Uma nova máquina agrícola para a horticultura, inventada na Universidade Federal do Ceará, acaba de receber a carta patente do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) e pode vir a solucionar o maior problema encontrado no setor: a colheita mecanizada. A indisponibilidade de mão de obra para essa operação tem feito com que grandes e médios produtores recorram a maquinários importados não adequados à realidade nacional e que geram perdas que chegam a 70% da produção. O invento da UFC se propõe a desempenhar a tarefa garantindo custos significativamente menores.
Segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), em 2020 o setor comercializou 5,4 milhões de hortaliças nas centrais de abastecimento (CEASAs), movimentando R$ 16,3 bilhões. Nos últimos anos, a horticultura brasileira se reinventou com o enorme aumento na escala de produção em alguns polos, como a Chapada Diamantina (BA) e Gotardo (MG), com hortícolas em escala milhares de vezes maiores que as tradicionais hortas dos pequenos agricultores, em sistemas de produção altamente tecnificados, além de regiões como Holambra (SP), cujos cultivos protegidos utilizam inclusive tecnologia robótica na produção das hortaliças.
Esse cenário indica um mercado promissor para a indústria de máquinas agrícolas, mas a oferta nacional ainda não responde a essa demanda. “Existem máquinas italianas, francesas, alemãs para colher hortaliças, mas o problema é que, quando elas vêm para o Brasil, devido ao fato de não terem sido projetadas para nossas condições de solo e clima e de variedades das culturas, elas chegam a perder 70% da produção”, informa o Prof. Daniel Albiero, um dos inventores do novo maquinário, que, na época de sua idealização, era docente do Departamento de Engenharia Agrícola da UFC.
Os principais mercados para a nova máquina são os médios e grandes proprietários de fazendas da horticultura (Foto: Paulo RS Menezes)
A máquina é apresentada em três versões: uma para a colheita de hortícolas folhosas e herbáceas (como alface, couve-flor, brócolis); outra para tubérculos, bulbos e raízes (como cebola, alho, cenoura, batata-doce) e uma terceira para colher fístulas sensíveis (para culturas delicadas, como a cebolinha). “Ela é constituída de módulos intercambiáveis que podem ser trocados em 15 minutos, de acordo com a categoria da cultura”, explica o professor.
“Seguimos a filosofia de projeto da EMBRAER com seus aviões. Se um agricultor for produtor de alface, ele obviamente adquirirá o módulo para culturas hortícolas folhosas, módulo que pode colher qualquer folha, de alface a rúcula, ou seja, para colher rúcula em vez de alface, basta ele programar a máquina e colocar os parâmetros da rúcula. Se for um produtor de cenoura, ele adquire o módulo de tubérculos e raízes, então qualquer cultura desse tipo pode ser colhida”, esclarece.
O diferencial do equipamento é que ele se utiliza de três robôs: um manipulador, um de corte e outro de elevação. “Cada um desses robôs tem módulos que adaptam a máquina automaticamente para cada cultura, diminuindo drasticamente as perdas”, explica Albiero, que hoje é professor da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).
Albiero informa que todos os componentes e sistemas da máquina são facilmente encontrados no mercado.“Foi realizado todo um estudo de sistemas de manutenção automáticos, além de diagnósticos que possibilitam uma grande eficiência nessa manutenção”, garante.
Substituição da mão de obra
A etapa de colheita da horticultura, em situações de larga escala, necessita de cerca de 200 trabalhadores para realizar a operação. “Na colheita manual, as perdas são mínimas, mas o problema é que não existe mais disponibilidade de mão de obra no campo para colheita de hortícolas em grande escala”, aponta o Prof. Daniel Albiero.
Esse fator tem feito com que os grandes e médios produtores busquem máquinas europeias, que, contudo, geram perdas por conta da “ineficiência e inadequação dos órgãos ativos de ataque ao solo e manuseio do material vegetal na colheita”, justifica o professor. A máquina inventada na UFC, por ter sido elaborada considerando as condições específicas da produção nacional, resolveria esse problema.
O equipamento foi projetado para ser operado por até três pessoas, garantindo a mesma capacidade de uma colheita manual com 200 trabalhadores. Por conta da drástica redução no uso de mão de obra, os custos ficam significativamente menores, informa o inventor.
Apesar de a carta patente ter sido expedida no fim de janeiro deste ano, o depósito da solicitação feito pela UFC ao INPI foi feito ainda em 2013. Naquele ano, havia uma parceria com uma grande indústria de máquinas agrícolas de São Paulo, que previa a produção de 50 máquinas ao ano, com este número chegando a 100 no pico de produção. A empresa também iria fazer o primeiro protótipo da máquina. “Contudo, devido à crise político-econômica de 2014, infelizmente, ela teve que desistir do projeto”, relata
No momento, os inventores contam apenas com protótipos digitais, simulados em ambientes virtuais. Uma possível parceria com empresas interessadas no invento pode, agora com a carta patente expedida, garantir não somente o protótipo, mas a produção e comercialização da máquina.
A carta patente expedida pelo INPI é a 25ª garantida pela UFC. É a 7ª do Departamento de Engenharia Agrícola e também a 7ª que traz como inventor o Prof. Daniel Albiero. Além dele, o INPI ainda reconhece Flávio Roberto de Freitas Gonçalves e José Heldenir Pinheiro Bezerra como inventores da máquina colhedora multifuncional de hortícolas.
Deixe um comentário