Pesquisadores da UFPE encontraram um segmento de vértebra da cauda que pode ser de um dilofossauro
Alunos do curso de Geologia e do Programa de Pós-Graduação em Geociências (PPGeoc) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) descobriram, durante uma escavação na Formação Aliança, que faz parte da Bacia Jatobá, próxima ao município de Ibimirim, no Sertão de Pernambuco, um segmento de vértebra da cauda pertencente ao dinossauro mais antigo já encontrado no Nordeste do Brasil até hoje, comparável ao gênero Dilophosaurus. A descoberta foi feita durante o mestrado de Leonardo Marinho de Oliveira, no PPGeoc, ainda em 2019, orientado pelo professor Édison V. Oliveira e coorientado pelo professor Gelson Luís Fambrini, ambos do Departamento de Geologia da UFPE, contudo somente agora, quase três anos depois, foi possível analisar a vértebra mais cuidadosamente e verificar a que grupo taxonômico ela pertence e a sua provável idade. Atualmente, Leonardo Marinho está cursando o doutorado, continuando a pesquisa do mestrado, desta vez orientado pelo professor Gelson Luís Fambrini e coorientado por Édison V. Oliveira.
A Formação Aliança já tinha sido definida anteriormente por outros pesquisadores como do período Jurássico, mas, até então, nenhum fóssil de dinossauro tinha sido encontrado no local. Este foi o primeiro. “Há 11 anos que trabalhamos [ele e o professor Édison Oliveira] na Formação Aliança, sabendo que a região é do Jurássico, pois sou geólogo e estratígrafo [que estuda as camadas rochosas visando determinar quando e como se formaram], período no qual os dinossauros povoavam a Terra, então é uma alegria imensa encontrarmos finalmente este fóssil que reforça a idade jurássica da Formação Aliança e aumenta o seu range, passando a abranger do Jurássico Superior (que vai de 163,5 a 145 milhões de anos) para o Jurássico Médio (de 174,1 a 163,5 milhões de anos, em valores arredondados)”, explana o professor Gelson Fambrini, que, além da coorientação, fez a descrição da idade do fóssil durante a pesquisa.
De acordo com o professor Édison Oliveira, ainda é necessário que mais escavações sejam feitas para que encontrem mais partes do mesmo dinossauro ou de outros organismos jurássicos no mesmo estrato rochoso e, assim, possam confirmar que a vértebra seja mesmo de um dilofossauro. Entretanto, foram realizadas medições e comparações entre ela e uma de um dilofossauro que foi encontrado nos Estados Unidos, e a conclusão é que são muito similares. “Foi Leonardo [Marinho] que, lendo um artigo científico que abordava o dinossauro americano, lembrou da vértebra encontrada na Formação Aliança e achou que eram parecidas. Em princípio, quando a encontramos na época, achávamos que era de um crocodilo, como várias outras que temos. Foi uma felicidade imensa medirmos e descobrir que pode ser de um dilofossauro”, explica o professor Édison Oliveira. Alunos da graduação em Geologia, como Gustavo Dias e Radarany Muniz dos Santos, estavam também presentes na escavação e contribuíram muito com as pesquisas. No final de maio, os pesquisadores voltaram à Formação Aliança para continuarem as pesquisas.
O resultado foi publicado no artigo “The first dinosaur from the Jurassic Aliança Formation of northeastern Brazil, west Gondwana: a basal Neotheropoda and its age and paleobiogeographical significance“, na revista científica Journal of South American Earth Sciences. Os pesquisadores ainda não usaram datação radiométrica na rocha onde a vértebra foi encontrada, por ser um processo muito caro, mas a expectativa é que, com essa importante descoberta, novos financiamentos sejam conseguidos para poderem fazer uso dessa análise e também novas viagens sejam feitas para o local das escavações. A pesquisa hoje foi realizada por taxonomia, ou seja, baseando-se no animal.
Fóssil mais antigo
Se for confirmada a hipótese, a vértebra pode ser identificada como pertencente ao grupo de dinossauros primitivos e raros, os neoterópodes basais (é chamado de “basal” por estar na base dos terópodes e “neo” por ser do grupo dos mais novos). Até hoje só foram encontrados esses fósseis nos Estados Unidos, Antártica, África do Sul e agora na Formação Aliança, no Brasil, ou seja, este é o quarto fóssil desse tipo encontrado no mundo inteiro.
Segundo Fambrini, se for confirmada a hipótese de a espécie ser mesmo um dilofossauro, além de ratificar a idade jurássica da Formação Aliança, como citado anteriormente, também mostra que o organismo tinha um maior alcance paleobiogeográfico (vivia nos Estados Unidos, Tanzânia, Antártica e Brasil) reforçando o caráter de pré-abertura do Atlântico, e ainda confirma que a linhagem perdurou por mais tempo do que se pensava.
De acordo com Oliveira, uma outra hipótese a ser avaliada na dependência de novas coletas de outros fósseis é que a Formação Aliança poderia ser ainda mais antiga, chegando até o Jurássico Inferior (201,3 a 174,1 milhões de anos). “Estamos alterando o paradigma da idade da Formação Aliança. Se estivermos certos, ela se formou quando ainda era Pangeia (nome dado ao supercontinente, que existiu na Era Paleozoica, há mais de 250 milhões de anos)”, esclarece o professor Edison Oliveira, que também é coordenador do Laboratório de Paleontologia da UFPE (PaleoLAB). Essa hipótese está sendo estudada no doutorado do geólogo e paleontólogo Leonardo Marinho.
A Formação Aliança surgiu um pouco antes da separação do Brasil e da África, quando gerou uma depressão nessa região (local rebaixado em comparação ao seu entorno), que vai do sul da Bahia até o sul do Ceará, e nesse lugar culminou em um grande lago que tinha fauna continental endêmica (pertencente apenas àquele local) e animais terrestres que eram atraídos pra lá para beberem água. Nesse lago, foram se depositando várias rochas ao longo dos anos, em que se originou a Formação Aliança.
Esse é o primeiro dinossauro encontrado na Formação Aliança, mas já é o terceiro do estado de Pernambuco. O primeiro de Pernambuco foi encontrado em Araripina, por volta de 1960, e era do Cretáceo; o segundo foi encontrado em 2021, na Formação Sergi, em Petrolândia, era no final do Jurássico Superior; e agora esse da Formação Aliança, em Ibimirim, que foi encontrado em 2019, mas analisado em 2022, e provavelmente é do Jurássico Médio-Superior.
Dilofossauro não se parece com sua versão hollywoodiana
Os dilofossauros eram bípedes, carnívoros, de tamanho médio e faziam parte da família dos terópodes, grupo que deu origem às aves. Dilofossauro quer dizer “lagarto de duas cristas” e pode-se ver uma representação dele no filme de aventura e ficção científica estadunidense “Jurassic Park – Parque dos Dinossauros” (Jurassic Park, 1993), dirigido por Steven Spielberg e baseado no livro homônimo escrito por Michael Crichton, como uma espécie pequena (do tamanho de uma pessoa) que abre um tipo de barbatana retrátil em volta do pescoço e solta veneno para atacar a presa quando se sente ameaçada. No entanto, uma reportagem da revista National Geographic mostra que a história não era bem assim.
A real aparência do dilofossauro nada tem a ver com a versão hollywoodiana, como indica recente pesquisa feita pelo pesquisador americano e paleontólogo do Parque Nacional da Floresta Petrificada no Arizona, nos EUA, Adam Marsh, publicada no periódico Journal of Paleontology. De acordo com Marsh, nem o veneno nem a barbatana retrátil no pescoço que aparecem no filme têm base em evidências fósseis. Segundo a reportagem, o paleontólogo americano estudou por sete anos os três esqueletos mais completos de dilofossauro (propriedade da nação navajo e parte do acervo da Universidade da Califórnia, em Berkeley) e mais dois espécimes não estudados encontrados no território navajo há 20 anos por Timothy Rowe, paleontólogo da Universidade do Texas, em Austin, coautor da nova pesquisa e orientador de doutorado de Marsh.
A reportagem explica que esses dois fósseis mais novos, que não tinham sido estudados antes, indicam que o dilofossauro tinha maxilares fortes, ligados a músculos vigorosos. Além disso, ele possuía mais de seis metros de comprimento (metade do tamanho de um Tiranossauro Rex) e podia chegar a pesar 750 quilos, podendo capturar facilmente presas grandes do tamanho de um carro. Uma característica que o filme de Spielberg acertou foi a crista óssea dupla e delgada sobre o crânio do animal, se estendendo basicamente da narina à órbita ocular, que provavelmente servia para chamar a atenção (pode ter sido colorida em vida), usada para atrair parceiros sexuais ou intimidar rivais.
Fonte: Ascom da UFPE
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