Pesquisa mapeou exposição aos perigos naturais e capacidade de lidar com desastres nos municípios brasileiros
Pesquisa do professor Lutiane Almeida do Programa de Pós-graduação e Pesquisa em Geografia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) mapeou 5.565 municípios brasileiros (atualmente há 5.570 municípios no Brasil) para o desenvolvimento de Indicadores de Risco de Desastres no Brasil. Concluído em 2015, o estudo de pós-doutorado foi realizado na Universidade das Nações Unidas, em Bonn e na Universidade de Sturgatt, em parceria com pesquisadores alemães.
Na pesquisa, Almeida utilizou diversos bancos de dados como o Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil, o perfil dos municípios brasileiros apontados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), dados do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, entre outros.
Segundo o pesquisador, a ideia foi produzir um índice de risco de desastres para todos os municípios brasileiros em duas dimensões: exposição aos perigos naturais e vulnerabilidade, e a indicação de variáveis de susceptibilidade, como a capacidade de lidar com os desastres por meio de medidas estruturais e a capacidade de adaptação por meio do acesso a políticas públicas. O país apresenta indicadores de exposição quanto às secas, aos deslizamentos de terra, às inundações e ao aumento do nível do mar.
Cenários Regionais
De acordo com a pesquisa, vários municípios das regiões nordeste e sul são expostos à seca; outros municípios localizados ao longo de planícies são expostos a inundações de rios, tais como os da região norte na bacia hidrográfica do Rio Amazonas. Cidades costeiras como Salvador (BA), Vitória (ES) e Santos (SP) são expostas a cenários de aumento do nível do mar.
O litoral oriental do nordeste e municípios do sudeste e do sul são altamente expostos a deslizamentos, principalmente em regiões serranas. O professor acredita que essa exposição deve-se ao crescimento populacional, à ocupação desordenada de áreas de risco e à magnitude. Porém, segundo o pesquisador, a capacidade de lidar com as ocorrências diminuiu a vulnerabilidade. “Essas regiões apresentam índices de vulnerabilidade baixos, fazendo com que esses municípios tenham mais capacidade de lidar e de se recuperar dos desastres”, ressalta.
Municípios localizados nas regiões norte e nordeste possuem alta vulnerabilidade porque têm dificuldades para se restabelecer, como por exemplo, durante o período de seca que pode causar consequências drásticas, segundo o pesquisador. “Mesmo que não seja tão severa, uma seca, pode causar consequências muito graves pois os municípios têm pouca capacidade de lidar e de se adaptar às mudanças” afirma.
Rio Grande do Norte
Sobre Natal, capital do Rio Grande do Norte, o pesquisador destaca que o município apresenta vulnerabilidade baixa, mas que na Região Metropolitana existe o risco de deslizamentos e inundações, citando os municípios de Parnamirim, Nísia Floresta e São Gonçalo do Amarante. Outras regiões do Estado, como o Vale do Açu, a região de Touros e João Câmara e o Alto Oeste têm vulnerabilidade alta para desastres decorrentes da seca e inundações pelas chuvas irregulares.
É possível citar exemplos recentes ocorridos nessa capital, como os deslizamentos de terra que ocorreram em 2014, derrubando 85 casas num bairro da cidade. Nesse caso, destaca Lutiane Almeida, a área de dunas próxima à praia de Areia Preta possui limites físicos de ocupação para suportar a instabilidade e, pelo Plano Diretor de Natal, é considerada como Zona Especial de Interesse Social (ZEIS), sendo oficializada para ocupação.
Políticas públicas
O professor aponta o acesso a medidas estruturais e às políticas públicas como meios de reduzir os riscos e os efeitos de desastres naturais. E considera que a presença maior de organizações como o Corpo de Bombeiros, a Defesa Civil e setores ligados a políticas ambientais como importantes meios de atenção às populações atingidas em casos de desastres naturais.
O investimento público em unidades de conservação, proteção dos ecossistemas e controle quanto aos focos de queimada, também possibilitam que os indicadores de vulnerabilidade sejam menores. Além disso, destaca a necessidade de investimentos na Educação: “A alta faixa de escolaridade é um fator de excelência, visto que o conhecimento faz com que as pessoas não se submetam às áreas de risco”.
Avanço do Mar e Seca
Uma das ocorrências mais presentes na área de litoral registrada nas últimas décadas é o avanço do nível do mar . O professor explica que tal ocorrência não é considerada um desastre, mas é um indicador de vulnerabilidade. De acordo com o professor, as barragens, como as feitas no Rio São Francisco para instalação de hidroelétricas, dificultam o deslocamento de parte dos sedimentos que são retidos e não chegam à foz. Dessa forma, muitos municípios registram a erosão costeira marcada pelo avanço do oceano em direção ao continente. “Os sedimentos transportados são necessários para alimentação dos campos de dunas e das praias. Se não chegam à foz, como consequência o oceano avança, pois ele tanto deposita quanto os retira através das ondas”, afirma.
Um caso usado pelo professor para ilustração é o do rio Xingó, localizado em Sergipe, que com o avanço do mar tem recebido salinidade, o que prejudica a reprodução de peixes. Outro fator de vulnerabilidade à seca, cita Almeida, se encontra na Barragem de Sobradinho, na Bahia(considerado o maior reservatório da região que tem a função de regularizar a foz do São Francisco) que tem registrado baixos índices de precipitações.
Prevenção de desastres
Impactos como a diminuição da geração de energia, explica o professor, têm reflexo na irrigação, comprometem a produção frutífera da região e geram impactos sócio- econômicos. “Diferente da inundação e dos deslizamentos que ocorrem rápido, a seca é um fenômeno extensivo, ocorre durante meses e até anos. Para minimizar os efeitos o que se pode fazer é trabalhar com medidas de adaptação, porque ninguém combate a seca”, ressalta.
O pesquisador sugere investimentos na construção de cisternas e outros mecanismos como reflorestamento de nascentes, matas ciliares e a instalação de barragens subterrâneas como medidas de adaptação. Almeida diz que é necessário que a água da chuva fique retida nas barragens dos rios, que fique por mais tempo no solo e, nos períodos mais críticos, o uso contínuo de cisternas abastecidas por carros-pipas. Até mesmo a criação de animais pode comprometer e impactar o solo, diz o professor, que indica o confinamento de animais (caprinos e bovinos) como outra forma de adaptação aos efeitos da seca.
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