Pesquisador da área de petróleo quer aproximar inovação e mercado

quinta-feira, 29 outubro 2015

André Maitelli, que juntamente com sua equipe ganhou o Prêmio Inventor Petrobras em duas edições, acredita que faltam incentivos para que as empresas utilizem ainda mais os projetos desenvolvidos na universidade

Quem anda na cidade de Mossoró e vê as hastes das Unidades de Bombeio mecânico da Petrobras, também conhecidas como cavalos de pau, subindo e descendo não tem ideia de quanto de ciência, tecnologia e inovação é necessário para fazê-las funcionar. O professor André Laurindo Maitelli, do Departamento de Engenharia da Computação e Automação (DCA) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), sabe. Desde 2001 ele vem atuando no desenvolvimento de pesquisas aplicadas na área de petróleo.

Há 15 anos, ele e o grupo de pesquisa que coordena desenvolvem programas de computador, produtos tecnológicos, processos e técnicas, além de vasta produção científica para melhorar a eficiência não só dos poços terrestres, mas também dos poços localizados no mar. Os resultados são notáveis. Maitelli foi laureado duas vezes com o Prêmio Inventor Petrobras, em 2013 e 2015 e tem participação ou coparticipação na patente de seis produtos, além da orientação de dissertações e teses na área.

Embora diferentes, os dois prêmios do pesquisador têm aplicações no método chamado Bombeio Centrífugo Submerso (BCS), que é usado para extração de petróleo em poços de alta vazão, localizados no mar, com produção de até 100 mil barris por dia. O primeiro prêmio, recebido em 2013 numa cerimônia no Centro de Pesquisas da Petrobras, no Rio de Janeiro, foi referente ao Sistema de controle automático de bombeio centrífugo submerso para poços de petróleo. “Ele está relacionado ao controle, visando a otimização da produção, preservando os equipamentos que compõem o poço equipado com esse método BCS”, explica o professor Maitelli. Esse sistema contribuiu para que o grupo conquistasse o 2º lugar no Prêmio Finep na categoria ICT Região Nordeste, também em  2013.

Agora em 2015, o Prêmio foi para o Sistema de comunicação de dados via Rede Elétrica para um motor de indução trifásico utilizado no método de elevação artificial do tipo Bombeio Centrífugo Submerso. Agora o grupo tinha o objetivo de projetar e instalar no sistema BCS um conjunto de sensores que permitisse a observação do nível de contaminação do óleo do motor pelo óleo de produção e, assim, evitar a queima do motor, promovendo a manutenção preventiva deste. Um importante desafio vencido nesta tarefa foi o envio do sinal do sensor até a superfície para o seu condicionamento e processamento ou para o envio do sinal de grau de contaminação. O grupo testou e verificou a viabilidade da utilização do próprio cabo de alimentação do motor para este fim, ou seja, foi o sistema de transmissão de dados via rede elétrica a grande inovação.

Terrestre

Outro produto tecnológico desenvolvido pelo grupo, e que está em uso desde 2007, é o SISAL (Sistema de Supervisão da Elevação Artificial), um software de supervisão para monitorar poços de petróleo automatizados com diferentes métodos de elevação. Atualmente mais de sete mil poços, praticamente toda a automação de poços terrestres no Brasil é supervisionada por esse programa. “Esse software que a gente desenvolveu tem um impacto muito grande porque está sendo aplicado não só aqui no Rio Grande do Norte e Ceará, mas também em Sergipe, Alagoas, Espírito Santo e Bahia”, revela o pesquisador. O grupo já desenvolveu outros 12 programas de computador para diversas aplicações.

Apesar de tão profícua produção, o professor Maitelli não se sente confortável sobre o futuro dos protótipos desenvolvidos por seu grupo. “Ainda não se definiu na prática – e isso é um ponto importante – um bom modelo de transferência de tecnologia com uma lei que a universidade possa ser beneficiada também de alguma forma com esses produtos, seja sob a forma de royalties ou sob forma de reinvestimento em projetos.”

Financiadas com recursos da Petrobras e Finep, na ordem de 60% e 40%, respectivamente, as pesquisas, cuja origem está no projeto Automação de Poços, consumiram em torno de R$ 20 milhões nesses 15 anos. Desse valor, cerca de R$ oito milhões foram investidos em outras instituições que integram a Rede Cooperativa de Pesquisa em Instrumentação e Controle (Redic) e o restante ficou na UFRN. Além de bolsas para os pesquisadores e equipamentos, o projeto permitiu a criação de infraestrutura que ficará na universidade, com a construção de quase dois mil metros quadrados de laboratórios. As pesquisas resultantes nos prêmios e patentes são realizadas nos Laboratórios de Automação em Petróleo (LAUT), de 620 metros quadrados e de Avaliação e Medição em Petróleo (LAMP), com 1200 metros quadrados. “Esse foi um benefício que a universidade teve que vai ficar para outros pesquisadores que possam vir. Nós sempre nos preocupamos com o investimento em infraestrutura, somos um dos grupos que mais contribuiu com isso”, orgulha-se. Há cinco anos, o grupo é formado por cerca de 10 professores de vários departamentos da UFRN.

Definição de papéis

Embora admita que a parceria entre a academia e a Petrobras tem funcionado bem, o pesquisador acredita que ainda falta um terceiro agente social para que o conhecimento gerado na universidade e aplicado na Petrobras seja difundido. Como exemplo, aponta o sensor que acabou de ser patenteado conjuntamente pela Petrobras e UFRN. “Se alguém se interessar, vamos sair de um protótipo para um produto que pode ser multiplicado em milhares de unidades. Nem a Universidade e nem a Petrobras tem perfil de empresas que vão produzir milhares de produtos. Tem que ter um terceiro agente e a gente tem tido dificuldade para encontrar esse terceiro agente que se interesse em transformar o protótipo, que já teve sua viabilidade testada, que tem uma aplicação muito promissora em produto de mercado.”

Esse papel de transformar um protótipo em produto cabe às empresas, na opinião do pesquisador, mas elas não têm tido interesse em apostar na inovação brasileira, preferindo a importação de produtos que poderiam ser desenvolvidos no Brasil. “O empresário tem a visão de que a universidade deve desenvolver o projeto com responsabilidade de gerar um produto do início ao fim: conceber a tecnologia, testar em laboratório, aplicar em campo e disponibilizar um produto acabado. Na maioria das vezes esse não é o papel da universidade.”

A existência de programas de incentivo que beneficiassem empresas investidoras na produção de produtos desenvolvidos nas universidades brasileiras poderia mudar a cultura comportamental da indústria nacional, a exemplo do que ocorre com os Fundos Setoriais na área de petróleo, que obrigam as empresas a investir. Essa é a sugestão do pesquisador para fomentar o investimento privado na pesquisa e na inovação brasileira. Ele reconhece que muitos protótipos desenvolvidos por grupos de pesquisa ficam engavetados nas universidades pela falta do que chama de terceira fase. “Quantos trabalhos de graduação, de pós graduação poderiam se transformar em belíssimos produtos beneficiando a sociedade e não se transformam porque simplesmente falta esse elo?, questiona e reconhece que o seu grupo ainda é privilegiado porque tem contato com empresas, com os problemas, enquanto outros grupos nem isso tem. “Ficam isolados produzindo artigos e falta inclusive uma visão de que aquilo pode se transformar ou quais são as ações que aquele grupo de pesquisa pode tomar para que aquilo se transforme em benefício para a sociedade.”

Reconhecimento

Se por um lado a inciativa privada não tem interesse em investir na produção de tecnologia nacional e o governo não cria leis de incentivo para mudar a cultura, por outro lado a própria estrutura acadêmica brasileira não estimula a inovação nas universidades. A carreira do professor universitário não recebe incentivo pela prática da inovação. Isso é o que afirma o professor Maitelli. Ele diz que há uma tentativa de valorização da inovação e a incorporação da palavra na definição do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação demonstra isso, mas o discurso tem mais peso que a ação. “A gente está falando aqui da patente, do reconhecimento, mas se você for olhar em termos de Capes, de CNPq, o que eles reconhecem mesmo é publicação de artigos.”

Com a certeza da redução do investimento de recursos da Petrobras em pesquisa e desenvolvimento nos próximos anos, em virtude da crise econômica por que passa o país, o coordenador da Redic ajusta o foco no futuro para continuar as pesquisas. O grupo está em vias de estabelecer um projeto com uma empresa fabricante de motores elétricos, em Santa Catarina, a Weg e ainda tem possibilidades de projetos financiados por outras empresas privadas do setor de tecnologia, que podem usar os benefícios fiscais do conjunto de leis chamadas Lei da Informática (leis 8.248/91, 10.176/01, 11.077/04 e 13.023/14) para investir em Pesquisa e Desenvolvimento. Os resultados de alto impacto conseguidos pelo grupo são boas credenciais para captar recursos que são destinados especificamente à região nordeste na Lei da Informática.

Apesar das indefinições quanto ao financiamento, o grupo continua trabalhando. O depósito de uma patente ligada a controle de velocidade de Pigs, que são instrumentos que fazem inspeção em dutos de petróleo dá a certeza de que a inovação mora no DCA. Os Pigs correm nos dutos para inspecionar a existência de corrosão, a espessura da tubulação e outros problemas. O controle da velocidade desse instrumento vai evitar a perda de qualidade na coleta dos dados.

Mais inovação

Dois softwares desenvolvidos pelo grupo estão praticamente no ponto de serem disponibilizados para serem aproveitados para o mercado. Ambos com aplicações para a melhoria da eficiência da produção seja em refinarias ou em elevação artificial. O Expertuning que é um software nos modos do Sisal, porém com outro foco de aplicação, está concluído.

O outro software, que tem apoio da Finep e participação da Rede de Tecnologia, a mesma empresa que produz o Sisal, está em fase de conclusão. A torcida e o esforço agora é que empresas privadas se interessem em produzi-lo comercialmente. “É muito desanimador, às vezes, a gente observar que um produto promissor é desenvolvido, e quando acaba o projeto, o produto fica encostado e as pessoas vão trabalhar com outras coisas, sendo que aquele produto poderia crescer, poderia trazer benefícios à sociedade, reduzir custos da Petrobras, substituir outros softwares que são comprados a pesos de ouro de fora.”

Ciência, tecnologia e inovação são áreas de grande retorno dos investimentos feitos, argumenta. Mas para isso é preciso que o país defina uma política de estado e não de governo, é preciso que defina as diretrizes e estabeleça as condições de sua execução. “A gente tem muito potencial, só falta aproveitar melhor esse potencial, que certamente a gente vai crescer muito enquanto país”, finaliza.

Prêmio

O Prêmio Inventor Petrobras 2015 foi concedido à equipe formada pelos professores André Laurindo Maitelli, Andrés Ortiz Salazar, ambos do DCA, Francisco Assis de Oliveira Fontes, do Departamento de Engenharia Mecânica, Filipe de Oliveira Quintaes, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte, doutorando do Programa de Pós Graduação em Ciência e Engenharia de Petróleo da UFRN à época do desenvolvimento do sistema, e pelos engenheiros da Petrobras Antônio Pereira Júnior e Elias Karbage.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Site desenvolvido pela Interativa Digital