Sensores virtuais para detectar vazamentos e furtos de água Inovação

terça-feira, 21 junho 2022

Cientistas da UFPB aplicam algoritmos em sensores virtuais e percentual de acerto ultrapassa a casa dos 98%

Cientistas da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) aplicaram algoritmos de Inteligência Artificial (AI) que podem detectar vazamentos e furtos de água em sistemas automatizados de abastecimento, por meio de sensores virtuais com respostas dinâmicas muito rápidas e nível de acerto que ultrapassa a casa dos 98%.

Enquanto o algoritmo Fuzzy controla a pressão da bombagem da água na rede de distribuição, reduzindo perdas reais e aumentando a eficiência energética em até 30%, Redes Neurais Artificiais (RNA), que também são algoritmos, estimam a vazão, ou seja, o volume que escoa pelas tubulações, facilitando a identificação de furtos, por meio da comparação entre o valor medido na rede e o estimado pela aplicação matemática em determinada região.

No estudo, foi verificado que o controlador Fuzzy tem eficiência de pelo menos 99,21% em regime permanente. Já as Redes Neurais Artificiais (RNA) têm acerto médio de 98,28%.

Apesar da implementação da automatização de uma estação de bombagem ser relativamente cara, esta metodologia permite diminuir a quantidade de sensores de vazão de água ao longo de todo sistema de distribuição, promovendo economia na aquisição e implantação desses dispositivos.

A aplicação não requer o conhecimento do modelo matemático da instalação do sistema de abastecimento e deve ser configurada por um especialista, considerando as peculiaridades de cada rede de distribuição.

“Até onde sei, não há empresa no Brasil que aplique esta técnica de medição e modelagem utilizando Redes Neurais Artificiais, pois é necessário que o sistema de abastecimento seja automatizado, realidade ainda incipiente no país”, afirma Thommas Flores, egresso do curso de mestrado do Programa de Pós-graduação em Engenharia Elétrica da UFPB e principal autor do estudo.

Segundo o cientista da UFPB, os sistemas de abastecimento de água são aleatórios e variantes no tempo, a depender do horário de consumo, condições dos ductos, do motor bomba, de acessórios e vazamentos. Além disso, os custos de implementação de sistemas de medição, como no caso dos sensores de vazão, são altos e dependem dos diâmetros dos ductos.

“O objetivo do estudo era diminuir a quantidade de sensores de vazão no sistema. Chamamos isso de virtualização ou gêmeo digital. Mas verificamos que essa virtualização também pode ser capaz de detectar vazamentos e furtos”, conta Flores.

Ele esclarece que, com a utilização da metodologia desenvolvida, é possível reduzir os gastos com sensores fixos de vazão, por conta da coleta de dados em pontos estratégicos da rede de abastecimento de água, por meio de sensores removíveis.

“Assim, é praticável modelar toda ou maior parte das vazões em função da pressão e da velocidade de rotação do conjunto motobomba”, explica o pesquisador da UFPB.

A aplicação desses algoritmos é uma alternativa à estimação indireta e de controle de sistema, comumente usada até hoje e inadequada devido às grandes variações e não linearidades das redes de abastecimento de água.

Essa estimação foi desenvolvida em 1994, por Roman Z. Moraswki, membro do Instituto de Engenheiros Eletrotécnicos e Eletrônicos (IEEE), organização profissional sem fins lucrativos fundada nos Estados Unidos da América (EUA).

A medição indireta é uma técnica que utiliza o valor de uma ou de mais variáveis para estimar o valor de outra, sendo necessário algum tipo de relação entre elas. No caso dos sistemas de bombeamento de água, há uma relação entre a velocidade de rotação do conjunto motobomba e a vazão e a pressão, estabelecida por meio de equações matemáticas.

“Essas equações consideram que o sistema permanece imutável durante todo tempo, fato que não é constatado, pois um sistema de abastecimento de água sofre desgastes, entupimentos e novas conexões”, enfatiza Thommas Flores.

De acordo com o egresso da UFPB, os algoritmos de Inteligência Artificial (IA) foram treinados a partir de dados da pressão e de velocidade de rotação como entradas e a vazão em um determinado ponto da rede como saída.

A escolha dessas variáveis é devido à necessidade metodológica de utilizar variável manipulada (velocidade de rotação) e variável controlada (pressão da rede) para estimar uma terceira, neste caso, a vazão.

Um trabalho científico como este é importante devido ao recorrente contexto de crises hídricas e de muito desperdício de água no país. Pesquisa de 2020 do instituto Trata Brasil aponta que 38,3% da água potável e tratada em terras tupiniquins é perdida no caminho entre as estações e as casas dos cidadãos. Esse volume de água jogado fora pode ser representado por mais de sete mil piscinas olímpicas, um desperdício que supera R$ 11 bilhões.

Além de problemas operacionais, essas perdas de água também são causadas por fraudes e por furtos. Antes da pandemia da covid-19, a diretoria de operação e manutenção da Companhia de Águas e Esgotos da Paraíba (Cagepa), responsável pela distribuição de água, coleta e tratamento de esgotamento sanitário em 83% dos municípios paraibanos, tomou uma decisão para coibir esse cenário.

Exatamente em dezembro de 2018, início do verão naquele ano, começou um trabalho intensificado de ações de combate a perdas, fraudes e furtos de água na rede de abastecimento do Estado, geralmente impulsionados em épocas de estiagem.

Outro aparente problema é o roubo de hidrômetros, provavelmente direcionados para sucatas, onde as peças são vendidas para serem derretidas. Em março deste ano, moradores do bairro do Cabo Branco denunciaram o roubo de alguns deles, que pode culminar na falta de água.

Como resposta, o gerente de suporte comercial da Cagepa, Isaías Veríssimo, afirmou, em entrevistas a veículos de comunicação de referência, que somente no bairro já existiam três registros e que casos semelhantes vinham crescendo na capital paraibana.

Embora a Cagepa tenha sido considerada, por exemplo, a segunda empresa de saneamento do país e primeira do Nordeste mais bem avaliada no site Reclame Aqui, referente aos seis primeiros meses de 2020, não são incomuns reclamações de moradores a respeito da falta de água, do serviço prestado e dos valores cobrados, às vezes, indevidos.

“O desperdício de água no Brasil se dá, em primeiro lugar, por falhas operacionais e, em segundo lugar, por conta de furtos. Chamamos as falhas operacionais de perdas reais. Os furtos e/ou não faturamento, de perdas aparentes. Essas perdas na Paraíba são de 35%. A média no país é de mais de 40%”, relata Thommas Flores.

Participaram também da aplicação de algoritmos de Inteligência Artificial (IA) que podem detectar vazamentos e furtos de água os professores da UFPB Juan Moises Mauricio Villanueva e Heber Pimentel Gomes e o docente da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Sebastian Y. C. Catunda.

Os resultados do estudo foram publicados, recentemente, por meio de artigo científico em periódico de alto impacto do Multidisciplinary Digital Publishing Institute (MDPI), editora suíça de periódicos científicos de acesso aberto.

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