Já passou da hora de entendermos que a espécie humana precisa abrir mão de alguns luxos na tentativa de reverter a catástrofe ambiental causada por ela mesma
Há uma grande incerteza sobre a disponibilidade de alimentos no planeta, uma vez que o aumento na população global requer uma crescente oferta de alimentos. Mantido o modo de produção atual, é notório que o planeta carecerá de espaços para criação de animais para abate. Não é à toa que a Amazônia está sendo destruída para dar lugar a um longo pasto para o gado. No entanto, este processo claramente não é sustentável. A produção contribui diretamente com o consumo de energia, emissão de gases do efeito estufa, uso de terras e de água. E com a destruição do que resta das florestas, dá ainda um empurrão no clima do planeta rumo à inviabilidade da vida humana. Existe ainda um ponto ainda não levantado nesta discussão: será que depois de tanta evolução tecnológica e científica, ainda precisamos da morte de outros seres vivos para nos mantermos vivos? O ser humano moderno pode viver sem os instintos carnívoros de seus antecessores, afinal a ciência já cria novas possiblidades.
E aquela que parece mais curiosa é a carne cultivada, ou carne in vitro. Idealmente serve para os não adeptos ao modo vegetariano, mas que não desejam contribuir com o aquecimento global nem o sofrimento dos animais. Partindo de células tronco, a carne artificial usa meios de cultura específicos para crescer em seus biorreatores e se transformarem em fibras musculares.
Em Cingapura já é comercializada a carne cultivada de frango e estima-se que mais de 50 empresas espalhadas pelo mundo já estejam preparando carnes cultivadas, cujo custo ainda é bem salgado. Todavia, este é o caminho das novas tecnologias: após sua consolidação e com a ampla concorrência deve acontecer uma queda gradual nos custos dos produtos. Sobre a aceitação, fizemos uma consulta rápida nas redes sociais e incríveis 63% dos respondentes disseram estar aptos a comer da carne cultivada.
A ideia é de que a carne cultivada não substitua de fato a carne verdadeira, pois certamente não se conseguirá reproduzir a textura de uma picanha ou a marmorização de uma peça de cupim bovino. Por outro lado, menos animais precisarão ser sacrificados pra manter este hábito tão carnívoro e tão humano. No entanto, se a causa mais nobre for a manutenção de nossas florestas e o equilíbrio ambiental do planeta, certamente valerá a pena largar os tradicionais churrascos.
Já passou da hora de entendermos que a espécie humana precisa abrir mão de alguns luxos na tentativa de reverter a catástrofe ambiental causada por ela mesma. Queimar menos combustível, usar menos plásticos, derrubar menos florestas, plantar mais arvores, matar menos animais é um excelente começo. Certamente sobreviveremos bem ao trocar a picanha pelo hambúrguer cultivado, ao mesmo tempo em que devemos adquirir modos mais saudáveis em nossa alimentação.
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Helinando Oliveira é Professor da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf) desde 2004 e coordenador do Laboratório de Espectroscopia de Impedância e Materiais Orgânicos (LEIMO).
Helinando Oliveira
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