Gláucio Brandão faz um passeio no tempo, conta como nasceu a cultura empreendedora na UFRN e aponta alguns bons frutos já colhidos
Há cerca de 10 anos, depois de um ano de try and error, sobre pau e pedra, foi aprovado o primeiro projeto de incubação oficial da UFRN, o NATA. A ideia era criar um ambiente propício para a geração e apoio de novos empreendimentos, a reboque da Lei 10.973/2004. Essa lei, conhecida como Lei de Inovação, tinha por missão lançar o Brasil, ou pelo menos abastecer a nave, em direção ao que o Porto Digital(Recife) faz há uns 20 anos e a galera da Stanford University faz há cinco décadas no Silicon Valley. Bom, esse recém-nascido, cujo nome refere-se à parte mais alta do leite talhado, forçando um trocadilho, sobreviveu à incubação. Pouco tempo depois, com a necessidade de disciplinar todo o processo já em curso havia quatro anos, conseguimos aprovar a Resolução CONSEPE 054/2011, a resolução que regulamentava a incubação de empresas na UFRN. Era uma manhã de um 31 de maio magnífico, no qual um Conselho Superior composto por uns 40 conselheiros, técnicos administrativos e alguns estudantes emitiam em quase uníssono a ‘calorosa’ frase: “Vamos tirar de pauta!”. Bom, se o começo foi na base de madeira e feldspato, nesse dia senti uma chuva de meteoros, já que era eu o arauto que estava empunhando o papiro em nome do grupo do empreendedorismo acadêmico. Bons tempos aqueles (ainda bem que não voltam)… Mas a razão prevaleceu, esse fato virou história e hoje a UFRN é reconhecida como uma universidade empreendedora. Em 2013, a Resolução CONSEPE 089, que dava uma ‘guaribada’ na anterior, passou com louvores, como se fosse algo do DNA da instituição. Está em vigor até agora. Nessa época o NATA virou INOVA Metrópole. Depois criamos a BIO INOVA, a TECNATUS, a inPACTA e a i9Agrotec. Expliquei então a pedra fundamental da estrutura que defendo. Agora vamos à questão da formação.
Cicatriz
Empolgados com este sucesso, já que toda cicatriz conta uma história e é mais robusta do que a pele anterior, partimos para outros voos. Percebendo que o novo ecossistema que estava por aflorar começava a mostrar um aumento na demanda dos empreendimentos e uma proporcional diminuição na qualidade científico-metodológico no perfil dos respectivos empreendedores, o Grupo de Negócios Tecnológicos (GNT), capitaneado pela professora Zulmara Carvalho (FOTO), conseguiu a aprovação do Mestrado Profissional em Ciência, Tecnologia e Inovação, o “potiguarmente” famoso MPI. Era um novembro de 2014 e, segundo a lenda acadêmica, foi o primeiro mestrado de inovação pura aprovado em Instituição Federal de Ensino Superior (IFES). Começamos a rodá-lo em novembro do ano seguinte, tendo na primeira chamada mais de 150 inscrições. Diferentemente do que se pensa, o mestrado é totalmente aberto à sociedade, não havendo necessidade alguma de vínculo acadêmico com a UFRN, nem perfil definido. Lidamos com a “inter-multi-trans-pré-pro-etc”-disciplinaridade como se fosse requisito obrigatório para entrada no MPI. O único item básico – além de diploma de qualquer instituição de ensino superior reconhecida pelo MEC, claro – é ter perfil empreendedor-inovador. E como garimpamos isto? Outra inovação: o candidato manda pra gente um projeto em quatro páginas, sem formato definido e, se aprovado, defenderá sua proposta em um pitch elevator de 5 minutinhos. Dá pra observar muita coisa daí. O corpo docente tem de jornalista a médico, passando por engenheiros e designers, bioquímico, economista, ambientalista, advogado. O corpo discente, em sua quarta turma, com mais de 100 ‘cabeças’, entre formadas e em formação, é de uma diversidade de difícil descrição. Isso é o que torna o MPI belo e único. As ideias pululam o tempo todo. Essa “densi-diversidade” é a que realmente alimenta a inovação. Pronto, falei da outra parte: a formação .
Junto e misturado
Juntando as coisas. Uma vez que o GNT foi o pioneiro na incubação de empreendimentos e na pós-graduação inovadora na UFRN, e estando coordenando estas duas ações, resolveu-se por dar outro passo inovador: fazer o combo. Ora, percebemos que a Ciência não é um fim, mas um meio. Percebemos que o empreendedorismo inovador tem a Ciência como arcabouço. Observamos que muitas ideias férteis vêm de fora da universidade, faltando apenas um “trato” científico. E, mais ainda, temos a convicção de que tudo isso necessita de método acadêmico. Assim, reformulamos em 2016 o componente de 120 horas do MPI Estágio Gestor, EG, para ser o elo entre o MPI e nossa incubadora, a inPACTA, já que nesse componente o mestrando tem de mostrar sua veia gerenciadora de inovação. Nasce aí o binômio MPI-inPACTA, um mestrado ancorado em uma incubadora, o qual, de acordo com a “segunda lenda”, é o único mestrado no Brasil no qual o passageiro tem por um dos produtos a criação de um processo de startup. Bom, re-inovamos. Se nadamos contra a maré ao iniciarmos a incubação na UFRN, imagine agora, ao querer formar metodologicamente cientistas-empreendedores? É ver pra crer. E os resultados nos abonam.
O Aprendizado
No começo da incubação, muita gente boa confiou no GNT. Ajudamos a erigir a RoboEduc, pioneira no Estado no aprendizado junto com robótica. Demos uma mãozinha à ESIG, maior desenvolvedora de software do RN. Trabalhamos com a Lua4 ajudando em seus projetos automotivos. Crescemos com a SoftUrbano, pioneira na automação de processos advocatícios. A rastreadora de animais silvestres, Nortronic morou em nossas instalações. A Ciência Ilustrada, desenvolvedora de dispositivos móveis de baixo custo e alta acessibilidade capaz de diagnosticar doenças preveníveis andou em nossos corredores, e muitas outras que estão compondo o céu potiguar. Essa galera já andava nas ondas do empreendedorismo inovador antes do MPI, e foram eles que nos ensinaram a transformar tudo isso em Ciência Empreendedora.
As cabeças que passam por aqui
Depois desse aprendizado, uma novo formato de empreendedor está sendo forjado no MPI. Entendemos que podemos “ensinar” um empreendedorismo de alto nível. Nessa linha nascem os mestrando-empreendedores, CEO cientistas, ou como chamamos aqui CInO: Chief Innovation Officer, nossos gestores de inovação, os quais trabalham a ciência aplicada ao empreendedorismo. Já temos 24 CInO formados, cujos projetos abrangem todas as áreas do conhecimento. Algumas CInO premiadas recentemente, como é o caso da CInO Luana Wandecy da BlinDog, única startup contemplada no Norte-Nordeste pelo maior programa de aceleração do país, o InovAtiva, no mês de Agosto. Da CInO Cláudia Larissa Marques, da LifeSprint, vencedora da etapa estadual do Prêmio Sebrae Mulher de Negócios 2017 (foto). De Eugênio Pacelly, da VOID3D, destaque da última Campus Party RN. Do CInO Hebert Costa, da Fix-It, que foi mergulhar com os ‘tubarões’. E, como dizemos por aqui, transformamos tudo em negócios inovadores, até a arte não escapou, é o que nos mostra o CInO Mathieu Duvignaud em seu projeto AD Infinitum – Emoções criativas, no qual tentamos trocar emoções entre artista e público através da manipulação de luzes. Para não dizer que não inovamos no setor público, o CInO Moisés Souto desenvolve a Plataforma Samanaú, a qual torna-se o primeiro contrato de transferência de tecnologia em 107 anos de IFRN. Só boas histórias pois, olhando para trás, penso que está dando certo.
Então é isso pessoal: existem Mestrados, existem Incubadoras e existe um Mestrado ancorado em uma Incubadora. Para quem quiser ser um CInO e contribuir de forma inovadora para o RN, o próximo certame de entrada em nosso MPI acontecerá em novembro próximo. Aqueçam seus motores e venham ser únicos.
A coluna Empreendedorismo Inovador é atualizada às quartas-feiras. Gostou da coluna? Do assunto? Quer sugerir algum tema? Queremos saber sua opinião. Estamos no Facebook (nossaciencia), Twitter (nossaciencia), Instagram (nossaciencia) e temos email (redacao@nossaciencia.com.br). Use a hashtag #EmpreendedorismoInovador.
Leia a edição anterior: Promovendo a extensão inovadora
Gláucio Brandão é gerente executivo da inPACTA, incubadora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Gláucio Brandão
Deixe um comentário