Com os pés no presente e a cabeça no futuro Entrevistas

quarta-feira, 18 janeiro 2017

Pesquisador no nível mais alto da carreira acadêmica, o professor Adaildo Gomes fala de sua trajetória na UFRN

A característica de ser muito estudioso tem acompanhado toda a trajetória escolar de Adaildo Gomes D’Assunção, professor titular da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), na área de superfícies seletivas de frequência, antenas, propagação, materiais cerâmicos, metamateriais, dispositivos EBG, comunicações sem fio, ondas milimétricas e terahertz.

Fez todo o ensino básico em Natal (RN). Estudou no Ginásio São Luiz, Ginásio Salesiano, Colégio Marista e Colégio Estadual do Atheneu, onde concluiu o cientifico (atual Ensino Médio). Talvez, por influencia do irmão, Adailton Gomes, que cursava Medicina e dos amigos da turma do ginásio, pensou em fazer seguir essa carreira. Mas um professor – João Faustino, a quem ainda se diz grato, identificou sua vocação para a Engenharia e lhe orientou a prestar vestibular para essa área. Entre Civil e Elétrica, escolheu a segunda, que era uma modalidade recém-criada, no curso de Engenharia.

Ainda na Graduação se encaminhou para a Eletrônica, onde consolidou uma bem sucedida carreira acadêmica, alcançando o nível de pesquisador de produtividade 1A, o mais alto da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal (Capes). Começou como estagiário e foi efetivado na Telern, a companhia estatal telefônica do Rio Grande do Norte, depois fez o mesmo percurso no Centro de Lançamento da Barreira do Inferno (CLBI). Convidado pelo professor Fernando Nobre, então chefe de Departamento de Engenharia Elétrica e vice diretor da Escola de Engenharia  da UFRN, começou a carreira docente há 40 anos. Acompanhe a entrevista.

Nossa Ciência: O senhor tem uma carreira consolidada. Como foram as escolhas?

Adaildo Gomes: Eu não tive muita dificuldade de escolher, porque as coisas foram acontecendo, que tal maneira que elas foram se sobrepondo e convergindo para esse ponto que seria trabalhar com telecomunicações, embora eu tivesse formação em eletrônica. A parte de telecomunicações foi complementada na Pós-Graduação.

NC: O senhor teve uma ampla carreira administrativa na UFRN…

AG: Ocupei a chefia do Departamento mais de uma vez; a coordenação do curso de Graduação quatro vezes; do Mestrado em Engenharia Elétrica e do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Elétrica (PPGEE); a vice-diretoria do Centro de Tecnologia, por oito anos; e fui Pró-Reitor Adjunto de Pesquisa e Pós-Graduação, quando o Pró-Reitor era o professor Eudenilson Lins, meu grande companheiro. Mas mesmo ocupando os vários cargos, eu nunca me afastei da atividade acadêmica. Eu participei muito da elaboração do projeto do INCT- CSF, depois de criarmos o curso de Engenharia de Telecomunicações.

NC: Sua Pós-Graduação foi feita na Unicamp. Como foi a experiência?

AG: Foi uma experiência muito boa lá na Unicamp. Foi assinado um acordo de cooperação entre a Unicamp e a UFRN e essa cooperação foi extremamente importante, pois foram quase 90 professores da UFRN de todas as áreas para a Unicamp. O meu orientador, o professor Atílio José Gerola, representou a Unicamp assinando o documento. Eu fiz Mestrado e Doutorado na área de Eletrônica e Telecomunicações. Eu conclui o Doutorado em 1981.

NC: A volta desse grupo causou impacto nas pesquisas da UFRN?

Fez diferença sim! Realmente fez. Foi muito interessante porque mudou o patamar, o conceito de professor universitário no Rio Grande do Norte. Não era mais aquela pessoa que só ministrava aula, corrigia provas, fazia algumas práticas. Além da Unicamp, a UFRN fez cooperação com várias instituições, como as federais de Santa Catarina (UFSC), de Campina Grande (UFCG) e do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ) , foi algo muito enriquecedor.

NC: Como o senhor vê a evolução da UFRN em termos de pesquisa?

AG: De 1980 pra cá a coisa evoluiu muito, mas passou pela necessidade de criação do curso de Mestrado e depois evoluiu para Programa de Pós-Graduação. Eu me lembro bem dessa história porque eu participei efetivamente. Em março de 1982, a reitoria fez uma consulta ao professor Jose Pereira da Silva, que era diretor do Centro de Tecnologia, sobre as áreas que poderiam iniciar com atividades de pós-graduação. Eu e os professores José Luiz da Silva Júnior, Eronides Xavier da Silva Filho e Ivanilson Raimundo de Souza fizemos uma proposta ao Departamento para a criação do Mestrado; o Departamento criou uma comissão, apresentou o projeto às várias instâncias e o curso foi criado. No ano seguinte foi transformado em programa e desde lá, essa nossa área de telecomunicações existe. Podemos dizer, então, que tivemos uma evolução excelente, tendo em conta a realidade que vivíamos. É claro que hoje a busca é pelo aperfeiçoamento. Queremos um PPGEE com conceito 6 de preferência, mas pelo menos com conceito 5.

NC: Quais são as dificuldades de se fazer ciência na sua área no Brasil?

AG: A maior dificuldade é identificar dentro da sua área o que é possível fazer. Não adianta ficar dando murro na parede ou reclamando. Quando eu cheguei do Mestrado e vi os computadores, em vez de fazer a parte prática, eu resolvi dar continuidade à parte teórica, que foi a minha opção para o Doutorado, porque era mais fácil de caminhar na frente da onda. O que eu precisava era computadores, estudo e dedicação.

NC: E hoje, quais são os grandes problemas?

AG: O problema da bibliografia está resolvido com o acesso a praticamente todas as boas publicações que existem na nossa área e em todas as áreas, disponível no portal de periódicos da Capes. A parte de recursos humanos também está bem tranquila, mas gostaríamos que aqueles que estão sendo formados tenham oportunidades e, felizmente, isso aconteceu nos últimos seis anos. Muita gente foi contratada e isso foi muito positivo. Na parte de recursos materiais, infelizmente, a necessidade é sempre maior. Quando nós conseguimos comprar os equipamentos, a tecnologia já deu um passo à frente. Tem também umas barreiras que são próprias gestão. O governo compra um equipamento que custa R$ 300 mil. Quando esse equipamento apresenta defeito, a empresa cobra R$ 50 mil para consertar e é preciso explicar que aquela é a única empresa capacitada para consertar este equipamento. O governo está correto? Sim. Tem que ser rígido, ver se o preço é aquele mesmo e o governo só tem encontrado mecanismos para se defender nesses casos através da observação de valores cobrados em situações parecidas, então ele começam a exigir documentos e mais documentos… O tempo vai passando, não se pode devolver o equipamento porque provavelmente vai ser consertado, mas ele vai ficando, ficando e cria até raiz (risos). Isso incomoda um pouco, mas é correto. O dinheiro é público.

NC: o que lhe dá mais prazer: a atividade pedagógica, a bancada ou a administração?

AG: Eu gosto da parte administrativa porque ela é que dá a chance de se brigar para viabilizar os projetos. Normalmente a atividade de pesquisa é praticada através do PPG e é cada vez melhor porque é através dele que nós temos acesso aos alunos de mestrado e Doutorado e isso estimula o professor a já investir na Graduação, procurar os alunos que potencial e interesse na atividade de pesquisa, possivelmente na atividade acadêmica e ficou mais facilitado com as bolsas de IC. Depois que a gente orienta alguns alunos de Mestrado ele já começa a nos auxiliar, depois vem os alunos de Doutorado e a gente tem um trabalho coletivo.  Existe também o interesse institucional de formar grupos de pesquisa. Hoje a gente trabalha com várias linhas de pesquisa com colegas que foram meus orientandos. Mas, sem dúvida, uma sala de aula para o professor é o ambiente mais adequado seja de graduação ou de pós. Normalmente nos curso de Engenharia Elétrica e de Telecomunicações o número de alunos em sala de aula da pós é pequeno e na graduação é maior. Então na graduação é mais agradável porque é ali que a gente está plantando para ver se colhe alguma coisa mais adiante. Mas a sala de aula é mais prazerosa.

NC: Quais são os planos para o futuro?

AG: Eu vou ficar fazendo o que eu tenho feito. Agora eu estou voltando para a pesquisa porque finalmente a gente teve a oportunidade de ter um laboratório na área de sinais e simulação e de redes de computadores. Para contornar uma dificuldade momentânea, porque nosso equipamento mais caro quebrou, buscamos uma cooperação com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) para um nanossatélite. Eu só acho ruim essa necessidade de adquirir equipamentos mais caros, mas isso não impede porque existe tanta possibilidade de avanço científico e tecnológico na faixa de frequência que temos os equipamentos. Como pesquisador, a gente sempre está com um pé aqui e outro lá na frente.

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