Com quase 107 anos de fundação, o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN) passou por muitas mudanças. Na última, em 2008, ganhou status de instituição de nível superior, mas manteve a oferta de educação básica. Nossa Ciência entrevistou os gestores do IFRN para saber que marcas essa nova fase de profundas alterações provocou na instituição depois desses quase oito anos. Participaram da entrevista o Reitor Wyllys Abel Farkatt Tabosa, o Pró-Reitor de Ensino, Agamenon Henrique de Carvalho Tavares e o Pró-reitor de Pesquisa e Inovação, Márcio Adriano de Azevedo.
Nossa Ciência: Como foi a mudança da instituição na última fase quando deixou se der apenas escola de nível médio, para também oferecer o ensino superior?
Reitor Wyllys Abel Farkatt Tabosa: Ela teve uma mudança significativa em todos os seus aspectos. Do ponto de vista estrutural, do ponto de vista organizacional e do ponto de vista do seu fazer. Então, é uma mudança extremamente radical. Preservando a sua gênese de escola de formação profissional, ela não é só técnica de nível médio, tem da Formação Inicial Continuada (FIC) até pós-graduação stricto sensu, com cinco mestrados e caminhando para um projeto de Doutorado, que poderemos ter até o final dessa gestão. O nosso desafio de construção e consolidação dessa outra identidade, dessa nova institucionalidade como alguns autores gostam de colocar, perpassa pela compreensão de todas essas variáveis e isso implica em capacitação de pessoas para lidar com essa nova realidade, em investimentos numa realidade de pesquisa e extensão, que não é da história dessa instituição.
NC: Como a instituição lida com tantas realidades?
Reitor: Ainda é uma construção, porque passa por uma mudança cultural. Aqui é uma instituição plural em todas as suas variáveis, ela não se compara com nenhuma outra instituição no mundo. Se eu pensar nos liceus franceses ou nos colleges americanos e canadenses, todos tem formato semelhante ao nosso tecnológico, que é o ensino superior e que pode migrar para universidade, mas não têm o técnico de nível médio, não têm os alunos de 13, 14 anos quando entram e que quando saem daqui com 18, 19 anos são jovens adultos, convivendo no laboratório, no mesmo ambiente de estudo, na biblioteca com alunos do ensino superior, da pós graduação. Então, o primeiro grande desafio é essa mudança cultural do servidor de perceber que tem que lidar com essas pessoas, com esses sujeitos que são absolutamente distintos em percurso formativo, em formação, de origens muito diversas. O professor também. Muitos dos nossos colegas servidores estudaram na Escola Técnica ou no Cefet, o que é uma vantagem muito grande, e esse caldo cultural vai sendo refermentado, retroalimentado. O outro lado é o pragmatismo das diretrizes institucionais, os nossos documentos normativos, estatuto, regimento, projeto político-pedagógico, plano de desenvolvimento institucional, o arcabouço legal que nos dá os elementos para essas diretrizes funcionem.
NC: O IFRN passou de dois para 21 campi mais a Reitoria em menos de oito anos. Como a instituição tem conseguido lidar com um crescimento tão grande e em tão pouco tempo?
Reitor: Uma coisa chamada planejamento. Nenhum desses campi foi construído ou instalado em algum local à revelia. A definição estava no próprio edital da SETEC (Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação), mas cada um deles foi instalado porque teve um diagnóstico previamente feito já lá em 2008, que tinha como parâmetros, por exemplo, IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) dos municípios, diagnóstico dos arranjos produtivos sociais e culturais locais, as distâncias entre os municípios, de modo que entre campus e outro tivesse um raio de 50 quilômetros. E todas as necessidades de construção, projetos e instalações físicas foram sendo sanadas. Antes, nossa equipe de engenharia era formada por um professor, uma servidora de arquitetura e uma estagiária. Então, instituímos uma equipe de engenharia, que depois foi se ampliando com a contratação de servidores. A contratação de docentes estava em função dos novos cursos. Embora em alguns campi do IFRN ainda se precise terminar alguns elementos estruturantes, todos têm prédio próprio em terreno também próprio com dominialidade em cartório. Também não podemos esquecer que as pessoas são fundamentais. Temos uma equipe de licitação a mais honesta, uma equipe de engenharia da mais dedicada e são pessoas que se desdobraram para fazer isso e essa é a grande diferença da instituição hoje.
NC: Como está a pesquisa no IFRN?
Pró-reitor de Pesquisa e Inovação: No nosso projeto político-pedagógico a pesquisa tem princípio educativo. Isto significa dar aos adolescentes que ainda estão em processo de escolarização, a oportunidade de já ter contato com pesquisadores experientes. Temos fomento com recursos próprios e com recursos da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) e, majoritariamente, do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico). Nós temos projetos de pesquisa que já se enquadram em índices de excelência do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações e projetos desenvolvidos junto a comunidades indígenas; temos a pesquisa de inovação cientifica e tecnológica, que envolve nossos profissionais e alunos de ensino médio, graduação e pós-graduação lato sensu e stricto sensu; o fomento ao empreendedorismo por meio das incubadoras, da transferência de tecnologias como softwares, trabalhos que geram patentes; e estimulamos a atuação junto aos segmentos do mundo do trabalho, como as empresas e as Organizações Não Governamentais.
NC: Quanto da pesquisa realizada no IFRN tem fomento próprio e federal?
Pró-reitor de Pesquisa e Inovação: Para 2016, teremos uma média de 60 projetos de pesquisa fomentados com recursos próprios. Quanto aos federais, é nessa mesma ordem. São cerca de 50 do CNPq, nos programas Pibic Ensino Médio, Iniciação Científica (para graduandos e pós-graduandos) e Pibic AF, específico para ações afirmativas. Um exemplo é o Observatório dos Povos Indígenas e serão incentivadas outras experiências de observatórios com indígenas, com quilombolas, com ciganos, com pescadores, com marisqueiras. No campus Canguaretama, tem o Observatório da Diversidade, que congrega ensino, pesquisa e extensão e o projeto Saberes Indígenas na Escola, que é um aperfeiçoamento para educadores indígenas.
Após a publicação da matéria, a Assessoria de Comunicação do IFRN solicitou a retificação dos números anteriormente fornecidos. De acordo com a instituição, o número de projetos apoiados com recursos próprios é 129; e quanto aos programas do CNPq, são 82 bolsas.
NC: Como está a relação entre o que é desenvolvido na instituição e o mercado?
Pró-reitor de Pesquisa e Inovação: Nós temos uma triangulação importantíssima, formada pelo IFRN, Funcern (Fundação de Apoio à Educação e ao Desenvolvimento Tecnológico do RN) e o ‘mundo do trabalho’, que ocorre em vários campi e que, em alguns casos, ultrapassa a fronteira do estado. Só no campus Natal Central, tem 13 empresas incubadas; no de Canguaretama há uma aproximação à Jeep, na área de petróleo; no do Seridó, temos uma estreita relação com a indústria têxtil; e em João Câmara, a General Eletric montou um escritório em frente ao campus. Dois exemplos dessa relação entre pesquisa e inovação com ensino e extensão podem ser observados em João Câmara e Canguaretama. No caso de João Câmara, as miniempresas foram experiências para consolidar a prática profissional dos estudantes dos cursos integrados de Administração; no campus Canguaretama, a empresa júnior de eventos começou como espaço de prática profissional e hoje já é espaço para aqueles que já concluíram os cursos.
Reitor: Essa interação passa por dois caminhos. Um interno, que é a promoção do empreendedorismo através das incubadoras tecnológicas, e o outro é trazer o empresário para dentro da instituição. Nossa meta é cada campus ter pelo menos uma incubadora até o final da gestão. O outro caminho é a promoção de feiras e eventos, fazer editais em parceria, enfim, trazer o empresário para que ele traga projetos para serem desenvolvidos conosco.
NC: Como tem sido os resultados da participação dos alunos nas provas nacionais?
Pró-Reitor de Ensino: Na OBMEP (Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas), os primeiros lugares do certame nacional são sempre nossos e na OBM (Olimpíada Brasileira de Matemática) temos excelentes resultados em nível local e regional. Se o IFRN fosse um estado, nós teríamos mais representação na Olimpíada Nacional em História do Brasil, que vai ocorrer em Campinas/SP nos dias 20 e 21 de agosto, do que a maioria dos estados do País. Das 57 equipes do Rio Grande do Norte, 43 são do IFRN. Temos trabalho na Olimpíada do Conhecimento e de Astronomia.
NC: Como a mudança de governo pode afetar o instituto?
Reitor: Essa é a pergunta que os servidores estão fazendo. Eu fui pró-reitor de Extensão, depois, pró-reitor de Planejamento. O planejamento que nós estamos executando em 2016 foi construído na minha gestão de pró-reitor. Hoje nós temos uma instituição solidamente implantada no Rio Grande do Norte. Primeiro em infraestrutura, que é preponderante, espaço físico, ambiente de trabalho, material permanente, logística, transporte, pessoal. A segunda questão importante é a estrutura organizacional, nos dá uma segurança jurídica e que está muito bem pavimentada: temos estatuto, regimento geral, regimento dos campi, documentos normativos de ensino, pesquisa e extensão, de TIC (tecnologia de informação e comunicação), gestão de pessoas. Temos também um conjunto de colegiados, que têm as suas atribuições definidas e fazendo com que as coisas aconteçam quando precisam acontecer: aprovação de normas, de projetos de cursos. Essa é uma instituição que preza pelo fortalecimento do papel dos colegiados, seja do colégio gestor do campus, do conselho escolar do campus, dos conselhos de ensino, pesquisa e extensão, do colégio de dirigentes e do conselho superior. E por fim, e eu falo com muita propriedade, um sistema de planejamento que nos permite com muita clareza saber o que estamos pensando e para onde queremos ir, a partir de um plano de desenvolvimento já elaborado e aprovado. Estamos mandando 123 alunos de avião, acompanhados dos servidores, para a Olimpíada Brasileira de História do Brasil, em Campinas/SP. Isso é praticamente lotar um avião. Qual é a instituição pública neste país hoje que tem condição de fazer isso? Isso está planejado desde 2015/2016, na Diretoria de Gestão de Atividades Estudantis e nós também vamos mandar nossos alunos para os Jogos intercampi e para o CONNEPI (Congresso Norte-Nordeste de Pesquisa e Inovação), que deverá acontecer no Piauí. Esse sistema de planejamento que faz com as coisas aconteçam porque a gente pensou nisso lá atrás. Há uma serie histórica desse planejamento que a gente vem aprimorando ano a ano, que faz com a gente tenha cautela é claro, mas que tenha a tranquilidade de atravessar este caminho.
NC: Há uma intenção de se reduzir de quatro para três anos o tempo do curso Técnico Integrado oferecido pelo IFRN. Qual é o porquê a mudança?
Reitor: Nós hoje representamos um dos principais expoentes de oferta de educação básica do Rio Grande do Norte. Estamos fazendo a diferença em Pau dos Ferros, em Apodi e todos os lugares onde estamos. Com a mudança, há uma redução em 25% no tempo que o estudante fica aqui e isso significa mais 25% de estudantes no IFRN tendo a mesma formação de qualidade com o tempo menor. Outro fator é que isso vai ao encontro do que está acontecendo no mundo inteiro no processo de formação de pessoas e ainda vai favorecer o processo de verticalização, porque o estudante formado aqui vai poder fazer os nossos cursos de nível superior.
NC: Quais são os planos do IFRN para o futuro próximo e distante?
Reitor: A minha grande meta para até o final da minha gestão é a mudança do curso técnico integrado de quatro para três anos, por isso a gente está em processo de revisão organizacional de estatuto, de regimento, de projeto político-pedagógico. O principal é consolidar essa nova institucionalidade com a articulação dos diferentes níveis e modalidades, para que esse aluno, que entre no início do ano letivo com 14 anos, possa ter todo o seu percurso formativo até a pós-graduação stricto sensu. Essa compreensão de que ele não precisa sair para completar sua formação em outra instituição é um grande salto que vamos dar. O sujeito formado pela instituição vai ter uma densidade acadêmica, de formação e humana muito forte e isso vai fazer a diferença na sociedade, até mesmo para a consolidação de um país que seja mais tolerante, mais compreensivo, que seja mais solidário, que pense na sociedade como um todo e não apenas no indivíduo. Esse é o tipo de formação que se tem e quanto maior percurso aqui, mais isso se consolida com o passar dos anos. Para que a pesquisa tenha o seu expoente, para a que a extensão dialogue com a comunidade de forma mais próxima, que o ensino se fortaleça como sempre um ensino de excelência a cada vez que nossos estudantes participem dos diferentes projetos, das diferentes ações isso tudo vai estar interligado por um objetivo de criar na sociedade uma massa de pessoas que pense no outro, na sociedade, no país que lhe deu todas as oportunidades.
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