Tecnologia desenvolvida pela Embrapa Agroenergia poderá ser usada na produção de biocombustíveis, alimentos, bebidas, papel e tecidos
Um microrganismo geneticamente modificado que atua como biofábrica capaz de produzir um insumo utilizado nas indústrias de biocombustíveis, alimentos, bebidas, papel e tecidos. Esse insumo, as betaglicosidases, é um grupo de enzimas que atuam na última etapa da degradação da celulose de vegetais como algodão, cana-de-açúcar e eucalipto. A novidade é que os pesquisadores conseguiram fazer com que essas enzimas sejam produzidas por outro tipo de microrganismo, uma cianobactéria.
Atualmente, a produção comercial de betaglicosidades é feita principalmente por fungos ou bactérias, que necessitam consumir açúcar ou outra fonte de carbono para crescer. Com a cinobactéria, isso é vantajoso justamente porque elas não precisam ser “alimentadas” com açúcares. Semelhantes a microalgas, elas são organismos unicelulares aquáticos que combinam características de microrganismos e plantas e realizam fotossíntese. Por isso, precisam apenas de CO2 e luz para crescer e produzir as enzimas.
O centro de pesquisa da Embrapa Agroenergia (DF) depositou pedido de patente da tecnologia, desenvolvida em parceria com a Universidade Federal do Rio Grande (Furg). O chefe de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Agroenergia, Bruno Brasil, explica que, por não precisarem de açúcares ou outras fontes de carbono orgânico, as biofábricas de enzimas baseadas em cianobactérias possuem vantagens potenciais quanto ao custo de produção e capacidade de escalonamento. A tecnologia também é capaz de agregar mais sustentabilidade às cadeias produtivas que empregam as enzimas, já que, para crescer, esses organismos capturam CO2 da atmosfera ou de processos produtivos associados. “Poderiam consumir o CO2 que sai das dornas de fermentação de usinas de açúcar e álcool”, exemplifica Brasil. Além disso, por não conterem açúcares, os meios de cultivo das cianobactérias são menos suscetíveis a contaminações que reduzem a produtividade.
Gene amazônico
De olho nessa vantagem da substituição dos fungos por cianobactérias, os pesquisadores depararam-se com o primeiro desafio: não se conhecia, na natureza, espécies capazes de gerar naturalmente quantidades significativas dessas enzimas. Por isso, a equipe dedicou-se logo à modificação genética. Para aumentar a produção de betaglicosidases pela cianobactéria selecionada, o grupo utilizou um gene encontrado na comunidade bacteriana do solo da Floresta Amazônica. Esse gene havia sido identificado anteriormente por outra equipe da Embrapa Agroenergia, que usa técnicas de Biologia Molecular para acessar o DNA de microrganismos mesmo sem cultivá-los em laboratório.
Com esse novo gene sendo expresso, os cientistas conseguiram multiplicar em até oito vezes o volume de betaglicosidase produzido pela cianobactéria. A Embrapa e a Furg trabalham, agora, para aumentar ainda mais essa produtividade. Outra linha de desenvolvimento é a engenharia de enzimas. Com os protocolos de transformação desenvolvidos, a equipe quer fazer com que os microrganismos gerem betaglicosidases com novas propriedades, que potencializem o rendimento industrial. “A gente pode fazer com que esse microrganismo produza uma molécula ‘engenheirada’ do ponto de vista molecular para que ela seja um produto melhor”, explica o professor Luis Fernando Marins, da Furg.
Mercado em crescimento
O mercado global de enzimas é crescente: estimativas indicam que ele deve atingir a cifra de US$ 5,4 bilhões em 2020. Atualmente, os fabricantes de detergentes são os maiores consumidores desses insumos, que também são muito utilizados na produção de rações, alimentos e bebidas.
Investimentos para reduzir o uso de petróleo e aumentar o de matérias-primas de origem renovável na indústria de transformação estão abrindo espaço para as enzimas que apresentam ação no processo de degradação da celulose, grupo a que pertencem as betaglicosidases. O que elas fazem é desconstruir a estrutura da celulose em várias etapas até reduzi-la a açúcares, como a glicose, que, por sua vez, podem ser convertidos em diferentes produtos – de etanol a fármacos. Aprimorar a eficiência e reduzir o custo dessas enzimas são desafios considerados peças-chave para o crescimento da chamada bioeconomia.
Atualmente, betaglicosidases têm sido utilizadas nas indústrias de alimentos para clareamento de sucos de frutas e para aumentar a qualidade nutritiva de produtos fermentados. As cervejarias também as empregam, em processos que facilitam a etapa de filtração. Já nas indústrias têxteis, encontram-se diferentes aplicações sobre tecidos de algodão, como a restauração do brilho.
Busca de parceiros
As biofábricas de betaglicosidases baseadas em cianobactérias constituem uma das 34 tecnologias em fase intermediária de desenvolvimento que compõem a Vitrine Tecnolgógica da Embrapa Agroenergia. O centro de pesquisa busca parceiros para as próximas etapas de trabalho com esse e outros ativos. Bruno Brasil explica que a instituição aposta na inovação aberta para fazer as tecnologias chegarem de forma mais rápida e assertiva ao mercado. “No caso das biofábricas de betaglicosidases, por exemplo, atuar em cooperação com empresas nessas próximas etapas de desenvolvimento pode nos ajudar a direcionar a engenharia das enzimas para diferentes segmentos industriais”, detalha. Para estabelecer as parcerias, indústrias podem se valer de recursos da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii), que pode arcar com até um terço dos custos do projeto.
Cianobatérias e microalgas constituem uma das seis plataformas industriais em que a Embrapa Agroenergia atua. Para conhecer essa e as outras, bem como os eixos de Pesquisa e Desenvolvimento da instituição, acesse a página da Unidade e a Vitrine de Tecnologias, que está disponível para pessoas e empresas interessadas.
Redação com informações Embrapa Agroenergia
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