É preciso “focar para conquistar”, só assim venceremos essa crise
Passaremos por esta crise e por muitas outras ainda, pois é uma lei natural. Os vírus são seres minúsculos (entre 20 e 300 nm), compostos por RNA ou DNA, códigos de programação celular, o que dão a eles uma capacidade de mutação infinita. Mudam porque querem viver, ou melhor, existir, já que não são considerados seres vivos (imaginem se fossem?), e precisam de hospedeiros… nós. Algumas linhas científicas defendem que, por serem codificantes, estão na base da evolução dos seres vivos, como também de sua deterioração. E, ironicamente, evolução será o melhor produto que resultará do fim desta crise. As pessoas, empresas, instituições etc., incorporarão a seus brands as letras a.C e d.C, não em referência à convencional datação, mas à nova: antes ou depois do COVID-19.
O que mais me intriga nisso tudo, e que sempre relato em artigos por aqui, é nossa falta de evolução nos quesitos coordenação e tomada de decisão perante estes tipos de evento, o que exigiria a criação de uma inteligência única .
Sempre seguimos na linha do “apagar fogo”, mesmo depois de inúmeras experiências traumatizantes (não vou citar aqui todas as pandemias virais que já nos acometeram, pois já estamos fartos). Não há algo capaz de nos orientar “protocolarmente” quando a desastre ocorre em grandes proporções. Sempre me perguntam: “Por quê você bate tanto nesta tecla, GBB-San, de criar uma inteligência única?”. E a resposta é simples, mas de difícil execução: “Porque, para se enfrentar uma ‘coisa’ grande, precisamos criar um corpo grande, único!”. Óbvio, né não? Então, por quê não acontece? E a resposta é mais espetacular ainda, a qual percebi da observação nesses dias dos grupos sociais em que estou imerso, onde o “cacete” tá rolando solto: por causa de nossos vieses!
Sim, enquanto formos guiados por eles nunca seremos um corpo único e grande. Resultado: a cura, ou mitigação do impacto cuja proposta possa já estar bem diante de nossos olhos, virá como aquela antiga passagem. Vou colocar em minhas palavras: o exército azul com 100 mil e um homens luta contra o exército amarelo, com 100 mil homens. Vitória relativa na lente medieval: o exército azul ganhou por um homem. Nossa avaliação: 200 mil homens morreram. Não houve vitória. Ou melhor, aconteceu a vitória de Pirro.
No nosso caso, temos o grupo da economia versus o grupo anti-contágio. Não é necessário discriminar os perfis, pois não vem ao caso. Falo um pouco disto em Vírus versus quebra da Economia: qual morte escolher?. O que importa é que ao permanecermos nessa batalha Pírrica, o saldo será relatado pelo único sobrevivente que, a plenos pulmões acometidos por fibrose – é claro -, bradará: “Venci!”. E, em ato contínuo e orgulhoso, dirá: “Tá vendo, eu avisei!”. Trabalhemos então para evitar essa derrota Pírrica.
Nossos vieses “atrapalhantes” e a dificuldade em criar uma inteligência única
Para explicar o que quero dizer com vieses atrapalhantes, bolei a figura das bolinhas. Com certeza, alguém das áreas sociais deve ter modelos e teorias melhores, mas este é o que me ocorreu enquanto estou em lockdown horizontal. Quero deixar bem claro, pessoal, que inventei toda esta “teoria” para que possamos – ou eu possa – entender o que não está acontecendo de produtivo nas discussões sobre o tema. O laboratório utilizado foi o das discussões em grupos de Whatsapp temáticos: empreendedores/empresários, acadêmicos, familiar, oficiais do exército e diversos. Em homenagem a estes ambientes sociais, vou chamar o que possa sair daqui de Teoria W. Bastante óbvio, né não, já que nasceu no Whats.
Admitamos então que a bola central sejamos nós, guiados por nossos princípios e normas, regidos pelas interferências dos outros entes: Natureza, Divindade e Ídolo. Natureza não tá nem aí pra você. Ela acontece (vamos falar mais dela). Divindade e Ídolo, ambos em minha visão criações nossas, são entes barganháveis: você molda-se a eles de acordo com a cultura. No ente Divindade colocamos tudo que é sobrenatural. Em Ídolo, tudo o que é sobrehumano. Exemplos: Divindade: Alá, Deus, Odin, Ogum, Thanos e outros. Ídolo: Ator/Atriz, Batman, Buda, Cientista, ganhador do BBB, Guru, Político, Mídia, aquele dono de grande empresa de software etc., qualquer um ao qual atribuímos poder. São nossos mitos. São, no máximo, “acertadores relativos”. Nostradamus bate qualquer um deles.
O que liga o ente Humano aos outros entes são exatamente nossos vieses. Respectivamente, Ciência nos liga à Natureza, Doutrina ao Ídolo e Religião à Divindade. E aí a coisa pega: no “balaio de gatos” das emoções, estamos dando o mesmo peso a todos os vieses, quando, para este nosso momento específico carente de resoluções, o viés preponderante deveria ser o da Ciência, desde as sociais às duras. Os outros vieses, se não bem administrados, apenas nos atrapalham. O que quero dizer: absorver discussões infinitas em grupos sociais sobre o que “Divindade mandou pra Humano” ou que “Ídolo de tal partido ou emissora está recomendando ou fazendo”, faz com que Natureza bote para lascar na gente. Temos, dentro dos grupos de discussão, que criar uma unidade para que consigamos nos comunicar através do caminho “azul” da figura. Depois de vencida a batalha, voltamos aos outros caminhos, pois, como eu disse, Natureza não tá nem aí para Humano. Ela está inexoravelmente acontecendo.
Isto tudo acima para concluir o seguinte: se nós não conseguimos convergir em grupos de “zap”, Facebook, Instagram, Twitter etc., imagine a convergência nas esferas da gestão pública, onde os vieses, além das influências já citadas, disputam popularidade e poder para se manterem no próximo sufrágio? Senhores do Planalto, dos Estados, dos Municípios, das emissoras “esféricas” de TV, parem de promover o desserviço. O mundo está precisando de vocês, de consenso. Corremos o risco de uma derrota Pírrica. Vocês estão muito mal na fita. Portanto, larguem esse modus operandi maniqueísta. A Terra é uma só, não dá pra dividir.
Vários caminhos, muitos ainda em paralelo
Caminhos já existem. Sartups produzindo máscaras, como é o caso da Void3D, nosso SENAI “azeitando” sua estrutura para produção em larga escala de respiradores, várias ações disparadas pela UFRN, universidades Brasil afora e fundações, como é o caso da Fiocruz, e mundo afora, como o respirador desenvolvido em 100 horas e já aprovado para uso no Reino Unido. O mundo parece estar começando a focar.
Para o setor produtivo, a Firjan criou um programa dedicado a trabalhadores e empresários para o enfrentamento da crise, além de compilar editais de fomento imediato em um único site.
Na linha de entregar informações úteis, a UERN tem uma excelente proposta que, se abraçada pelas 142 emissoras de rádio do RN, ajudará em muito a população nessa luta.
Não podemos controlar aquilo que não se pode medir. Assim, para a combate preventivo e imediato, pois temos de saber o tamanho do “monstro”, a empresa curitibana Hi Technologies criou um teste rápido, já validado pela ANVISA, que promete fornecer o mapa do COVID-19, teste que pode ser adquirido no site hilab.com.br.
Do ponto de vista da prevenção ou de redução dos efeitos produzidos pelo vírus, a Internet está cheia de informações sobre o uso das vitaminas C e D , uma vez que a maioria dos pacientes avaliados apresentavam baixos índices dessas vitaminas, e macetes sobre assepsia.
E, por fim, a terapia. O conceituado médico francês Didier Raoult, com base em terapias administradas por ele e sua equipe, conseguiu bons resultados com o uso da hidroxicloroquina e do tocilizumabe associada a azitromicina. Embora constitua uma terapia polêmica, uma coisa chama a atenção no discurso do infectologista: “Quando não há tratamento eficaz, aplica-se o que apresenta melhores resultados!”. Por enquanto, creio que o Dr. Didier está no melhor caminho.
Temos que eliminar os esforços redundantes de modo a abrir espaços para outras soluções.
Natureza acontecendo
idealmente, quem não seria a favor de isolar todos os potencialmente vulneráveis mantendo, ao mesmo tempo, a economia girando? Tomando o nosso RN, com PIB de 0,82% do “PIBÃO” – o que dá o tamanho de nossa pobreza -, creio ser ínfimo o número de lares que não tenha um trabalhador ou estudante ativo morando com idoso ou pessoa com comorbidades.
Portanto, já não me preocupa mais se a questão será resolvida via lockdown horizontal (aquele em que todo mundo tem de ficar em casa, exceto deliveries, seguranças, pessoal da saúde, policiais, bombeiros, padeiros, agricultores, pecuaristas, funcionários das empresas de água, limpeza urbana, luz e das telecomunicações; caminhoneiros, cozinheiros, cuidadores, moçada do supermercado, farmácia, frentistas etc., e pessoas em risco, os quais todos, ao final do turno, vão ter de estar juntos nas mesmas casas), ou se será tocado por lockdown vertical, no qual pessoas em risco estarão isoladas do mundo, sem acesso, inclusive, aquele povo todo que falei acima. Impossível, já que para um vírus não existe bolha intransponível.
E por quê desta minha despreocupação? O ente Natureza já deu seu jeito: já apertou o botão necessidade. E o engraçado: este botão está perto do COVID-19. É uma questão de tempo até que a violência transborde e comece a matar pessoas dos grupos epidemiologicamente vulneráveis e as de fora deste. Já temos relatos de desabastecimento, de saques a supermercados, assim como toque de recolher dado por facções criminosas. Até o abastecimento de drogas está reduzido. Se já são um dos principais vetores da violência aqui no RN, imagina o que pode acontecer pela falta dela aos e pelos dependentes químicos, e as consequentes medidas tomadas pelos “fornecedores”? Assim, independentemente do tipo de lockdown a ser defendido, é melhor agirmos rápido para não perdermos o controle de todo processo, ou o caos será seu comandante!
O reset inicial é primordial para tomarmos pé da situação (aprender com os casos e definir o que e como fazer, já que o porque está bem claro) mas, daqui para frente, tem de ser administrado sob os fatores de tempo e frequência, o que envolverá muito risco, fator chave no processo de inovação, para o qual temos de aplicar o ciclo enxuto imediatamente: Construir, Medir e Aprender. Temos de colocar o Brasil em ritmo de startup.
Problema: COVID-19. Nossa meta: a imunização.
Construir envolve tecnologias e ações sociais de massa. Citei algumas anteriormente. Medir tem a ver com saber a verdade: paciente “zero”, densidade populacional, número de contaminados e mortos; número de imunes, de recuperados, fatores relacionados à etnia, tipo sanguíneo, gênero; velocidade e condições de transmissão atmosférica e sanitária. Aprender virá da coleta das duas ações anteriores. Esta última ação do ciclo é a que nos deixa realmente preocupados, pois nosso ritmo está lento. Cada pessoa que morre é uma sinalização de que o ciclo enxuto tem de ser acelerado em direção ao nosso objetivo principal, do ponto de vista da inovação COVID-19: promover a imunização da população. Nosso desafio resume-se em gerenciar a cura pela vacina e/ou pela imunização de rebanho. Ambos terão de acontecer ou correremos o risco da reincidência. A vacina não acontecerá rápido, podendo levar até 10 anos.
Corpo único
Na linha da inteligência única, criamos o corpo único chamado RN Contra o Corona, lançado nesta terça-feira 31/03/2020, cujos pilares são: 1) teleorientação e 2) conexão de voluntários para solução de problemas.
Liderado pela empresa Interjato Soluções, o RN Contra o Corona é formado por pessoas da sociedade que perceberam a vontade de todos em ajudar. Nosso intuito é eliminar as redundâncias para potencializar as ações, aumentando o poder de articulação e de resolutividade.
O site está em constante aprimoramento. Para colher informações, ajudar a desenvolver ações e aprimorar o próprio site, pedimos que o acessem e nos ajudem a ajudar vocês a reduzir os efeitos dessa pandemia.
Finalizando
A permanecermos nesta linha de “dividir para conquistar” própria dos vieses, ao invés de “focar para conquistar”, os vencedores serão os que mais vão lamentar terem sido. COVID-19, junto com Necessidades, estão no ente Natureza nos chamando. Podemos sublimar desejos, mas não necessidades. Ao utilizarmos propostas radicais, deveremos estar preparados para as possíveis novas regras e graus de civilidade pós-COVID, pois elas é que vão determinar nossos também “novos” comportamentos. Vão determinar, por exemplo, se saíremos do isolamento como trabalhadores, coletores ou pior, caçadores.
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Leia a edição anterior: Vírus versus quebra da Economia: qual morte escolher?
Gláucio Brandão é gerente executivo da inPACTA, incubadora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
Gláucio Brandão
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