Estudo realiza monitoramento viral em esgotos de Natal durante a pandemia de Covid Pesquisa

quarta-feira, 4 setembro 2024
Coletas eram realizadas nas estações de esgoto da Caern

Como resultado, o trabalho identificou a dinâmica viral e forneceu biomarcadores para prevenir futuras pandemias.

Durante o pico da pandemia de Covid-19, a doutoranda Júlia Firme Freitas conduziu um estudo inovador, coletando amostras de águas residuais em Natal/RN para investigar a microbiota presente e suas potenciais implicações na saúde pública. Publicado na revista Environmental Pollution, o estudo destacou a vigilância epidemiológica baseada em esgoto, identificando a dinâmica viral, incluindo o SARS-CoV-2 e outros patógenos. As descobertas fornecem novos biomarcadores para o monitoramento de surtos de doenças, oferecendo uma ferramenta promissora para prevenir futuras pandemias.

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A pandemia de Covid-19 estava no pico, as notícias sobre mortes ocupando os noticiários e a vida das pessoas. Nesse mesmo período, entre junho de 2021 e maio de 2022, Júlia Firme Freitas ia uma vez por semana a três estações de águas residuais da Caern coletar amostras para estudar a microbiota presente nas águas e tentar compreender sua estrutura, relações e potencialidades. O resultado desse trabalho foi publicado na revista científica Environmental Pollution, uma das principais revistas da área ambiental.

Em entrevista ao Nossa Ciência, Freitas explicou que foi feita uma vigilância epidemiológica a partir das amostras de esgoto e que essa em relação à vigilância genômica, já realizada pela Caern, consegue avaliar toda a população. O estudo foi realizado no Programa Renorbio (Rede Nordeste de Biotecnologia), na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

“A vigilância genômica via águas residuais permite detectar a presença de patógenos, mesmo ainda com indivíduos assintomáticos, o que permite você antever futuros surtos”, complementa a orientadora do estudo, Lucymara Fassarella Agnez-Lima.

Evitar futuras pandemias

De acordo com as pesquisadoras, o propósito é que a Caern e os órgãos de saúde, consigam monitorar se as doenças que ocorrem em Natal estão estáveis ou não. Para a orientadora, conhecendo-se essa comunidade microbiana, a ocorrência de qualquer perturbação nesse ecossistema pode ser um indicativo de um evento, quer seja para a saúde humana, saúde animal ou mesmo para a agricultura. “Então, é uma estratégia que pode ser bastante interessante para evitar, ou pelo menos tentar mitigar, futuras pandemias, epidemias ou surtos de doenças” sugere Agnez-Lima.

Freitas, que é aluna de doutorado, esclarece que foram avaliados microrganismos, como bactérias e archaeas, e alguns elementos, como genes bacterianos, além da virosfera, que é o elemento principal do artigo. “Extrai o DNA genômico total e identifiquei bactérias, vírus e archaeas e também identifiquei genes de resistência a antimicrobianos (ARG), que são genes que conferem resistência a antibióticos à bactéria, e genes de fatores de virulência (FVG)”, explica.

Coleta semanal

Local de coleta na Estação de Tratamento de Efluentes Beira Rio, em Igapó (Foto: Júlia Freitas)

“O diferencial do trabalho foi a coleta semanal ao longo de um ano em meio a pandemia de COVID-19, o que permitiu identificar os vírus circulantes e as flutuações nessa comunidade ao longo do tempo, contribuindo para um melhor conhecimento da dinâmica da virosfera” garante a orientadora. As coletas foram realizadas nas Estações de Tratamento de Efluentes (ETE), da Caern, no Baldo, em Ponta Negra e Beira Rio, localizada em Igapó.

As pesquisadoras informam que os achados do estudo apontam para a rica diversidade e complexidade da comunidade viral nas amostras de águas residuais, com vírus conhecidos e não classificados desempenhando papéis críticos na virosfera.

A primeira autora do artigo explicou o caminho trilhado para chegar às conclusões. “Fizemos o procedimento para extrair DNA viral e RNA viral separadamente e sequenciamos duplicatas destes; analisamos os dados por bioinformática; identificamos todos os possíveis vírus presentes mensalmente; classificamos os vírus com base nos possíveis hospedeiros (animais, plantas e microrganismos); e analisamos as possíveis correlações que os vírus realizam”, enumera.

Biomarcadores

Júlia Freitas e Lucymara Agnez-Lima no Congresso Brasileiro de Genética, em agosto de 2024, em Campos do Jordão (SP)

Desse modo, foi possível desenvolver potenciais biomarcadores para identificar vários grupos monitoramento de vírus patogênicos para plantas, animais e humanos, informou Agnez-Lima. O artigo indica ainda que em relação ao SARS-CoV-2, identificamos ocorrência simultânea com vírus não classificados e vírus gastrointestinais que afetam indivíduos imunossuprimidos.

Freitas afirmou que o estudo contribui para a saúde pública de Natal/RN, fornecendo informações dos principais patógenos existentes nas águas residuais da cidade. “Apontamos biomarcadores que podem ser usados para monitoramento e prevenção de surtos de doenças. As descobertas podem auxiliar na criação de estratégias mais eficazes para o controle de infecções e a proteção da população contra ameaças emergentes”, finaliza.

O estudo teve ainda a participação de Thais Teixeira Oliveira e contou com financiamento da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), por meio das bolsas das duas alunas de doutorado e do edital Capes Epidemias. A professora Agnez-Lima tem bolsa de produtividade em pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ).

Mônica Costa

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