Mosca é capaz de se estabelecer em áreas irrigadas do Semiárido. Resultado é importante porque a região abriga importante polo produtor e exportador de frutas
Recente estudo evidenciou condições favoráveis para uma potencial adaptação da mosca-da-carambola (Bactrocera carambolae) em dois perímetros irrigados do Vale do Rio São Francisco: Bebedouro, em Petrolina (PE), e Mandacaru, em Juazeiro (BA). Trata-se do primeiro trabalho científico que evidencia a possibilidade de adaptação do inseto fundamentado em fatores climáticos de duas áreas irrigadas nessa região do Semiárido. O resultado é particularmente valioso porque o Vale do São Francisco abriga importante polo produtor e exportador de frutas. Realizado em parceria entre Embrapa Semiárido, em Pernambuco, e Embrapa Meio Ambiente, Embrapa Gestão Territorial, ambas no Estado de São Paulo, o estudo recomenda o monitoramento da praga na região.
No Brasil, a mosca-da-carambola foi detectada e restrita somente aos estados de Roraima, Amapá e norte do Pará (divisa com sul do Amapá), onde ações do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) são realizadas visando à erradicação e barrando a dispersão para novas áreas. Especialistas da Embrapa, que executam ações dentro do programa do Mapa, já listaram 21 espécies vegetais que podem servir de hospedeiras alternativas para o inseto, incluindo espécies nativas. A preocupação com regiões exportadoras de frutas é grande, pois a presença da praga pode ser utilizada como barreira fitossanitária para países que compram frutas brasileiras.
Ao contrário do que previam estudos recentes, que não contemplaram condições climáticas específicas promovidas pelo uso de irrigação na região semiárida, este trabalho considerou nas análises de dados temperatura média (Tmed) e umidade relativa média (URmed) anuais das estações meteorológicas localizadas em duas áreas irrigadas de perímetros. A pesquisa também utilizou informações climáticas das áreas já atacadas por mosca-da-carambola no Estado do Amapá e estudos recentes de condições de adaptabilidade do inseto em uma de suas fruteiras hospedeiras presentes na região.
Risco de dispersão
Esses resultados fundamentaram cruzamentos georreferenciados que permitiram traçar o mapa de áreas brasileiras com potencial para o inseto. Os dados obtidos evidenciaram condições ótimas para o estabelecimento do inseto, como também condições marginais, as quais, embora não sejam ideais para a praga, também são capazes de a abrigar. Caso o inseto saia das áreas em que está sendo contido pelo Mapa, encontrará ambiente favorável ao seu desenvolvimento nessas áreas de perímetros irrigados do Semiárido especialmente por causa da oferta de fruteiras hospedeiras preferenciais: goiaba, acerola e manga. Os pesquisadores também chamam a atenção para o recente registro de hospedeiros nativos da praga presentes na região Amazônica, o que potencializaria o risco de dispersão.
Como o inseto se estabelece preferencialmente em locais com alta umidade relativa do ar, o clima do Semiárido, com baixas precipitações de chuva e baixas umidades relativas anuais, era considerado uma barreira natural para a praga. No entanto, o estudo revelou que, apesar das baixas pluviosidades, o uso de irrigação por aspersão convencional e microaspersão gera condições climáticas propícias para a adaptação do inseto.
Com isso, a pesquisa evidenciou que a influência da irrigação no microclima pode criar condições para que uma região passe de pouco favorável para adequada ao potencial estabelecimento de uma praga. As alterações no microclima também podem interferir nas ações de controle, por isso os pesquisadores recomendam que elas sejam consideradas nas estratégias de Manejo Integrado de Pragas (MIP).
Características biológicas
Os perímetros irrigados de Bebedouro e Mandacaru são os mais antigos da Região Integrada de Desenvolvimento (RIDE) e fazem parte dos Polos de Desenvolvimento Tecnológico da Fruticultura Irrigada do Vale do São Francisco. A pesquisa apreciou os dados, de 1965 a 2014, de duas estações meteorológicas localizadas nesses dois perímetros irrigados. Foram consideradas as características biológicas do inseto e suas faixas de desenvolvimento ótimo (gráficos abaixo).
A pesquisadora da Embrapa Maria Conceição Pessoa, uma das autoras do estudo, informa que os índices das médias de temperatura e umidade relativa observadas nos dois perímetros indicaram condições favoráveis ao desenvolvimento de fases imaturas do inseto, com maiores percentagens de sobrevivência e maior número médio de emergência da mosca na cultura de goiaba.
A cientista ressaltou que essas áreas de fruteiras irrigadas por microaspersão e aspersão convencional do semiárido devem ser monitoradas e consideradas nas ações estratégicas do Programa Nacional de Erradicação da Mosca-da-Carambola (Pnemc), coordenado pelo Mapa. Ela frisou que não existe indicativo de corredores que possam conduzir a praga das áreas atacadas para regiões produtoras do Médio São Francisco em curto prazo. “Entretanto, o estudo destaca a preocupação com essas áreas pela constatação de existência de novos hospedeiros alternativos nativos, identificados na Amazônia pela equipe da Embrapa Amapá ainda em 2014,” relata.
Para a pesquisadora, os indicativos sinalizam a necessidade de se redobrar a atenção e as ações preventivas em possíveis áreas de risco, com presença de novos hospedeiros, fora das áreas já priorizadas pelas ações de monitoramento em curso. “Nesse caso, a dispersão do inseto poderia ser favorecida, se não corretamente identificado nessa nova gama de plantas hospedeiras nativas”, alerta.
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