Lavanderias coletivas e agroecológicas Colunas

sexta-feira, 25 outubro 2024
Apesar do destaque das mulheres na agricultura familiar, a sobrecarga de trabalhos domésticos e cuidados com a família faz com que as mulheres tenham uma dupla jornada (Foto: Cedida)

Mulheres camponesas construindo tecnologias sociais, inovação e práticas sustentáveis.

Há um conhecimento imenso pelas mãos das mulheres camponesas em relação à produção agrícola familiar que, em interação direta com a diversidade dos recursos naturais nos diferentes lugares do mundo – diferentemente da agricultura industrial, que opera com fatores, em sua maioria, já conhecidos e controlados –, entram em contato com novas variedades, outras condições ambientais e técnicas e realizam os primeiros processos de melhoramento de organismos que, mais adiante, podem se revelar decisivos para o advento de novas tecnologias, em favor de uma produtividade agrícola sustentável.

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No meio rural, as mulheres têm um papel fundamental nas atividades agrícolas familiares, sendo necessário ações governamentais que fortaleçam e garantam a participação das mulheres nas atividades produtivas do campo, promovendo a troca de saberes científicos e tradicionais e, principalmente, a construção de práticas sustentáveis, com tecnologia e inovação, que estejam alinhadas ao cumprimento das metas dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da ONU, especialmente àqueles relacionados com as dimensões socioambientais, quais sejam: ODS 1 – erradicação da pobreza, ODS 2 – fome zero e agricultura sustentável, ODS 5 – equidade de gênero, ODS 6 – segurança hídrica e saneamento e, ODS 10 – redução das desigualdades.

Porém, apesar do destaque das mulheres na agricultura familiar, a sobrecarga de trabalhos domésticos e cuidados com a família faz com que as mulheres tenham uma “dupla jornada” não remunerada e as impede de se desenvolverem pessoalmente. No Brasil, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), as mulheres trabalham cerca de 7,5 horas a mais do que os homens na semana devido a sua dupla jornada, entre emprego e/ou atividade agrícola e, atividades em sua casa.

Jornada de trabalho

Deste modo, considerando a jornada de trabalho das mulheres, torna-se  fundamental políticas governamentais para o “cuidar de quem cuida”, dando a autonomia às mulheres camponesas de assentamentos e comunidades quilombolas. Estas políticas devem estar sempre associadas à atividades domésticas coletivas e práticas de convivência com o semiárido relacionadas com a segurança hídrica, a fonte de energia elétrica renovável, a produção agroecológica familiar e a comercialização solidária.

No início de 2023, a Secretaria das Mulheres e o Ministério de Desenvolvimento Agrário lançou, em parceria com a Universidade Federal do Semi-Árido, um projeto para a construção de 10 unidades pedagógicas de Lavanderias coletivas e agroecológica com o objetivo de desenvolver tecnologias e inovação socioambientais para reduzir o tempo de trabalho doméstico das mulheres – lavar e passar roupas com o funcionamento das lavanderias coletiva e agroecológica em assentamentos e comunidades quilombolas.

O projeto constitui-se do conjunto de unidades pedagógicas, as quais são: 1) construção de lavanderia para uso coletivo das mulheres; 2) instalação de um sistema solar fotovoltaico de alta qualidade e eficiência para o funcionamento energético das lavanderias coletivas – máquina de lavar, iluminação e ferro elétrico, garantindo a redução dos custos com energia elétrica; 3) desenvolvimento de um sistema de tratamento do efluente de esgoto produzido diariamente nas lavanderias coletivas agroecológicas visando à saúde e o bem-estar das usuárias com o saneamento básico e; finalmente, 4) utilização do efluente tratado oriundo das lavanderias coletivas e agroecológicas como suporte hídrico para a irrigação de fruteiras, hortaliças, mudas de espécies da caatinga e medicinais, tendo em vista a geração de renda com a produção agrícola.

O projeto também prever uma proposta de residência profissional agrária para estudantes, recém-egressos e técnicos de ATER para atuar nas ações do projeto visando à formação profissional em inovação científica e tecnológica a partir de princípios de sustentabilidade agrícola do bioma Caatinga, envolvendo todos os princípios norteadores do projeto lavanderias coletivas e agroecológicas.

Desse modo, a implementação e validação de unidades didáticas de lavanderias coletivas e agroecológicas, em diferentes realidades, permite viabilizar as condições para as mulheres rurais se constituírem como agentes ativos do processo ensino aprendizagem e, ao mesmo tempo, contribuir na consolidação de novas tecnologias sociais no semiárido nordestino.

Nesse contexto, essa proposta corrobora com a missão de ATER dentro da Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural que foca em “Participar na promoção e animação de processos capazes de contribuir para a construção e execução de estratégias de desenvolvimento rural sustentável, centrado na expansão e fortalecimento da agricultura familiar e das suas organizações, por meio de metodologias educativas e participativas, integradas às dinâmicas locais, buscando viabilizar as condições para o exercício da cidadania e a melhoria da qualidade de vida da sociedade”.

Leia o texto anterior da coluna: Agricultura familiar contribui para a segurança alimentar e o desenvolvimento sustentável

Nildo da Silva Dias é professor titular da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (Ufersa).

Francisco Cleiton da Silva Paiva é advogado, servidor público e doutorando pelo Programa de Doutorado em Desenvolvimento e Meio Ambiente (Prodemaa/Ufersa).

Nildo da Silva Dias e Francisco Cleiton da Silva Paiva

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