Para o colunista, o processo de incubação convencional muda ou continuará frustrando os candidatos interessados ao sistema, caindo no descrédito e causando prejuízo
Já que estamos em tempos de estrangeirismo: startup, stakeholders, shallow, crossfit, hub, advisor, mindset, venture capital, elevator pitch, burn rate, workflow, break even, low carb, unicorn, digital detox, pivot, meetup, brainstorming, hard and soft skill etc. etc. etc, vou criar meu próprio termo pra ver se cola e, sendo assim, entrar para o panteão daqueles que ficaram para a história da administração ou do empreendedorismo por causa de uma palavra. Melhor: vou criar uma expressão e ficar mais famoso ainda. Que tal Market inside Market™? (acho que inventei esta expressão?).
Stand up comedy à parte, escrevi em inglês pra chamar a atenção, não para a expressão em si, mas para o modismo que toma conta das pessoas quando alguém, ou algo, alcança um sucesso inesperado e faz com que uma horda de incautos sigam a glória sem perscrutar o que está por baixo disso. “E não é só isso”, como ouviríamos em comercial da Polishop: acham ser este o único caminho!
Como há 17 anos tenho dedicado minha carreira ao empreendedorismo universitário e, entre outras coisas, ajudado a criar as cinco incubadoras da UFRN, vejo entristecido o declínio das incubadoras públicas como geradoras de valor de fato para o nosso ecossistema. Antes, talvez por uma demanda reprimida, orientavam com sucesso os empreendedores que lá adentravam. O aquecimento mundial dos Mercados de novas empresas (não o nosso) devido aos empreendimentos de alto impacto (tecnológicos, sociais, ecológicos, edutech, govtech, fintech etc.), acesso fácil a tecnologias, fez crescer número de universidades que abriram os olhos e apostaram no Mercado como fonte primária de inovação e, assim fazendo, se associaram a ele. A consequência desse “boom” empreendedor fez com que se multiplicassem as fontes de conhecimento, o acesso ao mercado de startups, investidores etc., provocando na incubadora pública – a qual ainda mantém, incrivelmente, seu formato de administração convencional – uma diminuição de sua importância como ente forjador do empreendedorismo, ao ponto de ter sua utilidade questionada.
Assim, depois de apontar a não compreensão da academia em Inovação: conceito que a Universidade não compreendeu ainda e mostrar que nossas incubadoras não estão bem na fita por ignorarem indicadores que interessam de fato ao mercado das startups em Incubadoras universitárias: indo na contramão, já que desconheço incubadora de universidade pública superavitária, venho dar uma trégua, pois considero inconsequente, leviano e hipócrita o comportamento de oposições que batem e não oferecem minimamente uma opção de caminho. Não é meu estilo!
Assim, apontarei neste artigo alguns pontos que rondam o ente em questão. São apenas conselhos que eu, como gerente executivo da inPACTA e professor universitário, tenho produzido e tomado na apresentação de pílula vermelha, sem moderação, e repassando aqui “0800”, mesmo que a vibe empreendedora grite que “se conselho fosse bom era vendido” (rsrsrs). Posso passar minha conta bancária também!
Comecemos então com uma análise bem FOFA: uma Fraqueza, uma Oportunidade, uma Força e uma Ameaça que ronda o berçário, para não virar um diagnóstico da Consultoria PwC, uma das maiores do mundo. Depois darei um encaminhamento e revelarei o que estamos tramando.
Ponto Fraco. A formação incompleta do staff das Incubadoras Acadêmicas
A Universidade, como fiel guardadora das metodologias científicas, tem de servir à sociedade utilizando este ferramental. O Mercado também faz parte da sociedade. Então, a forma mais eficiente de compreender esse cliente, que absorverá a maioria de nossos egressos, é bem simples: ouvi-lo! E a melhor maneira de fazer isso, em minha visão, é ter um componente especializado no assunto compondo a equipe que gerencia a incubadora! Pergunto-vos: quantos incubadoras possuem em seus quadros empresários antenados que opinem em suas estratégias, táticas, diretrizes, planos? A resposta: temos apenas acadêmicos! O que nós (aqui me incluo) entendemos profundamente de Mercado, já que temos dedicação exclusiva?
Ponto Forte. O conhecimento científico do staff das Incubadoras Acadêmicas
Por outro lado – toda coluna Empreendedorismo Inovador da Nossa Ciência é uma prova disto – já mostrei aqui diversas vezes que as startups são eventos científicos. Ora pela analogia científica estrita: observação, hipóteses, experimentação e generalização, ora por seu dual empreendedor: observação (idem), teste de conceitos (hipóteses), validação e verificação (experimentação) e escala (generalização). Ou seja: levando a máxima do movimento lean startup à risca “errar rápido para ter sucesso cedo”, nós, acadêmicos e servidores públicos temos esta vantagem, a de sermos peritos em procedimentos experimentais e podermos errar sem ter à sombra de um aviso prévio à porta. Ou seja: temos esta força, uma excelente vantagem competitiva. Não sei porque não a usamos?
Ameaça. A extinção.
Mais de 90% do ensino superior está com o entes privados. As incubadoras/aceleradoras privadas (Ace, Artemisia, CUBO-Itaú, CESAR-LAbs, para citar algumas) respondem rápido ao Mercado e, pasmem: estudantes egressos das universidades são os responsáveis pela geração da maioria das startups aqui no Brasil. Ao juntar-se a maior eficiência das universidades privadas (falo aqui na velocidade de posicionamento dos egressos no Mercado; não faço juízo de valor sobre qualidade ou outros requisitos) e o pull up requerido pelas aceleradoras, em breve teremos a maioria (se é que já não são?) de startups brasileiras formadas por egressos das escolas privadas. Se nosso plantel incubador não adquirir “rapidinho” esse know-how ágil das irmãs privadas, só vai dar Darwin: Extinção! Hasta la vista, baby!
Oportunidade. O Empreendedorismo que dura é aquele baseado em conhecimento
Stanford, Harvard, MIT, só para ficar nessas três, geram a base científica do Silicon Valley, que, se fosse arrancado do EUA e virasse um país, seria a quinta maior economia do mundo, ultrapassando, inclusive, o Brasil. Citando um exemplo nordestino, a UFPE gerou o CESAR, responsável pela gênese do Porto Digital.
Ou seja: a universidade tem de contribuir DIRETAMENTE para aquela seção do Lean Canvas, a “vantagem matadora”, da qual só ela detém a batuta! A maior empresa do Mundo de 2030, segundo 10 entre 10 futurólogos sérios, será uma empresa que tem por proposta de valor a capacitação. Ou seja: o Mercado exige conhecimento metodológico aprimorado para ser competitivo. Somos especialistas nisso. Essa é a grande oportunidade da incubadora: atuar com EGGubator, unidade geradora de “ovos”, “sementes” de empreendedorismo inovador, atuando como um ente especializado em transformar teoria em prática. A parte hard da teoria deve ficar com a Academia. A Validação do negócio – aqui entendido como solução para a sociedade em qualquer área, seja tecnológica, social, ambiental, cultural etc. – fica para o Mercado.
O Mercado tem de ser feito no Mercado: Market inside Market™
Ok, GBB-San: Pintaste o Black Mirror! Qual é o conselho então?
Há muito venho aprendendo com a labuta. E o que venho percebido é óbvio: não adianta ensinar o mancebo, ou a donzela, a nadar na piscina e depois lançar o desavisado ao mar. Outra coisa que pode-se afirmar sobre uma incubadora pública é que as taxas cobradas para a incubação não cobrem nem a energia elétrica dos respectivos prédios. Ou seja: como cobrar por VPL, break even, payback e coisas do gênero se o próprio berçário não se mostra sustentável? O dever de casa, não teria que ser respondido corretamente antes de ser ensinado?
Observando isso, estamos pivotando o formato de incubação da inPACTA para um modelo a la Effectuation, pois o Canvas deu errado .
Nesse novo modelo, não trabalharemos mais com incubação convencional, mas com detecção de negócios e composição de equipes, utilizando ao máximo as tecnologias disponíveis, as redes de comunicação e a Universidade. Administraremos todos os projetos a distância com validação in loco, prevendo a redução do custo para a universidade a um centésimo do atual. Pensamos que as chances de sucesso são maiores, pois o empreendedor terá de desenvolver seu negócio no próprio Mercado. Projetos nascidos “na rua” só sobreviverão se forem “batizados pela rua”. Não haverá ilusão subsidiada por estruturas burocráticas. Simples assim. A esta metodologia que estamos desenvolvendo (ainda é segredo, e já escrevi demais…) e que em breve será validada, damos o nome de Market inside Market™. Vai ser divertido testar isso!
Fechando…
Respondendo à questão colocada como ameaça se “As incubadoras são necessárias?”, diria que a resposta é condicional. Não, se mantiverem esse formato de administração convencional. Sim, se adequarem sua forma de operação à realidade do mar do Mercado, e não à piscina de suas ilusões! Menos Idalberto Chiavenato e mais Eric Ries, se é que me entendem!
De um modo amplo e contundente, posso dizer que ou o processo de incubação convencional muda ou continuará frustrando os candidatos interessados ao sistema e, na sequência, caindo no descrédito, causando prejuízo a ambos os lados. A manter esse andor, o ato final desse ente autárquico será, obviamente, a morte! E não está longe.
Já que nós, incubadoras, estamos em baixa, aproveitemos o momento para a auto-inovação, uma vez que pregamos tanto isso.
O site ainda está meio capenga, pois foi feito por mim na pressa de registrar o domínio. Assim, quem tiver curiosidade sobre o que estamos aprontando, é só dar uma olhadinha na IncaaS.
Referências
Alunos são responsáveis por 55% das startups de parque tecnológico
Califórnia “rouba” lugar ao Reino Unido e reconquista o título de quinta maior economia do mundo
A coluna Empreendedorismo Inovador é atualizada às quartas-feiras. Gostou da coluna? Do assunto? Quer sugerir algum tema? Queremos saber sua opinião. Estamos no Facebook (nossaciencia), Twitter (nossaciencia), Instagram (nossaciencia) e temos email (redacao@nossaciencia.com.br). Use a hashtag #EmpreendedorismoInovador.
Leia a edição anterior: A validação da ciência empreendedora inovadora
Gláucio Brandão é gerente executivo da inPACTA, incubadora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
As incubadoras públicas são exploradas para obter poder político, afinal, quem não quer ser parecido com o Vale do Silício?
O MARKET não compreende e NÃO VAI compreender ou se adaptar às regras do mundo imaginário que regem o funcionamento das instituições públicas – burocracias e politicagem. A reação natural é de se afastar dessas incubadoras.
Infelizmente, NÃO importa o quanto seja dito que o “Market inside Market” pode ser mais adequado. O que importa mesmo é a IMAGEM que a Universidade possui. É o mundo da ILUSÃO, mais vale PARECER bom do que realmente ser bom. Para completar, essa visão MEDÍOCRE é compartilhada com várias instituições de fomento ao empreendedorismo.
O CUBO-Itaú já atraiu mais de R$ 200 milhões de reais em investimentos PARA AS EMPRESAS sem burocracias estúpidas. Já o BURROCRATA EGOCÊNTRICO tem orgulho da sua “incubadora pública” porque ele foi capaz de fazer uma licitação e comprar cadeiras e mesas novas.
Quer que eu DESENHE?
Saudações Marcos!
Sua visão fria, dura e real está um tom mais alto do que a minha, que tem de ser didática, mas está estritamente precisa. A edição puxaria minha orelha se escrevesse assim. (rsrsrs).
Parabenizo-o por dar número a minhas colocações ‘quase poéticas’!
Vamos (eu, você e uma galera oxigenada que tá chegando) mostrar um novo paradigma e ver se realmente o exemplo arrasta!
Grande abraço.