Mapas da seca
Na sequência, apresenta-se uma radiografia da seca em cada estado do Nordeste, vista a partir de mapas. Dentre os temas abordados, estão: a condição da cobertura vegetal dos municípios, antes e depois da seca deste ano; os danos e prejuízos causados pela seca; os estados mais afetados e aqueles mais preparados para evitar que esses eventos climáticos tomem proporções de desastre natural.
Os dados utilizados são oriundos do satélite Meteosat-11, com metodologia desenvolvida pelo Lapis, que determina diariamente o Índice de Vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) para a região. A metodologia utilizada para o monitoramento ambiental por satélite, das áreas mais secas do Brasil, consta no Livro “Um século de secas”.
Os mapas animados comparam e analisam a condição da cobertura vegetal de cada estado do Nordeste (Ceará, Piauí, Paraíba, Rio Grande do Norte, Bahia, Alagoas, Sergipe, Pernambuco e Maranhão), no período da estação chuvosa (abril a maio) e no início da seca (julho a agosto).
Leia:
Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites
Outras matérias da série
Rio Grande do Norte, Bahia e Alagoas
Sergipe, Pernambuco e Maranhão
Fonte: Site Letras Ambientais
Se não há nenhuma melhora após a transposição do Rio São Francisco, o que adiantou afinal?