Para o engenheiro Alex Sandro Gomes ainda falta disposição das pessoas na adoção de soluções efetivas para os problemas da educação
Alex Sandro Gomes é um Engenheiro Eletrônico formado pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) que decidiu contribuir com um dos pilares da sociedade: a educação. É mestre em Psicologia Cognitiva e tem doutorado em Ciências da Educação pela Université de Paris v (René Descartes). Ele descobriu a cultura livre na década de 1990, quando ainda era estudante de doutorado na Universidade de Paris. “Assisti a uma palestra de um aluno da instituição que propagava que software é um legado cultural da humanidade. Na época, não imaginei que um dia estaria liderando projetos de software livre”.
Atualmente é Professor no Centro de Informática (CIn) da UFPE, bolsista de Produtividade Desenvolvimento Tecnológico e Extensão Inovadora 2 do CNPq e membro da Academia Pernambucana de Ciências. Atua com a concepção de ambientes colaborativos de aprendizagem.
Nessa entrevista ao Nossa Ciência, o professor Gomes conta sua trajetória, fala sobre plataformas de aprendizagem e dos desafios para que essa tecnologia esteja nas salas de aula no Brasil.
Nossa Ciência: O que levou um engenheiro eletrônico para a Psicologia Cognitiva e as Ciências da Educação?
Alex Sandro Gomes: Tomei a decisão nos idos de 1986. O Brasil vivia tempos de uma inflação muito alta e muita instabilidade. Além disso, eu fui militante do movimento estudantil. Entendi que precisava contribuir com um dos pilares da sociedade e então decidi atuar na área de educação.
NC: Depois do Doutorado e de ter conhecido a cultura do software livre que rumo o senhor tomou?
ASG: Voltei ao Brasil, fui trabalhar numa Faculdade de Educação na Universidade Federal do Ceará (UFC), em Fortaleza. Lá, conheci o mundo das plataformas de aprendizagem, mas nada de falar em software livre. Depois, mudei para Recife para trabalhar no CIn onde estou até hoje. É um Centro de Referência em Ciência da Computação.
NC: Como o senhor chegou ao Centro de Informática da UFPE?
ASG: Recebi um convite para atuar no projeto de um ambiente de aprendizagem que ocorreria no Centro de Estudo e Sistemas do Recife, ainda em 2000. Em seguida, prestei concurso para o CIn/UFPE. No CIn aprendi a conceber plataformas de aprendizagem. Já vamos na quarta. A história começou com o Amadeus (que foi até a versão 0.9 em Java), depois veio o Redu (hoje Openredu). Atualmente, estamos prestes a lançar a Inovaula.com e o Youubi como fruto do trabalho do nosso grupo interdisciplinar e interinstitucional de pesquisa.
NC: Em linhas gerais como são essas plataformas de aprendizagem Amadeus, Openredu, Inovaula e Youubi? No que elas se diferenciam?
ASG: O Amadeu é um Learning Management System (LMS) e possui uma estrutura mais linear de aprensentação dos conteúdos. O Openredu é uma rede social com funcionalidades de LMS, o que torna as trocas muito mais intensas. O Youubi é uma plataforma de aprendizado móvel e ubíquo com geolocalização para mediar a aprendizagem no espaço urbano. Todas essas plataformas destinam-se a mediação da aprendizagem entre dois perfis de usuários: alunos e professores.
NC: Software livre para educação pública é uma realidade no Brasil? E no nordeste?
ASG: Em pouquíssimos locais. O uso de software livre exige, muitas vezes, a disposição de se envolver com decisões técnicas e gestão de TI (tecnologia da informação) de uma forma mais aberta. Além disso, a adoção de software livre representa uma solução e, aparentemente, as pessoas parecem que não desejam soluções efetivas para os problemas da educação, como afirmou o nosso ex-ministro da Educação Renato Janine Ribeiro.
NC: O que está faltando para que essa tecnologia esteja presente nas salas de aula da rede pública brasileira?
ASG: Uma resposta difícil, pois há muitos fatores. Trata-se de um problema sistêmico e a adoção depende de fatores como a liderança da equipe pedagógica e de gestão das secretarias e das escolas, da formação dos professores, do trabalho de vários profissionais para que as tecnologias estejam disponíveis nos momentos de mediação da aprendizagem, da qualidade de suas interfaces, entre muitos outros fatores.
NC: Alguma secretaria de educação adotou ou adota essas plataformas de aprendizagem?
ASG: A Secretaria de Educação de PE está realizando uma implantação oficial.
NC: Já há algum exemplo de sucesso?
ASG: Para minha felicidade, um caso de sucesso aconteceu em minha cidade natal, Arcoverde (PE), distante 243 Km da capital Recife. Em agosto de 2017, recebemos fotos do professor Chico Romildo, da Escola Erem Vitorino Freire, e seus alunos usando a plataforma de aprendizagem Openredu. Essa ferramenta, fruto de mais de sete anos de trabalho e de mais de R$ 1,5 milhão em investimentos públicos, sendo usado em uma escola pública estadual. Foi uma emoção ver essas imagens! O desejo de uma década e meia surtindo efeito. O design conquistando professores e alunos e dando um novo sentido à prática da socialização do conhecimento entre gerações de uma forma nova.
NC: Isso significa que o senhor está no caminho certo?
ASG: De fato, dar ao professor a liberdade para escolher faz todo sentido. Todo investimento em design para gerar tecnologias de ensino faz sentido. Antecipar todos os detalhes de um uso em condições reais, em escolas reais, com professores e alunos reais, faz sentido. Estudar o uso de protótipos faz sentido. Além disso, faz muito sentido fazer pesquisa interdisciplinar envolvendo Ciência da Computação, Design e Educação para conceber tecnologias para Educação. E é impagável esperar anos a fio para no final começar a ver o sorriso e o brilho espontâneo no olhar de alunas, alunos, professoras e professores transformando software livre em espaços de aprendizagem e desenvolvimento.
NC: Quais os próximos passos?
ASG: Estamos trabalhando agora no projeto de Formação de Agentes para Sustentabilidade do Software Público Brasileiro, que é um programa de extensão com atividades coordenadas pela Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), com o apoio de diversas instituições de ensino superior atuantes no Vale do São Francisco. O programa está estruturado em cinco ações de extensão articuladas de caráter multidisciplinar e integradas a atividades de pesquisa e de ensino. E está dando certo. Muitos profissionais de TI foram formados na região de Petrolina (PE) e veremos os resultados nos próximos anos.
Edna Ferreira
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