O futuro do motor automotivo Inovação

segunda-feira, 20 junho 2022
Nos laboratórios da UFC, pesquisadores se preparam para realizar primeiros testes com motor automotivo com um cilindro adaptado para a versão HCCI a etanol (Foto: Ribamar Neto/UFC Informa)

Pesquisadores da UFC participam do desenvolvimento de motor mais eficiente e menos poluente

Pesquisadores do Laboratório de Motores de Combustão Interna (LMCI) do Departamento de Engenharia Mecânica (Centro de Tecnologia) da Universidade Federal do Ceará estão desenvolvendo um novo motor automotivo de combustão, mais eficiente, mais econômico e menos poluente que os atuais motores de combustão interna.

Trata-se de um motor do tipo HCCI, que utiliza etanol como combustível. Essa nova tecnologia gera a combustão de gasolina sem necessidade de uma fagulha, o que garante aos motores a gasolina uma eficiência energética semelhante à do diesel. O desafio agora é aplicá-la, pela primeira vez, em um motor a etanol, o que traria um ganho extra por se tratar de um combustível menos poluente.

O projeto do motor HCCI a etanol está sendo desenvolvido com participação da UFC e sob coordenação da Universidade Tecnológica Federal do Paraná para as empresas Renault e Magneti Marelli, no âmbito do Rota 2030, programa federal que estimula inovações para o setor automotivo nacional. O projeto terá duração de três anos e envolve investimentos de R$ 4,5 milhões.

Em jogo, o futuro do motor automotivo

O cenário da pesquisa envolve uma possível sobrevida dos tradicionais motores a combustão. Isso porque, ainda que o ronco dessas máquinas atraia uma legião de fãs, elas enfrentam graves problemas e, por isso, executivos de importantes montadoras já admitem que devem ser substituídas por motores elétricos no médio prazo.

O primeiro problema diz respeito à eficiência energética. Os melhores motores do mercado possuem uma eficiência de, no máximo, 40%. Isso significa que, de cada R$ 100,00 gastos com combustível, apenas R$ 40,00 são utilizados para movimentar o veículo. O restante se transforma em calor e perdas mecânicas.

Mas essa é a realidade dos melhores motores. Em geral, os números são bem mais baixos. Segundo o Prof. André Bueno, um dos responsáveis pela pesquisa do novo motor na UFC, a eficiência dos motores a gasolina vai até 28%. Já a dos veículos a etanol gira em torno de 33%, enquanto a dos veículos a diesel chega a 44%. Os motores elétricos têm uma relação inversa: a eficiência desse tipo de máquina é de 85%.

Prof. André Bueno, da UFC, já desenvolveu modelo do novo motor em computador e agora se prepara para realizar testes de bancada (Foto: Ribamar Neto/UFC Informa)

O segundo grave problema diz respeito ao meio ambiente: os motores a combustão (incluindo os de aeronaves) são responsáveis por cerca de 20% das emissões globais de CO2, gás que é o principal responsável pelo aquecimento global. Também liberam gases tóxicos para o ser humano, como o SO2, H2S e, especialmente, os óxidos nítricos (NOX) que, nas grandes cidades, têm impacto direto na qualidade do ar.

Por isso, mais de uma dezena de países já anunciou datas para eliminar a produção de veículos com motores a combustão. A Noruega fala em impedir a circulação dos veículos com esse tipo de motor já em 2025; Cingapura, em 2030; Canadá, em 2035; e Espanha, 2040. A Organização das Nações Unidas tem orientado que os países desenvolvidos interrompam a produção dos motores a combustão interna em 2035.

Como funcionam

Se esses problemas não podem ser resolvidos, parte deles pode ser atenuada com o projeto do HCCI de etanol. Os motores a combustão tradicionais funcionam a partir da queima do vapor de gasolina e oxigênio, a qual aciona um conjunto de pistões que sobem e descem freneticamente, gerando a energia para movimentar o automóvel – juntamente com muito aquecimento, barulho, perdas mecânicas e gases. Para acionar essa combustão, utiliza-se uma faísca gerada eletricamente.

A tecnologia HCCI atua justamente aí. Ela gera combustão sem necessidade da faísca, comprimindo fortemente uma mistura homogênea de gasolina e oxigênio. A pressão leva ao aumento de temperatura e densidade, o que, a partir de determinado ponto, provoca a combustão espontânea. Essa “pequena” diferença gera uma série de desdobramentos no motor: menor perda energética, menor temperatura de pico, menos fuligem.

Como resultados, motores HCCI têm um rendimento semelhante ao do diesel (portanto, os veículos conseguem se deslocar por mais quilômetros com a mesma quantidade de combustível) e reduzem fortemente a geração dos óxidos nítricos. O problema é que, até agora, os engenheiros só conseguiram gerar essa explosão a partir de gasolina.

O uso de uma fonte renovável como o etanol tende a trazer impactos significativos, como a menor geração de CO2, de material particulado e de benzeno. Apesar do pouco tempo do projeto, os pesquisadores da UFC já têm um modelo pronto em computador com resultados promissores do ponto de vista da eficiência energética.

Adaptações nos motores tradicionais já estão sendo realizadas para chegar aos resultados pretendidos. Os próximos passos passam pela realização de testes em bancada dinamométrica para testar o desempenho do motor multicilíndrico e o balanço concreto da emissões de gases.

Conheças as metas de redução de emissão de carbono (Infográfico David Motta)

Transição verde

Mas, se é assim, por que simplesmente não deixar de lado os motores a combustão e apostar de vez nos elétricos? “Não adianta querer fazer uma mudança de uma hora para outra porque não teremos infraestrutura para isso”, explica o Prof. André Bueno.

A Agência Internacional de Energia (AIE) prevê que será preciso uma intensa transição energética até 2050 para descarbonizar o setor de transportes. O primeiro passo dessa transição será reforçar a hibridização leve dos motores, na qual o motor elétrico é menos potente.

O passo seguinte será a hibridização plena, na qual o motor elétrico ganha mais relevância, e, por fim, a hibridização plugin: nesta, o veículo pode ser utilizado como um elétrico, mas conserva um motor a combustível para lhe garantir autonomia até a próxima recarga.

“Para trilharmos esse caminho da redução de emissões, é importante que haja opções eficientes e limpas de motores de combustão interna, de modo que eles sejam usados nos veículos plugin”, explica Bueno.

Somente depois dessa fase, devemos ter uso pleno de carros elétricos ou com motores à base de hidrogênio. Se o caminho traçado pela AIE for seguido e tudo der certo, o impacto será significativo. O setor de transportes deixará de contribuir com 7,2 gigatoneladas de emissões de CO2 por ano, em 2020, reduzindo para 0,7 gigatoneladas, em 2050.

Fonte: Agência UFC

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