Na escola do mundo ao avesso, a divulgação científica não é uma tarefa fácil
Como escreveu o grande escritor e poeta Eduardo Galeano, o mundo em que vivemos é uma grande escola, a escola do mundo ao avesso, dentro da qual quase tudo está literalmente de pernas para o ar. Ah, o Galeano!
Nesse ambiente, a ciência não é um daqueles assuntos tidos como dos mais interessantes. Ensiná-la, propagá-la e, consequentemente, aprendê-la, não são tarefas triviais, como alguns podem pensar. A divulgação científica definitivamente é uma dessas tarefas. Afinal, é preciso muita pedagogia para, ao menos, rivalizar com as indústrias de divulgação do medo, da tragédia, da violência, do consumo, da futilidade e do infortúnio alheio, isso para citar apenas alguns exemplos.
A pedagogia dessa nova escola é muito atraente, fornece-nos, inclusive, um curso básico de como não se comunicar, pois já não é preciso ouvir, ler e nem entender, apenas ver o anúncio. Lê-lo também já não é mais necessário, diferentemente dos likes e deslikes, os quais definem quem ganha e quem perde o jogo da divulgação. Vale lembrar que o anúncio traz consigo uma propriedade irremediável, que é a sua capacidade de sofrer “metástase”. Isto é, a propensão para ser repassado, e repassado, e repassado ad eternum.
Para fechar “com chave de ouro” a prática pedagógica dessa nova escola, eis que surge o curso intensivo sobre cárcere. Mas o cárcere da sociedade moderna − as mídias sociais. YouTube, Twitter, Instagram, Facebook, Tumblr e até o LinkedIn ajudam a deixar tudo ainda mais de pernas para o ar, se é que é possível. O seu papel dúbio facilita e atrapalha, populariza e ojeriza. Muitas vezes é rápido como a velocidade da luz em divulgar, e superficial como uma folha de papel em branco para informar. É visto, mas não é lido. Nessa pedagogia não há autonomia, apenas automação.
Então, se não é possível vencer o inimigo, ou melhor, o sistema, alie-se a ele. É assim que diz o ditado popular. Ou então, o que não tem remédio, remediado está. Pois é, que assim seja. Vale lembrar que o problema não está nos anúncios. Pelo contrário, eles representam uma ferramenta essencial para o sucesso que se quer alcançar com a divulgação, seja ela científica ou não. O problema está, na verdade, em se ater apenas a ele. Ah, mas o mundo moderno tem muita pressa! E complementam: (…) ainda há aquelas indústrias de divulgação que me chamam mais atenção. Pode ser. Contudo, esvanece-se assim a nossa capacidade de refletir, de questionar, de distinguir o que é fake e o que não é, por exemplo. Triunfam-se, assim, as “Pós-Verdades”. Dessa maneira, adotamos nessa escola do mundo uma pedagogia em que oprimimos e somos oprimidos. Afinal, ela está ao avesso.
Referências:
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Thiago Jucá é biólogo, doutor em Bioquímica de Plantas e empregado da Petrobrás.
Thiago Jucá
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