Na coluna Ciência Nordestina, Helinando Oliveira propõe uma reflexão sobre os rumos da ciência e tecnologia que atravessa uma crise no país
Ministério da Educação, 26 de setembro de 1945. Tinha início a palestra “Brasil, futura potência aérea”, proferida pelo prof. Richard Smith do Massachusetts Institute of Technology. Crescia firme o sonho do Marechal Casimiro Montenegro Filho de fazer no Brasil um novo MIT – o ITA, fonte geradora do sucesso nacional que mais tarde seria a Embraer.
Este cearense ousado, que cortou o país pelas asas do Correio Aéreo Nacional, não mediu esforços para transformar seus sonhos em realidade. Sonhos que ultrapassaram gerações e continuaram a alimentar conquistas para a aviação brasileira, que de promessa passou a realidade, conforme profetizara o prof. Smith.
E o Marechal Casimiro escreveu seu nome na história junto a uma equipe que alimentou um país de esperanças e agências de fomento, como Cesar Lattes, José Leite Lopes, Anísio Teixeira, entre tantos outros.
A produção do conhecimento pôde se consolidar sobre os alicerces levantados pelas mãos destes nobres cientistas que sonharam e foram, por essência, visionários.
E a Universidade Brasileira, na incondicional indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão passou a formar cada vez mais doutores, consolidando seus quadros de servidores dedicados a funções que requerem exclusividade. Anos mais tarde, a expansão das Universidades pelo interior do país trouxe novo alento à possibilidade de uma ação massiva de apoio ao acesso ao ensino superior e o fortalecimento da pesquisa em todos os cantos do Brasil. A formação de mestres e doutores provou números nunca antes imaginados. Tudo indicava que a ameaça neoliberal estivesse distante da educação, ciência e tecnologia e que o país da Embraer e que havia lançado seu primeiro astronauta no espaço estivesse de fato, decolando – e entendendo que estas são ferramentas de libertação e empoderamento de um povo.
Ledo engano! Não bastasse a fusão do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação com o Ministério das Comunicações, o contingenciamento de recursos da ordem de 44% e a PEC do teto surge uma medida provisória de plano de demissão voluntária, que tem por objetivo enxugar e esmiuçar indistintamente todo o esforço de uma geração em formar doutores, consolidar grupos de pesquisa, promover interações e parcerias internacionais.
A sensação exata é de que nada disso é relevante frente à necessidade do país em se desfazer de todas as suas conquistas, sob o argumento de uma crise que estereotipa e põe para debaixo do tapete todas as boas estatais, realçando ao público aquilo que seja suficiente para barateá-las ao capital externo.
E neste clima de liquidação de 26 de dezembro, o que se percebe são professores seniores antecipando suas aposentadorias, jovens doutores saindo do país e laboratórios paralisando suas atividades por falta de consumíveis e manutenção em equipamentos.
E a resposta a todo este clima de caos e desalento é um convite à demissão! Recado claro de que o salário dos professores e pesquisadores onera excessivamente uma nação que desperdiça milhões de reais para aprovação de reformas trabalhistas e da previdência.
Fico a imaginar o quanto custou para os cofres públicos o salário dos professores trazidos pelo Montenegro para implementação do ITA. E penso logo em seguida o quanto de lucro este investimento rendeu, com a criação da Embraer. É uma conta simples, que mostra que ciência dá muito lucro, gera divisas e riquezas para quem investe. Mas pelo jeito não é isto que o país deseja neste momento. Todos parecem querer menos ciência, menos direitos, menos Brasil.
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Helinando Oliveira