Abordagem subversiva Disruptiva

quinta-feira, 17 abril 2025
(Foto: José Cruz / Agência Brasil)

A próxima ruptura no mundo dos negócios será criar um agente inteligente que consiga entender seu negócio a ponto de sabotá-lo

(Gláucio Brandão)

Contestar hipóteses básicas é essencial para criar ideias revolucionárias” (Eliyahu Goldratt, pai da Teoria das Restrições)

De acordo com o Dicionário Online, uma das definições para subversiva é: “Alteração ou aniquilamento de uma ordem estabelecida”. No linguajar Triztorming, a abordagem subversiva (AS) é aplicada no ambiente de startup de diversas maneiras, todas focadas em questionar suposições, desafiar normas estabelecidas e criar soluções inovadoras a partir de perspectivas inusitadas. Em sala de aula, utilizamos esta técnica para romper a inércia psicológica, encontrar a raiz de problemas e falhas em projetos e gerar antissistemas, espécie de agente que pode ser saudável para seu negócio. Para começarmos a olhar a palavra “subversiva de outra forma”, descrevi algumas situações em que a AS pode ser aplicada. No decorrer do texto, sugiro como a AS pode ser aplicada no ecossistema empreendedor, claro que da forma mais saudável possível.

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Em muitas empresas, existe uma pressão enorme para alcançar o sucesso rapidamente ou evitar o fracasso a todo custo. Subverter essa ideia pode ser uma forma poderosa de inovação. Ao invés de ver falhas como algo a ser evitado, elas podem ser encaradas como oportunidades para aprender, ajustar e evoluir o produto ou modelo de negócios. Isso pode ser aplicado por meio de uma cultura de “falhas inteligentes”, onde os erros são vistos como um ponto de partida para novas soluções e não como um fim de jornada, além de criar repertório do tipo “nunca faça assim”.

Romper, de modo produtivo, a hierarquia tradicional

As startups geralmente possuem estruturas mais horizontais. Mesmo assim, muitas vezes ainda existe uma hierarquia implícita que limita a criatividade. Subverter isso significa dar mais autonomia aos colaboradores para tomar decisões e testar novas ideias, independentemente da posição hierárquica. Em vez da cristalizada mentalidade de “quem manda é o CEO”, todos os membros da equipe (de qualquer nível) poderiam ser vistos como agentes de mudança e inovação, incentivando uma dinâmica mais colaborativa e criativa.

Muitos empreendimentos seguem modelos tradicionais de monetização (venda de produtos, assinaturas, anúncios etc.). A subversão aqui pode ocorrer ao repensar o próprio conceito de valor. Por exemplo, em vez de simplesmente vender um produto ou serviço, a startup pode se concentrar em criar valor contínuo para seus usuários (LTV*), oferecendo experiências, conectando pessoas ou resolvendo problemas de maneiras inesperadas, o que pode abrir portas para novos modelos de negócios, como plataformas de economia compartilhada ou modelos baseados em “freemium”, que incentivam o uso e a viralização antes de buscar monetização direta.

Subverter a abordagem de produto-mercado

Muitos empreendedores cultuam a obsessão por um produto perfeito antes de lançá-lo no mercado. A subversão aqui envolve lançar versões mínimas viáveis (MVPs**) rapidamente, mesmo que ainda estejam longe de serem “perfeitas”, e ajustá-las com base no feedback real dos usuários, não dependendo exclusivamente de estudos de mercado e planejamento. Isso também pode incluir a subversão da noção de “cliente ideal”, permitindo que diferentes segmentos de clientes testem a mesma solução e forneçam feedback relevante para ajustes rápidos. Na Aula Condensada (AC) Do conceito à ação: o poder dos protótipos e objetos de fronteira sugiro criar um protótipo e, após o feedback de clientes, coletar as especificações, o contrário ao que é costumeiramente feito.

Em vez de se apegar a processos tradicionais de desenvolvimento, planejamento ou reuniões, você pode subverter as práticas tradicionais com abordagens mais dinâmicas. Isso pode incluir o uso de técnicas como o “brainstorming caótico”, onde ideias disruptivas são exploradas de forma livre e sem julgamento, tentar o brainstorming “reverso”, que inverte o processo tradicional de brainstorming: em vez de focar em soluções, concentramos em identificar como um problema pode ser agravado, possibilitando enxergar falhas e obstáculos sob uma nova perspectiva. Pode-se, por exemplo, aplicar o modelo de “ideação por subversão”, onde todos os conceitos e suposições existentes são questionados, ou invertidos, para gerar soluções totalmente novas.

Subverter as expectativas sobre o mercado e a concorrência

Os players do mercado se concentram tanto em copiar os concorrentes ou tentar seguir as tendências atuais, que acabam se perdendo na competição. Uma AS questionaria as convenções de mercado, propondo soluções que não apenas competem diretamente com os rivais, mas criam novos nichos de mercado ou transformam a forma como os produtos/serviços são consumidos. Isso pode envolver também entrar em mercados onde ninguém mais está indo ou mudar radicalmente o modo como o serviço ou produto é entregue, como foi o caso de empresas como Airbnb e Uber, que subverteram a indústria de hospedagem e transporte.

Os clientes têm expectativas baseadas em experiências passadas e cultura de consumo. Subverter essas expectativas pode envolver criar uma experiência de usuário inesperada, oferecendo mais valor do que eles imaginam, o que pode ser uma experiência personalizada, uma interface surpreendentemente simples ou um sistema de suporte ao cliente de altíssima qualidade, colocando sua startup como líder de inovação no setor.

A abordagem subversiva é um método analítico que desafia o status quo e rompe com a previsibilidade. Vai além do pensamento divergente ao expor vulnerabilidades ocultas e gerar transformações reais. Atua pela desconstrução de pressupostos otimistamente aceitos, revelando lacunas estruturais. Seu foco é romper dogmas, questionar normas e reconfigurar sistemas. Mais que vantagem competitiva, busca redefinir os parâmetros da realidade comercial vigente.

Conceito explicado, vem a receita subversiva!

Os passos do algoritmo subversivo seguem uma lógica estruturada:

  1. Identifique a parte do sistema/problema que será avaliada.
  2. Colete todas as informações disponíveis. Chama isso de benchmarking.
  3. Descreva como o sistema opera.
  4. Analise a qualidade das partes do sistema determinando quais partes são frágeis.
  5. Encontre as áreas sujeitas a maior carga.
  6. Associe causa e efeito para identificar a raiz do problema.
  7. Detone! Questione, reconfigure e explore novas possibilidades ou flancos por onde atacar.

A abordagem subversiva pode ser aplicada tanto em projetos próprios quanto na análise da concorrência, garantindo que nenhuma vulnerabilidade passe despercebida.

Caso você não tenha uma boa estratégia, em curto ou longo prazo, tenha em mente que sua empresa vai morrer. Se isso é certo, por que não ser você mesmo o seu algoz? Trocando em miúdos, a estratégia que sugiro é a de gerar sua antiempresa, aquela capaz de matar a sua atual empresa. Deixa eu explicar pra não parecer maluco: você deveria ser a pessoa que melhor entende seu negócio. Então, utilize o algoritmo subversivo e crie a empresa – claro que um modelo simulado – capaz de “matar” a sua. Essa antiempresa deverá ser capaz de apontar todas os pontos fracos da sua, fazendo com que você corrija ou se prepare para possíveis ataques. Esta é a estratégia.

Próxima ruptura

Vivemos um tempo em que simular e prototipar nunca foi tão barato. Nos últimos tempos, um hall de IAs entrou em cena, colocando um pouco de inteligência no que achávamos que fazíamos bem. Juntando tudo isso, a próxima ruptura no mundo dos negócios será criar um agente inteligente que consiga entender seu negócio a ponto de sabotá-lo. Em princípio, virtualmente, claro, fazendo com que as corporações se compreendam.

Bom, acredito ser isso melhor do que vindo da concorrência, que já pode estar fazendo isso neste momento. Ou seja: não há como escapar de uma abordagem subversiva. Ela terá de ocorrer de dentro (melhor) ou virá de fora (pior). Escolha!

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Notas:

*LTV ou Lifetime Value: métrica de vendas que calcula o lucro total gerado por um cliente enquanto ele continua comprando seus produtos.

**MVP ou Minimum Viable Product: podemos definir como uma versão enxuta de uma solução.

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Gláucio Brandão é professor titular da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e autor do livro Triztorming

A coluna Disruptiva é atualizada às quintas-feiras

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