Andressa Morais: Queremos ampliar alteridade e combater etnocentrismo Entrevistas

quarta-feira, 21 maio 2025
Andressa Morais, coordenadora do Bacharelado Interdisciplinar em Humanidades da UFRN (Foto: Cedida)

Nova coluna quinzenal do portal Nossa Ciência traz análises críticas das Ciências Humanas sobre os desafios e debates da atualidade.

A partir desta quarta-feira (21), quinzenalmente, os leitores do portal Nossa Ciência terão mais uma opção de leitura: estreia hoje a coluna HUMANAS. A coluna explora temas de interesse geral, com foco em opiniões e debates sobre notícias e acontecimentos atuais, a partir de um olhar das Ciências Humanas. “Tomaremos como escopo de nossa produção teorias, conceitos e categorias de análise do repertório das Ciências Humanas”, afirma Andressa Lidicy Morais Lima Freitas, professora adjunta do Instituto Humanitas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e coordenadora do Bacharelado Interdisciplinar em Humanidades da UFRN.

A curadoria da coluna será do Grupo de Pesquisa Social da UFRN (GPS/UFRN), por meio da mobilização de intelectuais que compõem seu quadro efetivo. Docentes efetivos da UFRN e pessoas convidadas, incluindo orientandas e orientandos em nível de doutorado, integram o grupo de autoras e autores que assinam opiniões críticas e reflexivas sobre os acontecimentos do mundo contemporâneo.

Quem dá início à jornada é Alba Azevedo, aluna de doutorado no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais. No texto, a pesquisadora do GPS/UFRN critica os estereótipos que opõem beleza e inteligência feminina, revelando como eles sustentam, de forma sutil, a violência simbólica e a desigualdade de gênero na sociedade patriarcal. Alba Azevedo é juíza de Direito do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte e professora da Escola da Magistratura do RN.

A coluna é coordenada conjuntamente pelos professores Carlos Eduardo Freitas Morais, do Departamento de Ciências Sociais, Lucas Trindade da Silva, do Instituto Humanitas, ambos na UFRN) e Alyson Freire, do Instituto Federal de Ciência, tecnologia e Inovação do Rio Grande do Norte (IFRN).

O portal Nossa Ciência conversou com a professora Andressa Morais sobre a coluna HUMANAS, por meio de uma plataforma de comunicação. Acompanhe:

Atualizando dilemas

Nossa Ciência: Quem é o público preferencial para a coluna HUMANAS?

Da esquerda p a direita: Professores Carlos Eduardo Freitas Morais, Andressa Morais e Lucas Trindade da Silva, da UFRN e Alyson Freire, do IFRN (Foto: Cedida)

Andressa Morais: Nosso público preferencial é bastante amplo. Queremos alcançar, em um primeiro momento, nossos estudantes da UFRN, de todos os cursos, não apenas das Ciências Humanas. Do nosso ponto de vista, parece fundamental que a comunidade universitária, em sua diversidade, perceba a relevância das nossas discussões para a formação integral do nosso corpo discente.

Em segundo lugar, desejamos dialogar com a comunidade acadêmica em geral, inclusive de outras instituições e áreas do conhecimento, fomentando um debate interdisciplinar. E, principalmente, queremos alcançar a sociedade potiguar e brasileira como um todo. Compartilhamos o entendimento de que é necessário e urgente levar reflexões complexas de forma acessível ao público leigo, sobretudo mostrando como as Ciências Humanas são essenciais para entender os desafios do nosso tempo.

Nós, que fazemos pesquisas empíricas e pesquisas sociais de gabinete, estamos a todo momento atualizando os nossos dilemas, enfrentando questões inovadoras e respondendo com o que temos de mais atual em matéria de teorias sociais contemporâneas.

NC: Qual será o conteúdo?

AM: O conteúdo será diversificado, sempre com um olhar das Ciências Humanas sobre temas relevantes da atualidade. Podemos abordar questões como as que discutimos em nossos fóruns acadêmicos, como o último Seminário de Pesquisa Social, realizado em dezembro de 2024 na UFRN.

Naquela ocasião, reunimos um grupo coeso e mobilizado para enfrentar questões como desigualdades sociais, pluralismo ontológico, relações étnico-raciais, desigualdade de gênero, problemas da racionalização, movimentos sociais, estética, processos de conflitos e lutas ambientais, ensino e educação, ética, a presença dos afetos na política, os impasses do mundo digital, entre outros temas pertinentes.

Nosso intuito é trazer a profundidade da análise antropológica, sociológica, filosófica e histórica para o debate público potiguar.

Debate e presença pública

NC: Qual será a periodicidade?

AM: Inicialmente, penso que uma periodicidade quinzenal seria interessante para conseguirmos manter a qualidade dos textos e o engajamento do público. Podemos avaliar a possibilidade de aumentar a frequência conforme a coluna ganhe corpo e tivermos mais colaboradores envolvidos.

NC: Quem vai escrever?

AM: A ideia é que a coluna seja um espaço plural. Inicialmente, nós, professores(as) e pesquisadores(as) do nosso grupo de pesquisa e de áreas afins da UFRN, seremos os(as) principais colaboradores(as). No entanto, queremos abrir espaço para a participação de pós-graduandos(as), cujas pesquisas trazem olhares renovados e relevantes.

Quem sabe, futuramente, poderemos convidar colegas de outras universidades e até mesmo representantes da sociedade civil com expertise em determinados temas? Mas, inicialmente, temos um trabalho coletivo desse grupo para pavimentar boas condições estruturais de debate e presença na esfera pública potiguar, com responsabilidade e atentos às boas práticas de divulgação científica.

NC: Como será feita a seleção dos temas?

AM: A seleção será feita de forma colaborativa. Somos um grupo heterogêneo que se abriu imediatamente para essa oportunidade de ampliar nosso diálogo e redesenhar os modos de comunicar teorias e questões relevantes sobre a vida social.

Reuniões periódicas do grupo são o ponto de partida para discutir os assuntos mais urgentes e relevantes do momento, levando em consideração os debates acadêmicos e as demandas da sociedade.

É claro que, eventualmente, também podemos abrir um canal para sugestões de temas por parte dos nossos estudantes e do público em geral, mas isso vai depender de como nossa conversa se desenvolverá a partir do momento em que a coluna estiver no ar. A ideia é que esse espaço seja dinâmico, envolto em frescor e estímulo intelectual, e responsivo aos acontecimentos do tempo presente.

NC: Quais são os objetivos do grupo com a coluna?

Pesquisadores do Grupo de Pesquisa Social da UFRN (Foto: Cedida)

AM: O GPS/UFRN deseja, antes de mais nada, trabalhar para democratizar o conhecimento — esse talvez seja o principal eixo de nossas ações com essa coluna. Queremos tornar acessíveis as discussões das Ciências Humanas para um público mais amplo, aproximar nossas pesquisas da vida social e daquilo que habitamos coletivamente.

Nosso segundo objetivo é oferecer um pensamento crítico, por meio de ferramentas conceituais e analíticas, para que as pessoas possam questionar e compreender os desafios do mundo ao seu redor com base na opinião qualificada dos nossos cientistas sociais. Além disso, penso que essa coluna atende a um imperativo moral do nosso momento histórico: mostrar a relevância da produção acadêmica e do papel da universidade para o bem comum.

Ao iniciarmos uma agenda de publicações focada nesses aspectos, queremos contribuir para sustentar discussões mais informadas e produzir o bom debate público, estimulando reflexões em nossos leitores e pavimentando o exercício da boa razão e da vontade de conhecimento.

A devastação das fake news

NC: Como a disseminação de mentiras (fake news) atinge a universidade?

AM: Interessante essa questão, pois ela permite arrematar tudo o que vínhamos conversando. Entendo que a disseminação de fake news atinge a universidade de diversas formas perniciosas.

A primeira ferida causada pelas fake news é descredibilizar a ciência e o conhecimento produzidos academicamente. Isso porque as mentiras, em cascata, colocam em xeque resultados de pesquisas e a expertise dos nossos professores e pesquisadores — pessoas sérias, dedicadas ao exercício da atividade científica, com ética, rigor acadêmico e responsabilidade social. No limite mais extremo, tais mentiras podem gerar descrédito generalizado da instituição e dificultar a defesa de investimentos em educação e ciência.

A redução de incentivos às nossas pesquisas impacta negativamente uma sociedade que não se conhece, que não pode responder às suas necessidades coletivas e que não alcançará soluções para seus problemas sociais. Assim, desidrata-se o potencial explicativo e resolutivo que buscamos desenvolver. Além disso, as fake news podem acirrar os debates dentro e fora da universidade, dificultando o diálogo e a busca por soluções.

No ambiente acadêmico, a desinformação pode influenciar negativamente a opinião dos estudantes e até enviesar discussões importantes.

NC: Como as Ciências Humanas podem fornecer instrumentos para uma compreensão mais apurada da realidade?

AM: As Ciências Humanas oferecem um arsenal de teorias e instrumentos para compreender melhor a realidade, por meio de uma abordagem holística e da combinação de múltiplas metodologias. Em vez de buscar explicações universais e reduzidas, aprendemos, com os repertórios das ciências sociais contemporâneas, a olhar para a multiplicidade de modos de existência, para diferentes manifestações culturais, para as fissuras causadas pelas desigualdades sociais e, sobretudo, a enxergar as sociedades em seus próprios termos.

Existe uma possibilidade infinita de exercitar o pensamento crítico a partir das Humanidades. Aqui, pretendemos dar nossa contribuição, desnaturalizando o que pode parecer óbvio, reunindo diferentes pontos de vista para ampliar o alcance da alteridade e combater pulsões etnocêntricas e preconceituosas.

As Ciências Humanas identificam como as desigualdades sociais se manifestam e se reproduzem, analisam as relações de poder, as estruturas socioeconômicas e políticas presentes em nossa vida social e, a partir disso, contextualizam os fenômenos sociais. Analisamos eventos dentro de seu contexto histórico, social, econômico, político e cultural, fornecendo ferramentas para explicar e construir uma compreensão mais profunda da realidade.

Certamente, a partir desse diálogo possibilitado pelo portal Nossa Ciência, construiremos um debate público mais informado, interessado em soluções justas para os desafios que enfrentamos e que nos inquietam coletivamente.

Mônica Costa

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