Luciana de Souza, que é bolsista do Programa de Desenvolvimento Científico Regional do Governo Federal em parceria com o governo do estado de Alagoas, observou que o sono das pessoas é menor do que elas pensam.
Os jovens estão dormindo menos e tendo um sono sem qualidade, que não revigora o corpo para o dia seguinte. Essa realidade é uma tendência mundial e que também pode ser constatada por um estudo feito em Maceió pela doutora na área de Psicobiologia, Luciane de Souza. Com trabalhos de mestrado e doutorado sobre o sono, desde 2015 ela vem acompanhando um grupo de 138 voluntários em uma pesquisa promovida pelo Laboratório de Eletrofisiologia e Metabolismo Celular, coordenado pela professora Adriana Ximenes, do Instituto de Ciências Biológicas e da Saúde (ICBS) da Universidade Federal de Alagoas.
O diferencial do trabalho realizado na instituição alagoana é que a avaliação foi feita no ambiente natural de cada um dos participantes, respeitando a rotina e o comportamento. “Para realizar as análises, grande parte dos investigadores estabelece padrões e fixa quantas horas devem dormir, privando-os do que estão acostumados. Queríamos resultados mais compatíveis com a situação diária, por isso, optamos por outro tipo de observação”, explicou a pesquisadora Luciane.
Os dados mais preocupantes revelados pelo estudo mostram que 82% dos voluntários, com faixa etária de 20 a 39 anos, superestimam as horas dormidas, ou seja, dizem que dormem uma certa quantidade de horas quando, na verdade, é menos. “Na média geral, eles dormem 45 minutos a menos do que dizem. Além disso, cerca de 50% dormem até seis horas durante a noite, com uma proporção bem pequena, 14%, dormindo entre sete e oito horas”, apontou. De acordo com a Associação Mundial de Medicina do Sono, a duração adequada para a maioria dos adultos jovens é de sete a nove horas de sono, mas a pesquisadora faz a ressalva de que há pessoas que se sentem bem dormindo apenas seis. São os chamados “dormidores curtos”. No entanto, a maioria precisa seguir o que determina a Associação.
Sono fragmentado
Outra situação evidenciada pela pesquisa foram os despertares ao longo da noite. Os entrevistados, ao responderem o questionário proposto, alegavam que não despertavam ou que acordavam muito pouco. A pesquisadora argumentou que é normal não lembrar, principalmente, quando se trata de leves despertares para encontrar uma posição mais confortável. O problema, segundo Souza, é quando eles são muito frequentes, pois representam uma perda na qualidade. “Houve um voluntário que alegou não despertar nenhuma vez. Quando avaliamos os registros, verificamos que ele despertou 40 vezes, o que representa uma fragmentação enorme”, alertou. “É necessário averiguar quais são as causas desse sono fragmentado, que pode ser causado por problemas respiratórios, por exemplo”.
A demora em adormecer também foi identificada entre muitos participantes. Para Luciane Souza, além de outros fatores, essa ocorrência pode ser devido à falta de rotina antes de se deitar, uma vez que, conforme as informações repassadas pelos próprios voluntários, eles não determinavam uma hora certa de ir para a cama. “Há uma variação enorme de horários: em um dia é cedo, em outro, muito tarde. Isso não é adequado. Quando se trata de dormir, não há um botão de ligar e desligar. É necessário um ritual, a pessoa precisa se conhecer e respeitar o seu ritmo”. Estes dois fatores, irregularidade e dificuldade em adormecer, também estiveram associados a mais queixas de ansiedade, depressão, inquietude e deficit na memória operacional, que é indispensável para as atividades do dia a dia. “Aparentemente, a mais afetada foi a memória verbal. Sabe aquele dia que te falta palavra diante de uma situação com a qual você está acostumado, que é rotineira? Então, é bom analisar o descanso da noite anterior”, afirmou.
Diante dos dados obtidos, a pesquisadora relatou que quase não conseguiu identificar entre o grupo de avaliados o “bom dormidor clássico”, aquele que apresenta duração e qualidade do sono adequadas. Para saber se a pessoa dorme bem, é feito um cálculo do tempo enquanto se esteve deitada e o quanto efetivamente dormiu. Para considerar como satisfatório, o resultado deve ser a partir de 85%. “O que fizemos foi elencar como bons dormidores aqueles que tiveram facilidade para adormecer e apresentaram mais regularidade ao longo da noite”, disse. Com esses critérios, do total, 49% foram considerados “bons dormidores”.
Gênero
Na análise por gênero, a pesquisa também mostrou que as mulheres dormem mais do que os homens. “Segundo um estudo recente, elas precisariam de mais tempo de sono para restaurar o humor. O homem consegue ficar bem com um pouco menos de sono”, detalhou. O sexo feminino representou 61% dos voluntários e apresentou mais queixas de sintomas depressivos.
Mas como dormir mais e melhor numa sociedade cada vez mais acelerada, com pessoas sobrecarregadas de tantos compromissos? “Deitar-se mais cedo. Com a rotina, é mesmo complicado acordar tarde. No entanto, é preciso ter consciência de que o corpo precisa de condições adequadas para conseguir repousar”, advertiu Luciane.
Método da pesquisa
O público acompanhado pelo estudo, formado principalmente por servidores e estudantes da Ufal, foi dividido em dois grupos: os adultos jovens, de 20 a 39 anos, e os de meia idade, de 40 a 59. Os dados divulgados acima referem-se ao primeiro grupo. As informações relativas ao segundo ainda estão sendo analisadas. Os participantes não podiam ter diagnóstico de distúrbios do sono e todos foram acompanhados pelo período de 8 a 10 dias.
Em um primeiro momento, eles foram entrevistados sobre as condições de repouso nos últimos 30 dias, ingestão de bebidas alcoólicas, peso, altura, se praticava atividade física, hábitos antes de dormir, grau de escolaridade e o cronotipo (para saber se é mais ativo no período matutino, vespertino ou se é intermediário, que se adapta facilmente a qualquer um dos horários).
Após esse contato, recebiam um aparelho chamado actígrafo (foto), parecido com um relógio de pulso, e que registra o ciclo sono-vigília, ou seja, o período em que se dorme e o que está acordado. O actígrafo deveria ser usado por 24 horas, admitindo-se a retirada apenas para o banho. Os voluntários receberam, ainda, um diário onde deveriam registrar, assim que despertassem, informações sobre a hora em que dormiu e acordou, quantas vezes levantou ao longo da noite, entre outros questionamentos. Na parte seguinte do trabalho, foram submetidos a testes de memória e atenção. Os resultados do estudo foram obtidos a partir da análise e da confrontação de todos esses dados.
Cada voluntário está recebendo um relatório com uma avaliação particular sobre a rotina de repouso que apresentou, com recomendações para melhorar a qualidade do sono. “A nossa intenção é selecionar 30 pessoas para reavaliação, depois de seguirem as orientações repassadas”, adiantou.
A pesquisadora
Luciane de Souza fez sua pós-graduação na Universidade Federal de São Paulo e está na Universidade Federal de Alagoas devido o Programa de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Regional (PDCR), que promove a mobilidade de doutores para outros estados a fim de realizarem pesquisas. Até o final de 2016, ela conclui todas as análises dos dados sobre a pesquisa.
O PDCR é uma parceria do Governo Federal, através do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), com o Governo Estadual via Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas (Fapeal).
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