Estudo da UFPE aponta que os resíduos de equipamentos eletroeletrônicos provocam mais danos aos países emergentes
O que é um problema em quase todo o mundo, a falta de gestão para descarte sustentável dos Resíduos de Equipamentos Eletroeletrônicos (REEEs) provoca danos ainda mais severos nos países em desenvolvimento. O agravante, segundo o engenheiro civil José Francisco de Oliveira Neto, decorre da importação ilegal ou contrabando dos REEEs gerados em países desenvolvidos e que são enviados para os países mais pobres como materiais recicláveis. A constatação é apontada na dissertação “Caracterização dos resíduos de equipamentos eletroeletrônicos produzidos em bairros de classe média-alta de Caruaru/PE”, defendida por Oliveira Neto, no Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil e Ambiental da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)
Segundo o autor, “tratar adequadamente o lixo eletrônico e diminuir seu alto fluxo de produção e toxicidade em países em desenvolvimento é um dos grandes problemas relacionados a esse tipo de resíduo”. Na pesquisa, orientada pela professora Simone Machado Santos, consta que, atualmente, apesar de a Responsabilidade Estendida do Produtor (REP) ser uma boa política para resolver os problemas relacionados ao aumento na produção de lixo eletrônico, tal prática não é uma realidade comum em todo o mundo. O pesquisador também aponta “os problemas ambientais provocados pela geração acelerada desses equipamentos, somados ao descarte inadequado e à falta de estratégias de prevenção e minimização de impactos ambientais e na saúde humana”.
O estudo revela que 50-80% do total de lixo eletrônico produzido no mundo são enviados de países desenvolvidos como Austrália, Japão, Coréia, Europa Ocidental e América do Norte, para países em desenvolvimento como o Brasil, China, Índia, Gana, Nigéria, México, Paquistão, Cingapura e Tailândia. Estima-se que, do total global de lixo eletrônico gerado em 2016, apenas 20% (8,9 Mt) foram coletados e reciclados adequadamente. O gerenciamento dos 80% (35,8 Mt) não foi documentado, mas, relata a pesquisa, “estima-se que esses resíduos tenham sido dispostos inadequadamente ou reciclados em condições de ausência ou baixo controle da atividade”.
Legislação
A dissertação também aponta que a adoção de legislação para a gestão desse tipo de resíduo está aumentando no mundo; em 2017, 67 países estavam cobertos por leis nacionais de gestão de REEEs. “Mas, nem todos os países cumprem as leis e muitos desses não possuem dados que possibilitem medir a eficácia da legislação existente”, ressalva. Ainda de acordo com o levantamento feito por Oliveira Neto, em todo o mundo, a Responsabilidade Estendida do Produtor (REP) surge como um princípio importante nas políticas de gerenciamento de lixo eletrônico. “A REP cobra do produtor a responsabilidade pelo seu produto até a fase pós-consumo, incentivando o investimento na modificação dos processos de produção e no design do produto para minimizar o uso de recursos naturais e a geração de poluentes”, explica o trabalho.
Para entender a dinâmica da produção desses resíduos no Brasil, José revisou a bibliografia de gerenciamento dos REEEs no país, levando em consideração inicialmente, pesquisas desenvolvidas até o ano de 2018. A revisão resultou no artigo “A Mini-Review of E-waste Management in Brazil: Perspectives and Challenges”, publicado no periódico CLEAN (com fator de impacto de 1.412 e Qualis A1 nas Engenharias 1). Estudos técnicos e científicos apontaram que os principais problemas das pesquisas estão na identificação das principais barreiras nos programas de logística reversa. Apesar dos avanços, ainda não há acordo setorial entre os fabricantes de equipamentos eletroeletrônicos e o poder público para a implantação em curto prazo de programas de logística reversa e destinação adequada dos REEEs.
Recorte
Com o intuito de realizar um recorte local para a pesquisa, o autor analisou as características dos REEEs produzidos em um bairro de classe média-alta no município de Caruaru, localizado no Agreste pernambucano, e constatou que famílias de renda mais alta, e que, no geral, são formadas por pessoas com maior grau de escolaridade, optam como método de descarte armazenar os REEEs em casa, aumentando a contínua circulação como “bens usados”. Também se verificou a existência de uma associação entre renda familiar e intenção na aquisição de Equipamento Eletroeletrônico (EEE) usados ou remanufaturados, sendo o telefone celular o equipamento mais citado pelos entrevistados.
Entre os 380 entrevistados, 308 responderam estar dispostos a comprar um EEE reaproveitado/reciclado, principalmente telefone celular, desde que seja garantida sua durabilidade. Considerando o quantitativo de EEE levantado, foi contabilizado um total de 3.584 equipamentos, dos quais 84% estão em uso e 16% estão armazenados. O telefone celular foi o equipamento mais frequente nos domicílios (38%), seguido do notebook (20%). Estima-se que cada domicílio possua, em média, três celulares em uso e dois armazenados.
Na relação entre hábitos de consumo e de descarte de produtos eletroeletrônicos dos moradores da área estudada, o levantamento concluiu que mais de 96% dos entrevistados consideram a separação dos REEEs nas residências um importante passo, principalmente no que diz respeito à redução dos impactos ambientais provocados pelo descarte inadequado. Com relação aos métodos de destinação adotados pelas famílias, apenas 12% realizam o descarte adequado dos seus REEEs. “O alto índice de pessoas que armazenam seu lixo eletrônico em casa (40%), que doam (6%) ou vendem (24%) mostra uma necessidade de ampliação e reforço dos programas de educação ambiental, para que se realizem estratégias de gerenciamento de lixo eletrônicas mais adequadas e efetivas”, destaca o autor da dissertação.
Como alerta, o pesquisador aponta que “apesar de a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) ter sido promulgada no Brasil há quase dez anos, não há acordo entre a produção de documentos (estudos científicos e legislação específica) e a execução de ações de grande alcance voltadas à implementação de sistemas de logística reversa para equipamentos eletroeletrônicos”. E recomenda: “Para aumentar a probabilidade de avanços na gestão de REEE, algumas ações devem ser tomadas, como o envolvimento de cooperativas e associações na coleta seletiva formal; estímulo à indústria de reciclagem de lixo eletrônico no Brasil, em todas as etapas do processo; e a promoção do conhecimento e a delimitação do mercado de importação de lixo eletrônico; sendo necessária também a ampliação de ações que informem a população sobre os riscos ambientais e a saúde humana, e os benefícios da reciclagem dos REEEs, além da criação de uma consciência de hábitos de consumo de EEE e a geração de REEEs”.
Fonte: Ascom da UFPE
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