Foto: Cícero Oliveira/UFRN.
Cientistas na UFRN desenvolvem formulação para melhorar os chamados "buracos de minhoca" e aumentar produtividade de reservatórios de petróleo
Uma das táticas comuns para tornar um poço de petróleo mais eficiente é a formação de “buracos de minhoca” nas rochas. Longe de ser fruto da ação de minhocas propriamente, esses canais de escoamento dentro das pedras ocorrem a partir de uma reação química entre o ácido clorídrico e a rocha carbonática. Com eles, é possível aumentar a produtividade de reservatórios.
Entretanto, a taxa de reação de dissolução da substância apresenta-se muito alta, o que ocasiona o consumo imediato do ácido no entorno do poço antes de uma penetração mais profunda na matriz rochosa. Alcides de Oliveira Wanderley Neto, professor do Instituto de Química (IQ) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) explica que, neste caso, a superfície da rocha é consumida e, consequentemente, não há a formação dos buracos de minhoca.
“Pensando nisso, pesquisamos e desenvolvemos uma alternativa, uma formulação, que é a mistura de um tensoativo com o ácido que faz a reação deste ácido com a rocha carbonática acontecer de forma bem mais lenta. No caso, a formulação vai conter o tensoativo não-iônico nonilfenol etoxilado misturado em solução de ácido clorídrico”, coloca o pesquisador, atualmente também coordenador do Laboratório de Tecnologia de Tensoativos e Processos de Separação (LTT/IQ/UFRN), local onde parte dos experimentos aconteceram. Denominada “Uso de ácido clorídrico e nonilfenol etoxilado para preparação de formulações retardantes da reação de dissolução em matrizes carbonáticas”, a invenção teve seu pedido de patente realizado no último mês de dezembro.
Marcos Allyson Felipe Rodrigues, cientista que coordenou o estudo junto com Alcides, complementa que a simples mistura do tensoativo com o ácido faz a reação deste ácido com a rocha carbonática acontecer de forma bem mais lenta. Para ele, essa é uma condição importante para se criar caminhos vazios na rocha capazes de conectar o reservatório ao poço produtor, contribuindo para a retirada do óleo do subsolo.
Se a injeção de ácido for bem-sucedida, é sinal de que a reação com a rocha carbonática se deu formando um número limitado de canais, os “buracos de minhoca”, responsáveis pelo escoamento de óleo do reservatório ao poço – Foto: Cícero Oliveira/UFRN
A descoberta dessa substância pelos cientistas da UFRN mostra-se relevante, pois grande parte da reserva mundial de petróleo e gás concentra-se em reservatórios carbonáticos. Trata-se de reservatórios de alta heterogeneidade e estruturas porosas, havendo predominância da presença de descontinuidades geológicas, como fraturas e falhas. Devido às complexas condições físicas e químicas presentes em suas rochas, muitas vezes a liberação e fluxo de hidrocarbonetos dependem de técnicas de estimulação que visem aumentar a produtividade de petróleo nos campos de perfuração.
Acidificação
“A alteração do lastro temporal da acidificação é a principal contribuição da invenção”, realça Dennys Correia da Silva. Na estimulação de poços de petróleo, a acidificação da matriz é aplicada para remover danos à formação no entorno do poço, visando a sua remoção e restaurando a permeabilidade original do reservatório ou, no caso de reservatórios carbonáticos, buscando melhorar as condições de fluxo próximo ao poço por intermédio da dissolução do carbonato.
O sucesso da acidificação da matriz depende de alguns fatores, tais como boa avaliação de poços candidatos usando históricos de completação e produção, análise de vazão no poço, composição de formação do reservatório, seleção de solventes, ácidos e composições de ácidos para prevenir ou reduzir incompatibilidades com a formação produtora e efetiva preparação de poço, e supervisão de trabalho.
Marcos Allyson identifica que, na estimulação de poços de petróleo, a acidificação apresenta-se como uma das melhores e mais eficazes tecnologias para aumentar a produtividade de reservatórios, “desde que ocorra uma distribuição controlada da injeção de ácido de forma a redistribuir a acidificação de matrizes heterogêneas”, ressalta o professor do Departamento de Engenharia de Petróleo. Nos experimentos, a aplicação do tensoativo na formulação contribuiu para a criação de canais de menor diâmetro, facilitando o posterior escoamento do óleo sem comprometer a integridade da formação, quando comparado aos canais formados com óxido clorídrico puro, com vantagens adicionais por ser de fácil preparo no campo, baixa toxicidade e melhor relação custo-benefício.
“Os resultados mostraram que o valor da viscosidade da solução de ácido clorídrico aumentou devido à adição do tensoativo e que também aumentou devido ao aumento do número de grupos etoxilados. A presença da molécula de tensoativo requer moléculas de água do meio para sua hidratação e o aumento no grupo etoxilado aumenta ainda mais a quantidade de água para tornar o tensoativo solúvel no meio. Assim, a quantidade de moléculas de água no meio torna-se ainda menor, resultando em aumento da viscosidade. Mesmo com o aumento da viscosidade, todas as formulações podem ser bombeadas facilmente através do poço ou para o reservatório, o que é uma condição desejável para o processo de estimulação ácida da matriz carbonática”, circunstanciou Alcides Wanderley.
Dennys Correia frisa ainda que até o momento, não foram encontrados relatos sobre o uso de tensoativos nonilfenol etoxilado em formulações ácidas com a função de agente retardante. No caso do invento, ele acrescenta que o resultado é alcançado pois os grupos etoxilados presentes na estrutura do nonilfenol são responsáveis por elevar sutilmente a viscosidade do meio, bem como, atraem os íons H+ para perto do aglomerado de tensoativos. Esses fenômenos retardam a velocidade ao encontrar a superfície da rocha carbonática, que resulta no retardo da reação propriamente. “Além deles, os tensoativos aumentam a molhabilidade do fluido sobre a rocha, o que contribui para a reação acontecer num determinado ponto dela, onde ocorrerá o início da reação controlada que determinará um buraco de minhoca mais profundo”, acrescenta Alcides Wanderley.
O grupo realizou parte dos experimentos também no Laboratório de Recuperação Avançada (LABRES) – Foto: Cícero Oliveira/UFRN
Além dos três, o grupo de inventores contou com a contribuição de Guilherme Mentges Arruda e Francisco Moisés Freitas da Costa no desenvolvimento da tecnologia. Eles esclarecem que os próximos passos do estudo envolvem realizar testes de fluxo em elevadas condições de temperatura e pressão, tais como o pré-sal brasileiro, situação que por si só influencia na ação das forças dentro do processo de reação ácido-carbonato.
Os inventores situam, por fim, que há vastas opções de formulações ácidas, com mistura de ácidos ou aditivos químicos, para otimizar o processo de acidificação como alternativa à aplicação do ácido clorídrico convencional, sem aditivos. Esses sistemas ácidos compostos por microemulsões e nanoemulsões são amplamente estudados na literatura. Embora sejam adequados para uso em processos de acidificação de matriz, eles apresentam desvantagens expressivas, como a dificuldade para atingir um sistema homogêneo, tornando-as tóxicas e caras, além de serem termodinamicamente instáveis, o que impede seu armazenamento por muito tempo. “Portanto, soluções de tensoativos com propriedades adequadas são candidatos promissores para controlar a estimulação ácida”.
Fonte: ASCOM- Agência de Inovação da Reitoria/UFRN
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