Covid-19 e isolamento social: perspectivas Ciência Nordestina

terça-feira, 26 maio 2020

Já passou da hora de compreendermos que o mundo não voltará a ser o que era antes

Enquanto a covid-19 avança e mata mais de mil brasileiros em um único dia somos vítimas de gestores públicos que minimizam o problema, cantam marchinhas, fazem churrascos ou mesmo lançam mandados de segurança contra a quarentena. Vivemos tempos muitos difíceis, em que lojas de departamentos resolvem vender feijão e arroz para tentar voltar a uma normalidade que não existe mais.

Muito antes de aderir às falácias conspiratórias (fáceis de digerir) é bom olhar para a China e pegar o seu exemplo. Menos chineses morreram porque o isolamento social deles foi mais efetivo que o daqui. O nosso, convenhamos, é uma grande confusão. E não foi apenas isso… Quando identificado o tamanho do problema, eles construíram novos hospitais, contrataram 40 mil profissionais da área de saúde e adquiriram EPIs e respiradores. E fizeram isolamento efetivo.

Em nenhum momento estabeleceram academias e salões de beleza como serviços essenciais. Não foram à TV dizer que era uma gripezinha e nem tão pouco buzinaram nas portas das UTIs. Então, por favor, não comparemos estas duas realidades.

No entanto, já chega aos nossos ouvidos que mesmo com todos os cuidados há uma segunda onda de covid-19 chegando a Wuhan. Estima-se que o isolamento social na China tenha evitado pelo menos 56 mil mortes e um total de incríveis 14 milhões de contaminados. Fico a imaginar o que será de nós, pobres brasileiros, após esta primeira onda (que nem chegou ao pico ainda). Encerraremos o isolamento social e seremos pegos em cheio pela segunda, terceira onda e assim por diante.

É importante que tenhamos claro que todo este processo só será equacionado com o desenvolvimento de vacinas. Isso só deve acontecer mesmo em 2021. Até lá, o planeta viverá de isolamentos e liberações parciais. Ou melhor, os países que prezam pela vida de seus cidadãos farão isto. O resto colocará seu povo na rua para se contaminar, trabalhar e morrer.

Já passou da hora de compreendermos que o mundo não voltará a ser o que era antes. Não dá mais para vivermos em grandes agrupamentos – entupirmos o shopping em véspera de feriado, lotar estádios e shows, ir à igreja, fazer feira, abraçar o próximo. Tudo isso precisa ser reinventado, mesmo que tenhamos de sofrer com a internet lenta e ruim, cuja conexão trava a cada dois minutos. É o que temos, afinal. E precisamos de um novo modo de gestão que pense nas pessoas que não tem acesso a internet, que não tem casa, que não tem teto. Falo dos que dormem nas filas em frente à Caixa Econômica pelos 600 reais. Dos que usam este dinheiro, de fato, para sobreviver. Um novo planeta precisa ser mais social, inclusivo, menos capitalista, mais Estado e menos privado.

E não há escolha. É isto ou a morte de milhões. Sei que alguns governantes já escolheram a morte de milhões. Mas eles estão lá porque foram escolhidos pelo povo. O vice-versa neste caso está a nosso favor – ao menos enquanto houver democracia. Peço perdão aos leitores pelas palavras de pouca esperança, mas é o que temos para o momento – manter o isolamento (contra tudo e todos que abraçam o deus mercado) e integrar a ciência para uma vacina rápida. E que a OMS nos perdoe pelo pecado de sair da sua grande aliança mundial, que prevê a chegada ao mercado de vacina a partir de um fundo de mais de 45 bilhões de dólares.

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Leia o texto anterior: Intervenção nas Universidades – parte II – implicações

Helinando Oliveira é Professor da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf) desde 2004 e coordenador do Laboratório de Espectroscopia de Impedância e Materiais Orgânicos (LEIMO).

Helinando Oliveira

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