Um povo acordado para os seus direitos não adormece na subserviência... Na coluna de hoje, Helinando Oliveira questiona o comportamento humano fazendo alusão à tecnologia.
Esta história aconteceu dentro de um pequeno smartphone, que funcionava em uma pequena cidade de um país muito pobre. Todavia, como todos são interligados, todo o mundo eletrônico conheceu desta revolta no mesmo dia em que aconteceu.
Os equipamentos eletrônicos escondem coisinhas mágicas, chamadas circuitos elétricos. E como em toda a sociedade, por conviver em um mesmo espaço passou a ser estruturado em castas. A nobreza é bem caracterizada pelos osciladores, ou como gostam e ser chamados os “clocks”, que determinam o ritmo com que a máquina funciona, sendo maestros (o coração do circuito).
Descendo ao mais baixo nível chegamos aos resistores, aqueles que são o povão da sociedade circuitense. Eles servem para limitar a corrente elétrica e são os primeiros a queimarem (e partirem para outra dimensão – o céu dos circuitos) em casos de picos de corrente ou tensão – para proteger os componentes mais valiosos.
No entanto, não querem os dirigentes políticos do mundo dos circuitos deixar os resistores entenderem que a corrente elétrica (o sangue dos circuitos) que tudo alimenta passa por eles. Todos acreditam que sua miserável existência é condicionada ao aquecimento. Quanto mais aquecem, mais protegem os outros e mais próximos ao fim estão. E nesta escravidão seguem os resistores, na ignorância de sua real utilidade. Toda a nobreza dos modernos circuitos integrados, osciladores e microprocessadores depende destes pequenos pedaços de carbono que fazem tudo funcionar.
Mas tudo mudou quando um resistor diferente passou a convencer o chão de fábrica de sua importância: da primeira greve geral dos resistores toda a sociedade parou. E eles passaram a exigir seus direitos: 13° salário, férias, periculosidade, insalubridade. Diante de tamanha audácia, os nobres decidiram: algo precisava conter a rebeldia dos resistores. E um julgamento foi criado, todo um clima montado, o líder dos resistores precisava ser execrado.
Os próprios resistores passaram a se posicionar contra o seu líder, na certeza de que apoiando os osciladores poderiam um dia trabalhar junto a eles. Ledo engano, embora consumissem a corrente elétrica que passava pelos resistores, tudo o que os componentes ativos queriam era distância daquela gente.
E um tribunal dos componentes foi montado, um julgamento realizado para tornar o líder dos resistores culpado. Sua pena foi permanecer ligado em 380 V por quanto tempo fosse possível, na certeza de que a sua existência fosse recheada de dor. Afinal, na dor, ninguém pensa, apenas sofre. E o líder resistor padeceu de uma longa pena, e o silêncio foi feito no meio dos resistores. Eles voltaram a trabalhar para a nobreza.
Diriam os mais jovens que o sofrimento do líder foi em vão. Todavia, sabiam os mais velhos que um povo acordado para os seus direitos não adormece na subserviência. Eles deram um passo atrás para seguir dois passos à frente. Vida longa à resistência.
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Helinando Oliveira