Sensacionalismo astronômico #HojeÉDiadeCiência

sexta-feira, 26 janeiro 2018
Primeira Superlua do ano já está previsa para o mês de janeiro. (Foto: Getty Images)

O termo “astronômico” é frequentemente utilizado de maneira exagerada. Nas notícias relacionadas à Astronomia, aparece para causar impacto, às vezes criando uma falsa expectativa nas pessoas

O termo “astronômico” é frequentemente utilizado para se referir a coisas muito grandes, até exageradas ou terríveis. Uma “inflação astronômica”, por exemplo, como a que o Brasil viveu final da década de 1980 e o início da de 1990, é muito ruim.

Para a Educação, o chamado “sensacionalismo astronômico” também é medonho. Nesse caso, o termo é levado ao literalismo: são notícias relacionadas à Astronomia criadas para causar impacto. Elas são capazes de chocar a opinião pública, mas não têm qualquer preocupação em ser honestas.

A cor da Lua

Neste início de 2018 já temos uma delas. A que alardeia para um evento celeste triplo de tirar o fôlego: Superlua, Lua azul e Lua de sangue, tudo numa mesma noite.

Os títulos desses eventos já denunciam o problema. Eles provocam curiosidade (e isso é bom), mas também expectativas que não serão correspondidas (e isso é mau). Decepcionar o público é uma péssima maneira de fazer divulgação científica.

“Lua azul” é uma tradução literal do termo Blue moon, que possui várias conotações na língua inglesa, eternizado na canção de  Richard Rodgers e Lorenz Hart, lançada em 1934  (Foto: Google Imagens)

Vamos começar com a “Lua azul”. Uma tradução literal do termo original em inglês (Blue Moon) que simplesmente designa a segunda Lua Cheia que acontece num mês. Geralmente só há uma Lua Cheia em cada mês, já que a lunação (o período entre duas fases iguais e consecutivas) é de 29 dias e meio, aproximadamente.

Mas se uma fase lunar qualquer acontece no começo de um mês de 31 dias, então é bastante provável que ela aconteça de novo no final desse mesmo mês. Quando essa fase é a Lua Cheia, então teremos duas delas naquele mês – e a segunda recebe a denominação Blue Moon.

E daí? O que ela tem de especial? Daí nada. É só isso. Se você quiser, pode chamar a segunda Lua Nova de um mês de Dark Moon, ou a segunda Minguante de Yellow Moon. Fique à vontade.

Janeiro de 2018 tem duas ocorrências de Lua Cheia. A segunda é chamada Blue Moon pelos norte-americanos. E isso nem é tão raro quanto pode parecer. Mesmo assim você pode mergulhar um pouco mais fundo nessa história. É até divertido saber como tudo começou. Deixamos um link para você aprender mais.

Misturando as cores

A cor da “Lua vermelha” está diretamente relacionada à atividade solar durante um eclipe. (Foto: Google Imagens)

O outro evento também fala da cor da Lua. Diz que a noite terá uma “Lua de sangue”. E isso faz qualquer pessoa curiosa pensar em qual o resultado da mistura entre o azul da Blue Moon e o vermelho sangue… Seria uma noite de Lua roxa?!

Não espere por isso. Vai se decepcionar. Lua de Sangue é outro termo cunhado para se referir a outra coisa: um eclipse total da Lua. E isso seria muito legal se esse eclipse fosse visível do Brasil. O que não é o caso… O único eclipse lunar total de 2018 acontece no início da noite de 27 de julho.

Mas – de novo – descobrir a história por trás desse tal “sangue da lua” nos leva a reviver uma aventura espetacular protagonizada por ninguém menos que Cristóvão Colombo na época em que o Brasil estava recém-descoberto. O link está aqui.

Colombo usou os conhecimentos em astronomia para intimidar os nativos das Américas. A cor vermelha vista durante o eclipse de 29 de fevereiro de 1504, deu origem ao termo “Lua de sangue”. (Imagem: Biblioteca Pública de Nova Iorque)

Enganando os olhos

Por fim, esta última noite de janeiro será coroada com uma “superlua”, que somada aos outros eventos deve resultar numa Lua Cheia enorme e roxa. Só que não…

Superlua é um termo profundamente enganador. Uma afronta aos super-heróis, já dizia um astrônomo famoso! Mas as tentativas dos astrônomos em desmistificar esse “fenômeno” não parecem surtir bons resultados. Afinal, todo mundo prefere mesmo alguma coisa que é “super”.

Imagine que você saboreou, junto com bons amigos, uma pizza de 40 cm de diâmetro numa das festas do último fim de ano. Então, este ano, um desses amigos lhe convida para repetir o feito, desta vez com uma super pizza.

Você aceita, é claro! Mas sem saber que essa pizza é apenas um centímetro maior – se tanto! Tudo bem. É uma boa pizza assim mesmo. Mas foi um exagero chama-la de “super”. Você só notaria uma ligeira diferença se tivesse as duas lado a lado.

A ilusão da “Superlua”: o observador em B tem a Lua no alto do céu e está mais perto dela por um raio terrestre em comparação com o observador em A, que vê a Lua no horizonte. Nesta gravura a distância Terra-Lua não está em escala. (Fonte: Costa, J. R. V. A ilusão lunar, disponível em www.zenite.nu)

Bingo! É isso o que se trata a “superlua”. Mas lembre-se que nunca há duas Luas Cheias, uma “super” e outra “normal”, lado a lado no céu (talvez numa simulação num planetário), o que torna a tarefa de reconhecer uma “superlua” ainda mais frustrante. Aqui está outro link para você saber mais.

A bem da verdade, será frustrante a menos que você contemple a Lua nascendo no horizonte! Mesmo que não seja uma noite da tal “superlua”, quando ela surge sobre o horizonte geralmente a vemos surpreendentemente grande. Ali, pairando ainda pertinho do chão, qualquer Lua Cheia é realmente “super”.

Mas tudo não passa de uma ilusão! Uma ilusão poderosa, diga-se. E que certamente vale a pena descobrir um pouco mais.

Porque, no fim das contas, divulgar Ciência consiste justamente em inspirar as pessoas a apreciar a descoberta. A se interessar por conhecimento. A pensar. E a natureza já é suficientemente impressionante para que seja preciso atrair o olhar por meio de falsas expectativas.

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Leia o texto Planeta água, do mesmo autor.

José Roberto de Vasconcelos Costa, de Astronomia no Zênite - www.zenite.nu

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