Apesar do discurso de igualdade, a estrutura e as relações internas das agências de publicidade continuam fundando-se no machismo
Por Kamilla Santos
Quem acredita que no ramo da publicidade a vida é toda descoladinha, sinônimo de aceitação nos mais amplos aspectos, pode ser considerado tão inocente quanto os consumidores impactados pelos comerciais de margarina.
O nosso machismo estrutural possui, de fato, raízes tão profundas que cegam até mesmo os mais liberais. E quando falo em liberais, incluo também os grupos que mais tem lutado contra o machismo. Afinal, falamos de uma luta ampla, de processos que ainda precisam de algumas gerações de reflexão e não será do dia pra noite que as coisas vão mudar.
No ambiente de uma agência de publicidade, o movimento para “curar” essa ferida cultural caminha a passos lentos. Ainda é possível notar a baixa presença feminina nos ambientes criativos, salários menores e o assédio travestido de brincadeiras descoladas.
O discurso quando confrontado sempre será de igualdade, mas na prática a teoria não se aplica. Em uma das minhas experiências profissionais, trabalhei tendo como chefe alguém que tem o mesmo cargo que eu. Longe de mim exigir igualdade salarial, nesse caso, mas a forma como ele subestimava a qualidade dos meus trabalhos me fazia refletir se de fato eu possuía algum talento.
Trabalhei cerca de um ano e absolutamente tudo que fiz não teve aprovação total, sempre passou por alguma alteração, acréscimo ou corte na ideia inicial, tornando o material mais dele do que meu.
Demorei um pouco a me redescobrir profissionalmente e entender que aquele era uma ambiente tóxico e que limitou a minha evolução, mas consegui superar. Uma das coisas que aprendi depois dessa experiência, em específico, foi a mostrar quem sou eu verdadeiramente antes mesmo de esperar ouvir o que as pessoas querem de mim. Minhas opiniões, o que aceito, o que não aceito, minhas limitações, defeitos, bons e maus hábitos… Começar em um novo ambiente de trabalho e como iniciar um relacionamento e, para isso, as cartas precisam estar na mesa, sem truques.
A partir desse meu novo “modus operandi”, consegui não só me reencontrar profissionalmente, mas descobri que encontrei uma poderosa arma contra todo o machismos e preconceito que existe dentro das agências. As pessoas sabem que algumas piadinhas não passarão, que vai haver troco, que alguns comportamentos não são mais aceitos e que você sabe e vai dizer não a qualquer momento.
Mostrar quem somos de verdade durante todo o nosso dia a dia é a melhor forma de construir o novo normal. Quem tem que se trancar em uma caixinha são os machistas e preconceituosos, esses sim precisam ser confrontados a cada minuto para que entendam que o momento é de desconstrução, o patriarcado está em queda e só existem duas saídas: atura ou surta, bebê.
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Leia a coluna anterior: Gênero e filosofia: a exclusão do pensamento filosófico feminino na academia
“Epistemologias Subalternas e Comunicação – desCom é um grupo de estudos e projeto de pesquisa do Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal do Rio Grande do Norte”.
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