Uma abordagem ágil para a transformação de escritórios de advocacia: do físico ao digital
No final de abril, tive a imensa satisfação de figurar como membro avaliador em uma banca de qualificação do Mestrado de Inovação da UFRN, cujo título provisório é “Uma Abordagem Ágil para Transformação Digital de Escritórios de Advocacia”.
E por que a satisfação é superlativa? Assisto, já há algum tempo, o Dr. Adv. Francisco de Assis Costa Barros – ele sempre pede que dispensemos boa parte dos vocativos, chamando-o só por “CB”, pois assim se sente 4.0 -, levar, junto aos sócios, o escritório de advocacia a um outro patamar e, concomitantemente e para minha alegria, validar conceitos que discutimos há alguns anos, quando nos conhecemos em uma palestra na Escola de Ciências e Tecnologia (ECT-UFRN).
O bate-papo de hoje é sobre mais um success case do ecossistema de inovação que gira em torno da ECT, a qual poderia tranquilamente ser a escola de negócios inovadores da UFRN, já que lá habitam os seres que respiram CTS (Ciência, Tecnologia e Sociedade), criaram as incubadoras e suas respectivas resoluções, introduziram o movimento lean na universidade (Canvas, Ágil, Lean Startup, Design Thinking etc.), deram o pontapé inicial no modelo de parque tecnológico, ajudaram a escrever a Lei Complementar Nº 478 DE 27/12/2012, que estabelece medidas de incentivo à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no RN; engrossaram o caldo para desenhar e operacionalizar o NIT, hoje AGIR, Agência de Inovação da UFRN, e que fundaram o primeiro mestrado profissional de inovação pura em IFES do Brasil, aglutinando tudo isto no grupo e ênfase Negócios Tecnológicos. Mas deixemos isto para outra história. Registrei esse fato para explicar de qual ecossistema falo e para dizer que o marco na forma de advogar – e outros negócios inovadores que surgiram e surgirão no Mercado potiguar -, têm um berço apropriado. Apenas neste item é que vamos focar hoje. Deixarei esse importante ecossistema para outra ocasião.
1.0, 2.0, 3.0 e 4.0. O que isto significa?
Se você der uma olhadinha em A inexorável inteligência artificial, vai encontrar lá que a 1ª Revolução (+/- 1760) nasceu da separação clara entre os métodos de produção artesanal dos produzidos por máquinas. Vai achar também que na 2ª revolução (+/- 1840), a reboque da 1ª, foram desenvolvidos melhores processos e sistemas de energia mais eficientes. Que a 3ª revolução ficou marcada pela passagem da tecnologia mecânica-eletrônica-analógica para a eletrônica digital, o que se deu aproximadamente entre o final dos anos 1950 e o final dos anos 1970. Depois desta, claro, e em um fórum mundial na Alemanha ocorrido em Outubro de 2012, uma galera de engenheiros resolveu juntar tudo (pessoas + processos + inovação + automação + inteligência artificial + robótica + cooperação + meio ambiente + computação em nuvem + IoT e que desse) em um único pacote, e declarar que isso tinha características semelhantes a de um organismo vivo, inteligente e energeticamente eficiente, e decretaram a 4ª revolução. Alguns a nomearam como era da Transformação Digital (TD), para mim subestimadamente, pois defendo que estamos promovendo também nossa própria revolução biológica.
Darwinismo à parte, é consenso que todas as revoluções até aqui foram driven by the Market, ou puxadas pelo Mercado, influenciando diretamente a forma de como trabalhamos e damos os nomes às coisas. Na esteira – e por causa – da 4ª revolução, surgiram a Indústria 4.0, Market 4.0, Management 4.0 e um bocado de coisa com este sufixo, para indicar que estão alinhados com a eficiência, a ubiquidade (onipresença) e a pervasividade (espalhamento) gerados pela intensidade de comunicação promovida pela Internet. Vou deixar para vocês o exercício mental de como seriam as advocacias 3.0 e anteriores. Porém segue uma dica: associem a papel, prazos esquecidos, processos perdidos, baixa eficiência e alta burocracia. Nada animador, né não?
Sujeito e Objeto: a trajetória do escritório do Dr. CB!
O Dr. CB começou a trajetória de transformação de seu negócio de modo marcante, a qual tive a honra, como gestor da inPACTA nos idos de 2019, de registrar: doou os imponentes móveis do escritório para nossa incubadora como forma de dizer, e garantir para si mesmo, que não tinha mais como voltar atrás, mudando-se imediatamente com seu time para um escritório de coworking dentro do parque tecnológico no entorno da UFRN. Havia uma simbologia muito forte em seu ato, tanto que na mesma época entrou no mestrado de inovação em 1º lugar, diga-se de passagem, viabilizou artefatos para uma incubadora de empresas, carente deles, e, em ato contínuo, livrou-se de pesos para poder voar em um céu não de brigadeiro, mas cheio de nuvens… tecnológicas. Tudo isto antes da pandemia iniciada em 2020. Parece que estavam prevendo. Na verdade, pelo que conheço do time, sempre estão preparados para crises.
Esta historinha que descreve o perfil do time e seu modus operandi, que pode ser melhor contada pelo Dr. CB e aliados, confirma o que em tempos pandêmicos mostrou-se um comportamento acertado: estar sintonizado com o mundo e a todo tempo procurar pelas bordas, fez com que seu escritório voa-se por sobre as cumulonimbus (as piores nuvens) e na direção correta. O escritório do Dr. CB não só preparou o time para ser sujeito da aventura, mas também como seu próprio objeto de teste: estudaram várias técnicas, absorveram vários métodos, testaram inúmeras hipóteses e experimentaram enquanto aprendiam. Foram protagonistas de uma história escrita por eles mesmos. Do ponto de vista de seus clientes, que eram muitos, trocaram o motor do carro em movimento sem que ninguém percebesse. Foram sujeito e predicado simultaneamente.
Transmutação Organizacional (TmO) e satisfação superlativa
A pouco mais de um ano, em A transformação digital, o barco de Teseu e a transmutação, introduzi o conceito de transmutação digital, uma criação ainda muito influenciado pela questão tecnológica. Passado-se um ano, várias conversas com empresários e observação de muitos negócios (presencial e por vezes remotamente), fez-me perceber que talvez este conceito estivesse restrito e que precisava incluir neste conceito questões sobre evolução de time a forma de como tratavam os processos de mudança, a ponto de eu precisar definir cinco níveis de inovação negocial e descrevê-los em uma espécie de framework, que chamei de Lean Ocean, onde o nível mais alto mostrava a Transmutação Organizacional, que envolvia a descoberta de um princípio negocial capaz de “Matar” a empresa original e fazer com que migrassem a essência para um novo negócio.
A alegria superlativa nasceu durante a apresentação da qualificação do Dr. CB, quando percebi que seu escritório, o eCB, ao migrar para o coworking e “mandar” boa parte do time para casa, literalmente, utilizou a separação do corpo para, contraditoriamente, ser obrigado a promover um princípio relativamente novo, a integração da inteligência, já que tudo agora tinha de ser compartilhado em tempo real e em um espaço visível e acessível a todos, o que só pode acontecer em nuvem. Assim, o Dr. CB e Brothers recriaram o negócio em um novo formato, mantendo ainda a mesma essência do eCB físico com um grande bônus: aumento da produtividade. Vejo então a aplicação de um novo princípio – integração da inteligência – promovendo o mais alto grau de ruptura em uma empresa: a Transmutação Organizacional (TmO). A validação se deu pelos indicadores de produtividade. É gratificante ver a verificação de um conceito.
Advocacia 4.0
Voltando aos conceitos que carregam o sufixo 4.0 acima mencionados, onde o escritório do Dr. CB (eCB) se encaixa? Observando tudo aquilo que o moçada da Alemanha juntou, assistimos o eCB promover a própria evolução, integrar todo o time, sistematizar uma miríade de processos, desenvolver métodos baseados em IA (na defesa foram apresentados alguns; não posso relatar aqui por serem estratégicos) e, quando tudo isto estiver redondo, poderá garantir o item imprescindível para se tornar uma startup: a sonhada escalabilidade! Tudo isto feito em dois anos em um dos setores mais difíceis de se promover a inovação: a área do direito! A essa epopeia, pode-se atribuir o sufixo e chamá-la de Advocacia 4.0.
Finalizando…
Da transformação acontecida – eCB físico para eCB 4.0 -, dos resultados alcançados e insights que brotaram ao assistir a defesa do Dr. CB, o que mais tocou meu elmo empreendedor foi a hashtag que sua equipe utilizou como combustível para fazer tudo acontecer, capaz de transformar seu escritório em um organismo vivo com um sistema nervoso integrador 4.0. Hashtag que manteve claro o propósito e elevado o moral do time nessa árdua jornada, a qual era ouvida no escritório por todos, mais do que “sims” e “nãos”, e que deveria ser eleita o mantra maior de todos os desbravadores da inovação: #Vamos testar?
Referência:
Mestrado de Inovação da UFRN (https://sigaa.ufrn.br/sigaa/public/programa/noticias_desc.jsf?lc=pt_BR&id=9109¬icia=150545103)
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Leia a edição anterior: Empreender e Caatinga, nem forçando isso dá rima
Gláucio Brandão é Pesquisador em Extensão Inovadora do CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.
Gláucio Brandão
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