Estudar como ato de rebeldia Ciência Nordestina

terça-feira, 24 dezembro 2024
Às vezes, a vida severina turva a sombra do que se pode conquistar (Foto: Agência Brasil)

Inspire-se com a história de um jovem pobre que superou dificuldades e transformou sua vida por meio dos estudos

Esta história segue dedicada a todos os jovens pobres (em dinheiro, mas nunca em sonhos) e que sabem que apenas os estudos podem mudar o rumo de sua vida. Às vezes, a vida severina turva a sombra do que se pode conquistar, ao tratar de meritocracia quando na verdade tudo o que se faz necessário é apenas uma oportunidade. Boa leitura!

Para continuar entregando conteúdo de qualidade, Nossa Ciência precisa do apoio de seus leitores. Faça um pix para contato@nossaciencia.com

Era uma vez um jovem que só sabia estudar. Perdeu o pai cedo e precisou contar com a ajuda dos tios para poder continuar sonhando. A Universidade parecia um lugar distante e arrogante, acessado só pelos mais ricos, que iam de motorista ou dirigindo o próprio carro. Ele não tinha dinheiro para passagem e muito menos para o almoço. Sua mãe acordava ainda pela madrugada para preparar sua marmita, que chegava sempre fria, e ele engolia rápido para não perder tempo. Eram quatro ônibus por dia, lotados, e ele seguia alegre e contente por ter conseguido pagar a sua passagem. No bolso, seguia sempre com uma nota de 1 real (isso era tudo o que ele tinha para não gastar). Vida difícil, suada, sofrida.

E ele não contava isso para ninguém. Nos ônibus lotados, ele aprendeu a estudar de pé e quando estava cansado imaginava como seria seu laboratório, quais países visitaria, como seriam os aplausos da plateia para suas palestras. Seu prazer era fechar as disciplinas com média 10,0… Coisa complicada em um curso de engenharia, com disciplinas densas, intensas e com alguns professores ainda mais difíceis de interagir. Evidente que ele falharia na maioria das vezes, mas esta era uma meta que se assemelhava pela busca à perfeição. Com isso, inconscientemente, ele afastava a pecha de coitadinho, pobrezinho… Dormindo quatro horas por noite, ele vibrava a cada passo dentro do curso. Essa era a saída do túnel infinito que o levava à libertação.

Evidente que as comparações aconteciam  e eram em sua maioria desanimadoras. Porque a vida precisa ser tão dura com os pobres? Porque as oportunidades se abrem aos ricos enquanto tudo o que resta aos outros é quebrar pedras? No entanto nada poderia desanimar aquele menino que prometeu ao pai ser engenheiro. A luz no fim do túnel era o que ele buscava, apesar de tudo e de todas as dificuldades. O sistema e a sociedade desejam que não existam delocamentos dentro do arranjo social. É esperado que o filho do pedreiro seja pedreiro e que o filho do eletricista brinque com alicates desencapando fios. A ascenção social é um desafio para os afortunados. Eles sabem que é difícil entrar numa disputa contra um pobre. Quem já encarou a vida severina de frente sabe o preço das conquistas.  

E conta a lenda que nosso jovem pobre viu a luz no fim do túnel e tocou nela, quebrando um ciclo de tristeza e maldição. E foi o primeiro doutor da família. E já formou mais de 50 mestres e doutores do conhecimento, com a mesma fome que se tem a cada dia na busca por um prato de comida quentinha feito com carinho de mãe.

Leia também: Férias, elas existem mesmo?

Leia outros textos da coluna Ciência Nordestina

Helinando Oliveira é físico, professor titular da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf) e atualmente é vice presidente da Academia Pernambucana de Ciência.

Helinando Oliveira

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Site desenvolvido pela Interativa Digital