Para a professora Magda Guilhermino, coordenadora do movimento Defeso da Caatinga, o problema está na captação ineficiente de água no semiárido
Quando chega o período de chuvas no nordeste, somos tentados, erroneamente, a minimizar os problemas provenientes da seca. Mas, de acordo com a professora Magda Maria Guilhermino, da Escola Agrícola de Jundiaí, unidade acadêmica da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e coordenadora do movimento Defeso da Caatinga, “a seca é essencial” para esse bioma integral e exclusivamente localizado no território brasileiro.
“A seca faz parte das estações do ano, que aqui no semiárido são duas: das chuvas e da seca. Sem a estação seca não haveria Caatinga. A seca é essencial para a Caatinga para, por exemplo, o ressecamento do tegumento das sementes (estrutura que envolve e reveste as sementes) para que haja a germinação delas”, explica. A Caatinga ocupa 56% do território nordestino e encontra-se espalhada por todos os estados da região, mais o norte de Minas Gerais.
Ainda de acordo com a professora, com o desmatamento generalizado e o aquecimento global há uma alteração no padrão da duração da época seca e, em adição a esse fato faltam ações eficientes nas esferas rurais e urbanas, em níveis domésticos, industriais, hospitalares, agricultura e outros, de captação, armazenamento e uso racional da água, produção de água e reuso-tratamento, fontes alternativas de energia em micro ou miniunidades que atendam a produção na Caatinga, valorização de plantas e animais nativos e acima de tudo a dificuldade do uso de tecnologias para regiões semiáridas e áridas.
Captação ineficiente de água
Segundo Magda Guilhermino chove no sertão, mas a captação desta água é ineficiente, já que menos de 30% desta água é captada, devido ao assoreamento dos corpos d’agua. “Para se ter uma ideia, o deserto do Negev, no sul de Israel é um dos maiores produtores de alimentos do mundo devido ao uso adequado de tecnologias. Lá no deserto chove 90 mm, num ano bom de chuva, e aqui, numa área pouco chuvosa associada a um ano ruim de chuva, como lá no Assentamento Trangola, Currais Novos, em 2016, choveu 450mm!”, revela a professora.
Secularmente afetada pela degradação ambiental, a Caatinga apresenta sinais de exaustão. Mas apesar desse quadro preocupante, a professora Magda é otimista e acredita que há sempre motivos para comemorar. “Com o tema da Campanha da Fraternidade 2017 Biomas Brasileiros e Defesa da Vida e o engajamento ativo e concreto da arquidiocese do Rio Grande do Norte, o bioma Caatinga foi o tema do lançamento da campanha aqui no estado tornando-a centro das atenções e trazendo a tona, temáticas essenciais, para recuperação e preservação da Caatinga e da agricultura familiar”, comemora.
Ela conta ainda que este fato sensibilizou a sociedade norte-rio-grandense que ficou ciente que mais de 90% da área do RN é Caatinga e quase 100% do estado é susceptível a processos de desertificação. “Nunca se falou tanto sobre Caatinga como se está falando em 2017”, acrescenta. O engajamento popular é outro ponto positivo destacado pela professora. “Apesar da crise politica e moral que vivemos, vejo muitas pessoas e grupos que se articulam e se engajam em causas importantes como, por exemplo, grupo de agricultores familiares, técnicos, leigos, padres, ambientalista que lutam pela recuperação do bioma”.
Políticas públicas
O movimento Defeso da Caatinga tem discutido propostas de ação para o enfrentamento dos problemas que afetam o bioma. A principal proposta é a criação de uma lei em âmbito estadual para estabelecer um fundo, semelhante ao fundo da Amazônia, para restaurar a região. Magda Guilhermino conta que após sete fóruns de discussão sobre como recuperar a Caatinga, os membros do movimento aprenderam com a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) que o ponto de partida para isso é a construção de renques e barramentos.
“Estamos propondo uma política pública Defeso da Caatinga, que visa um subsidio para o agricultor familiar a partir da construção de renques e barramentos para atender ao novo código florestal que trata da restauração das áreas de proteção permanente e reserva legal. Na sequencia, a segunda politica publica intitulada Tecnologias ecológicas que trata das condições necessárias para dar condições de vida e alavancar a produção nas unidades familiares. Este ano tem sido pela busca incessante de políticos que tenham interesse em efetivar essas politicas públicas. Mas, como no saneamento básico, pouca visibilidade se tem neste tipo de ação em longo prazo que é a recuperação da Caatinga. Entretanto, esta recuperação urge se queremos ter futuro de água, ar, cultura e tradição”, alerta.
Além do movimento Defeso da Caatinga, Magda Guilhermino participa do Caatingueiros, grupo multidisciplinar e interinstitucional e multiprofissional que atua na construção de ações que contribuam para a valorização da agricultura familiar e recuperação da Caatinga. “E apesar de toda a limitação de recursos o nosso grupo não parou, nem se querer um dia. Usamos recursos próprios, passamos o chapéu, algum apoio institucional e assim vamos tocando….parar ou desistir jamais!”, ressalta.
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