Pesquisadores de Sergipe investigam como as estruturas das cidades influenciam no esvaziamento das relações cotidianas dos moradores
Para que uma cidade seja considerada “viva”, termo usado por urbanistas para se referir à dinamicidade de pessoas nas ruas, é preciso contar com um planejamento urbano que proporcione elementos convidativos à população e que combine atividades de convívio e de lazer com diferentes grupos sociais.
Com o grande crescimento imobiliário, em especial, de condomínios verticais, criam-se cenários decorrentes do abandono das relações sociais comuns de vizinhanças. O conceito de “desertificação socioambiental” investiga características urbanas que interferem nas dinâmicas sociais e ambientais dos espaços.
Por conta disso, o bairro Jabotiana, em Aracaju, foi escolhido para ser o estudo de caso da dissertação de mestrado de Elaine Vasconcelos Nascimento Leal, apresentada ao Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente (Prodema) da Universidade Federal de Sergipe (UFS). Como resultado do estudo, a localidade apresentou situações de esvaziamento das relações cotidianas dos moradores em áreas naturais, principalmente onde há predominância de condomínios residenciais.
As causas da desertificação
Segundo a pesquisadora, quatro áreas do bairro Jabotiana foram escolhidas pelo rápido crescimento de ruas exclusivas de condomínios que apresentam alguns aspectos físicos que contribuem para a desertificação. “Achamos pertinente fazer um estudo para confirmar se as caraterísticas físicas estavam realmente influenciando nisso e descobrimos que sim, além de outros fatores”, explica.
Jailton de Jesus Costa, orientador da pesquisa, contou que, a princípio, o objetivo era somente analisar se havia ou não uma desertificação no bairro, no entanto, esta não foi a única conclusão. “Com a sobreposição de mapas, descobrimos que há um problema grave de planejamento urbano, por exemplo, edifícios construídos em áreas de preservação ambiental”, complementa.
Na pesquisa, foram analisados aspectos físicos de áreas do bairro, que poderiam levar ou não à perda dessas interações. Suas calçadas foram avaliadas como estreitas, com obstáculos, danificadas, em pavimentação inadequada, sem acessibilidade universal e com cruzamentos de ruas perigosos. A ciclovia também apresentou situações semelhantes.
Em relação à distribuição dos usos do solo – refere-se à presença de estabelecimentos de atividades necessárias, opcionais e sociais, como: lojas, restaurantes, monumentos e residências –, segundo o estudo, em alguns trechos do bairro há enormes conjuntos habitacionais com ruas escuras e também vazias de pessoas. Muitos de seus comércios fecharam as portas e é preciso percorrer um longo trajeto até que apareçam, gradativamente, atividades econômicas e movimentação.
Convívio social
Nos espaços do bairro avaliados na pesquisa foi percebido que praças, árvores e as marquises, combinadas aos assentos e aos serviços prestados onde estão localizadas, proporcionam oportunidades para essas interações. Apesar disso, a relação de pessoas às margens das vegetações remanescentes é escassa, considerando que as áreas naturais que ainda são expostas nas ruas não possuem calçadas ou outros espaços de transição adequados e atrativos.
Foi observado também que quarteirões em menores dimensões e com edificações de até dois pavimentos apresentam uma quantidade maior de pessoas nas ruas, ao passo que as com prédios de maior quantidade de pavimentos e áreas mais extensas possuem fluxos menos intensos de pedestres. Todavia, atenta-se que em algumas situações, também ocorre o contrário: ruas com edificações com mais de dois pavimentos possuem mais pessoas, mostrando que outros fatores também podem influenciar o convívio social.
Nas entrevistas foi possível notar que a maioria dos moradores não demonstrou incômodo em relação ao trânsito intenso de veículos motorizados como cooperador da desertificação socioambiental. “Pelo contrário, acho que ter mais carros deixam as ruas mais movimentadas e mais seguras de ladrões ‘pra’ gente caminhar por aqui. Tem gente vendo”, relatou um desses moradores, segundo o trabalho de Elaine.
Por fim, as mais recentes ocupações urbanas do bairro Jabotiana foram descritas como espaços de transição rígidos entre o meio interno (aos condomínios) e externo, com iluminação insuficiente nas ruas e “arquitetura defensiva”, associada à proteção contra violência (muros altos e fechados); situação que cria segurança para quem está dentro das propriedades, mas perigo para quem transita fora delas.
A dissertação está disponível na íntegra no Repositório Institucional da UFS.
Fonte: Ascom da UFS
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