O professor Gláucio Brandão apresenta esse que é o paradoxo de ser um empreendedor inovador
Durante treze dias de um janeiro de 2019 para lá de escaldante, aproveitamos para visitar, by car, familiares em todo o NE: eu, a navegadora que me acompanha há 22 anos e os três “herdeiros das dívidas”, os quais formam uma progressão aritmética decrescente de razão três: o mais velho com 12, o do meio com 9 e o derradeiro com 6 anos. Fomos daqui para a Bahia e da Bahia para aqui. Paradas em todas as capitais, naturalmente seguindo as praias. Peguei um bronze massa! Mergulhamos em mares com ondas e, por curiosidade, o mote que me inspirou a escrever este texto foi encontrado à beira de uma grande rio, o São Francisco, no restaurante Katty, que fica na cidade de Propriá, próximo à ponte que une Sergipe ao Alagoas. Sem mais delongas, eis nosso “muso” inspirador, a figura mais anti-onda que conheço: Luiz Carlos Molion. Sim, ele, o homem que diz o contrário da maioria esmagadora quando se fala em aquecimento global, maioria esta que engloba até ganhador de Nobel. O que podemos aprender com este Senior Innovation Man?
Feliz reencontro
Conheci o professor Molion quando fazia parte da comissão da Semana de Ciência e Tecnologia da UFRN – CIENTEC de 2012. Naquela época, eu ainda um mancebo com pique para participar de todas as comissões que me ofereciam, observava mais do que falava. Em determinado momento de uma das reuniões da comissão, definiu-se o tema para aquela CIENTEC: Aquecimento Global. Chic e na moda, né não?
Na sequência, deu-se início ao brainstorming sobre os possíveis palestrantes. Como sou sempre “anti-massa” – e por puro esporte – rastreei alguém que pensasse exatamente o contrário do mundo (e da comissão), não por pirraça ou qualquer tipo de radicalismo, mas por seguir os preceitos do filósofo Karl Popper “de que toda Ciência tem de ser questionada e, em algum tempo, derrubada”. Não queremos dogmas no empreendedorismo inovador, não é mesmo?
Feita a sugestão e Internet consultada pelos integrantes da comissão, lendo como o homem era muito citado na grande rede, acataram minha indicação. Achei o email do professor e fiz o convite, sem muitas expectativas e já com um plano “B” em mãos. Para minha surpresa, o “cabra” aceitou. Bom para a UFRN, bom para a CIENTEC. Para alguns nem tanto! Foram pedir minha sugestão…
Resumindo a história, na manhã do dia 23 de outubro de 2012, por volta das 09:15, tem lugar, ou melhor “tem tempo”, a Conferência Oficial de Abertura da XVIII CIENTEC, com a palestra “Energias Renováveis e Mudanças Climáticas” – Professor Luiz Carlos Baldicero Molion.
Imaginem o anti-clima quando o Prof. Molion abriu a palestra falando o contrário do que todos, inclusive os da comissão, esperavam… Fiquei muito feliz!
E, voltando de terras baianas, quando a galera da parte de trás do carro começa a proferir ao motorista palavras de ordem alimentícia, o jeito foi parar e, para minha grande felicidade, no instante certo de encontrar o homem. Diria Carl Sagan: “Diante da vastidão do tempo e da imensidão do universo, é um imenso prazer para mim dividir um planeta e uma época com você”. Eu encurtaria dizendo: coincidência da peste!
Qual a relação entre a postura do Mestre Molion e essa coluna? Tudo! Assim, sobre tomar outra direção, que constitui o ato de inovar de fato, é o que pretendo descrever.
Ondas e mais ondas
Quando comecei a me preocupar em “onde botar quase 200 alunos egressos do curso de Sistemas de Informação no Mercado daqui a três anos”, estava coordenando este curso da área da Ciência da Computação na unidade da FTC – Feira de Santana. Era o ano de 2002 e, simplesmente, não havia Mercado. Assim, juntando professores-parceiros, criamos no ano seguinte a Maratona MEV, Mercado de Empresas Verticais. Este nome derivava da criação de equipes formadas por alunos oriundos de todos os oito semestres do curso, dando um formato vertical aos empreendimentos. A ideia básica era misturar alunos em todos os níveis de conhecimento e graus de oxigenação, e apresentar problemas do Mercado às equipes, ou mesmo gerar inovações. Nesse tempo, acho que não saberia escrever startup ou se quer pronunciar Hackathon, pois desconhecia qualquer coisa fora da área de engenharia elétrica. Sucesso de público e bilheteria, criamos em torno de 50 mini empresas – que recebiam facilmente o nome de startup hoje – as quais cresceram, fundiram-se, morreram e/ou ajudaram outras empresas. Este projeto foi levado à matriz em Salvador e, depois de trabalhado e burilado, ganhou o nome de CENA – Centro de Empresas Nascentes.
Onde eu quero chegar: cérebros sujeitos aos mesmos problemas terminam encontrando soluções parecidas. Os nomes para estas soluções podem ou não coincidir. Você não precisa seguir determinada onda para resolver isso. Assim, quando vejo a galera preocupada em seguir as ondas de Empreendedorismo e Inovação; da Indústria 1.0, 2.0, 3.0, 4.0, 5.0… n; do Marketing 1.0, 2.0, 3.0, 4.0, 5.0… n, “n” variando de um ao infinito e além, sem critério algum, sem perspectiva de aplicação, ou sem preparar ou ter o perfil para tal, me pergunto: em que pé estaria o CENA, ou mesmo a INOVA Metrópole, cujas origens repousam nos projetos MEV(2003) e NATA(2007), respectivamente, se eu estivesse esperando a onda chegar? Ou se, ao chegar, eu a seguisse cegamente? E eu respondo: estaria engordando o cérebro excessivamente o tempo todo e frustrando meu ego pois, devido à atividade exaustiva de obtenção de conhecimento mórbido, não teria tempo para executar. Seria o que eu chamo de Empreendedor Teórico ou um mero Colecionador de Informações! Nada mais antagônico e inócuo do que isto, e é por onde ainda caminham as universidades, como discorro no artigo O que falta aos cursos das Sociais Aplicadas e Engenharias?
Modismos ofuscam a criatividade. Surfar “essa” onda é necessário? Afinal, alguém teve seu pioneirismo reconhecido por “surfar” a mesma onda? Nosso atual campeão mundial de surf, Gabriel Medina, escolhe cada uma das ondas que vai surfar. Observa, estuda, espera e dá um show. Como costumo dizer: o pioneiro não erra, apenas leva a cacetada primeiro! Professor Molion sabe do que tratamos aqui.
Seu contexto sempre será único: Crie seu próprio mundo, sua própria onda!
Sim, Gláucio-san, o que devo fazer então, ignorar tudo que acontece ao meu redor e remar contra, não esperar onda alguma ou então criar minha própria onda sem conseguir convencer um seguidor sequer? E eu diria: filho(a), você pergunta com uma resposta! Isso mesmo, a não ser que queira apenas prestar serviço. Nada contra, mas aí você não terá de usar muita Ciência e poderá resolver a coisa no método que remonta aos nossos antepassados: try and error! E, claro, o payback será menor, pois seu esforço braçal relativo será muito maior, o que não é inteligente em uma era balizada pela informação e pela escalabilidade. Falamos sobre isto no artigo Inteligência tecnológica versus Criatividade aplicada.
E por onde começar então? Elon Musk dá a dica:
Estes itens, para quem tiver interesse em se aprofundar, desenvolvi em Criando inovação através do pensamento por princípios .
Conselho derradeiro
Se continuarmos seguindo só ondas, não conseguiremos inovar de verdade. Só estaremos, no máximo, “tirando onda”! Pare, pense e entenda muito bem as “ondas”! O Professor Molion dá o alerta: será que tudo isso não é só onda?
Viram como ficou cansativo: escrevi onda cinco vezes em quatro linhas… Não teve graça!
Ignorem as ondas, inclusive este texto. Tateie o mundo por suas próprias mãos. A criatividade agradece. Hang loose para vocês!
Referências:
CIENTEC 2012 (http://g1.globo.com/rn/rio-grande-do-norte/noticia/2012/10/ufrn-divulga-programacao-completa-da-cientec-2012.html)
Luiz Carlos Molion (https://pt.wikipedia.org/wiki/Luiz_Carlos_Molion)
FTC – Feira de Santana (http://www.ftc.br/feira-de-santana/home/)
CENA – Centro de Empresas Nascentes (http://www.portaldocena.com.br/cena)
A coluna Empreendedorismo Inovador é atualizada às quartas-feiras. Gostou da coluna? Do assunto? Quer sugerir algum tema? Queremos saber sua opinião. Estamos no Facebook (nossaciencia), Twitter (nossaciencia), Instagram (nossaciencia) e temos email (redacao@nossaciencia.com.br). Use a hashtag #EmpreendedorismoInovador.
Leia a edição anterior: Inteligência tecnológica versus criatividade aplicada
Gláucio Brandão é gerente executivo da inPACTA, incubadora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Gláucio Brandão
É incrível como o prof. Gláucio consegue provocar inovação.
Excelente texto.
Já conhecia os artigos da Nossa Ciência desde que retornei e estou muito feliz de encontrar aqui este convite tão desafiador em especial aos nossos jovens que iniciam Ciências já com este olhar diferenciado. Parabéns!
Saudações mestre Costa Barros!
Sou bem “alimentado” com as ideias dos leitores.
Muito Obrigado.