Thiago Jucá alerta que a comunidade científica brasileira precisa direcionar os rumos da sociedade quanto à descarbonização da economia
Agora em outubro, dois estudos publicados em duas prestigiadas revistas científicas assustaram a comunidade internacional e serviram para ligar mais um sinal de alerta. O primeiro deles, publicado na revista The Lancet, tratou de um amplo estudo de dois anos sobre os efeitos da poluição sobre a saúde. A principal conclusão tirada a partir dos resultados deste estudo (The Lancet Commission on pollution and health) é que a poluição é a maior causa ambiental de doenças e mortes prematuras no mundo de hoje. A mesma é responsável por 16% de todas as mortes no mundo, o que em 2015 representou um número estimado de 9 milhões de óbitos. Já no Brasil, o percentual de óbitos foi de 7,49%, o que representou 101.739 vítimas. Esse estudo também revelou que, em países em desenvolvimento e de baixa renda (Bangladesh, Somália, Chade, Níger e Índia), o número de óbitos por poluição é de 92%.
Já o outro estudo, publicado na revista “Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS)”, revelou que as estimativas quanto ao teor de partículas de fuligem ou “carbono negro” no ar das regiões industrializas dos EUA no começo do século 19 estavam subestimados. Nesse estudo, os cientistas puderam estimar com precisão o teor de fuligem preso nas penas de aves ao utilizar uma técnica que consistia em fotografá-las e registrar a quantidade de luz refletida. Para isso, os pesquisadores analisaram mais de mil exemplares de algumas espécies dessas aves (pica-paus, pardais e alpacas) encontradas em museus de história natural da região conhecida como “cinturão da indústria”.
Um terceiro estudo, dessa vez feita por pesquisadores brasileiros e, publicado na também prestigiada revista Nature Scientific Reports lançou luz sobre os mecanismos moleculares responsáveis pelos danos causados ao pulmão humano decorrentes da exposição ao material particulado liberado na atmosfera. Este por sua vez, teve origem na fumaça das queimadas na Amazônia. Infelizmente, os focos de incêndio são mais comuns durante algumas épocas do ano, não só na Amazônia, como na Caatinga e no Cerrado brasileiro, o que ocasiona sérios problemas respiratórios na população. Vejamos o caso triste e devastador do incêndio que acometeu a Chapada dos Veadeiros.
Os estudos supracitados só corroboram que a queima de combustíveis fósseis – seja de derivados do petróleo ou do carvão – é a principal fonte de poluição e contaminação do ar. Esse fato tem suscitado muita discussão nos últimos anos quanto ao futuro desse tipo de energia não renovável, não somente no tocante à questão do efeito estufa, como também em relação à saúde pública. Junta-se a isso, uma outra questão, que é a disponibilidade/esgotamento dessas fontes energéticas, em especial, o petróleo, e todas as consequências políticas/geopolíticas envolvendo esse “ouro negro”, o que motivou e continua a motivar inúmeros conflitos.
No caso do Brasil, a queima de biomassa torna a questão ainda mais complexa, haja vista o enorme potencial energético dessa fonte renovável para o país. O estudo publicado na Nature Scientific Reports só reforça o problema histórico decorrente das queimadas que, inclusive, na maioria das vezes são criminosas. Uma questão nacional que também tem suscitado muita discussão envolve os aspectos ambientais quanto à exploração de petróleo em águas ultraprofundas na camada geológica conhecida como pré-sal. Na última sexta feira de outubro (27), o debate veio à tona com as duas rodadas de licitações de blocos para exploração de petróleo e gás nessa região realizado pela Agência Nacional de Petróleo (ANP). Por um lado, tem um grupo que questiona a capacidade do país de cumprir as metas de combate ao aquecimento global, estabelecidas no Acordo de Paris. Para estes, as estimativas quanto à emissão de gases do efeito estufa decorrentes da utilização dessa matriz energética são colossais, isso sem considerar a nossa incompetência em reduzir o desmatamento; por outro lado tem aqueles que defendem que as riquezas oriundas da exploração do pré-sal representam o passaporte para investimentos em energias limpas, bem como em saúde e educação. Lembrando que esse debate não envolve as polêmicas relacionadas às questões políticas e de soberania nacional decorrentes da exploração e uso desse recurso.
Ainda em outubro, O Observatório do Clima publicou um texto, no qual compila dez coisas que valem mais do que a ciência brasileira. Uma delas me chamou a atenção e diz o seguinte: se a grana investida para construção da Refinaria Abreu e Lima (Rnest), estimada em mais de 66 bilhões, tivesse sido investida em pesquisa de energias renováveis, talvez antes de a Abreu e Lima ficar pronta o Brasil não precisasse mais refinar petróleo. Já mais recentemente, o mesmo portal publicou matéria na qual compila os dados da nova edição do SEEG (Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa). O sistema revelou que as emissões nacionais de gases de efeito estufa subiram 8,9% em 2016 em comparação com o ano anterior. É o nível mais alto desde 2008 e a maior elevação vista desde 2004. Segundo o Portal, esses dados colocam o País como sétimo maior poluidor do planeta e, pior, a única grande economia do mundo a aumentar a poluição sem gerar riqueza para sua sociedade (é outro 7 x 1!).
Mas sempre há os consolos, mesmo que estes não sejam exclusivamente nossos. Um artigo publicado na Nature Climate Change (vale lembrar que em outubro!) com pesquisadores brasileiros mostra que, a expansão do etanol brasileiro da cana-de-açúcar fornece uma solução escalável de curto prazo para reduzir as emissões de CO2 do setor de transporte global. Em contraste com o etanol de milho, o sistema brasileiro de etanol de cana pode compensar 86% das emissões de CO2 em relação ao uso do petróleo. Vejamos também o caso da China que é um país conhecido, entre outras coisas, por ser o maior poluidor do mundo. Só que, para os Chineses, o jogo começou a virar! O país
assumiu o primeiro lugar mundial na produção de carros elétricos agora em 2017. Os Chineses têm feito uma verdadeira revolução nessa tecnologia, o que tem sido seguido por países como Inglaterra, Alemanha e França. O ministro do Meio Ambiente britânico, por exemplo, Michael Gove, anunciou recentemente que o Reino Unido pretende banir, em 2040, a venda de novos veículos movidos a diesel e gasolina. O objetivo é não tê-los mais nas ruas em 2050.
Há pouco mais de 10 anos, o ex-candidato à Presidência dos EUA Al Gore lançava o documentário uma verdade inconveniente. Neste, alertava o mundo para os perigos do aquecimento global e pedia uma ação imediata. A comunidade científica brasileira, mesmo que golpeada diariamente, precisa direcionar os rumos que a sociedade brasileira precisa tomar quanto à descarbonização da nossa economia, tanto por uma questão de saúde como ambiental. Nenhuma nação é tão rica em recursos naturais como o Brasil, mas temos que cuidar para que a tão propagada “maldição dos recursos naturais” não nos assole!
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Thiago Jucá