As perspectivas do Parlamentarismo no Brasil Artigos

sábado, 13 abril 2019
O Ovo [Urutu]. Obra de Tarsila do Amaral.

Voltando à pauta de temas brasileiros em momentos de crise, mais uma vez o parlamentarismo aparece no horizonte como possível solução

Em 2016, em meio à crise política que resultou no impeachment da presidenta Dilma Rousseff foi apresentada uma Emenda Constitucional de autoria do Senador Aloysio Ferreira Nunes (PSDB), que tinha por objetivo alterar a Constituição para implantar o sistema parlamentarista de governo. Embora tivesse suscitado algumas discussões e polêmicas, sequer foi votada.

Em 2017, mais uma tentativa: com o apoio dos presidentes da República e do Supremo Tribunal Federal, o tema voltou a ser discutido. Com a nomeação de Alexandre de Moraes para ministro do STF, houve a retomada de um Mandado de Segurança que tinha por objetivo à implementação do parlamentarismo sem necessidade de plebiscito ou consulta popular. O tema gerou muitas polêmicas, inclusive com posicionamentos públicos de juristas contrários à sua aprovação, o ministro recuou e arquivou o documento em junho de 2018.

E este ano (2019), mais uma vez o tema retorna no contexto de uma relação pouco amistosa do presidente da República com o Congresso Nacional. Há uma frágil articulação que poderá criar um cenário propício para a discussão do parlamentarismo.

Um governo que, sem programas consistentes, mantém a retórica da campanha eleitoral, e as dificuldades de resolver (ou pelo menos encaminhar soluções) para os graves e complexos problemas do país podem ser expressos na queda nos índices de aprovação do governo, que encerrou o mês de março de 2019 com a menor popularidade de um presidente em um primeiro mandato desde 1995

O fato é que sem articulação eficiente e produtiva com o Congresso, criando polêmicas desnecessárias, como o bate boca pueril com o presidente da Câmara dos Deputados; declarações polêmicas, a tentativa de reabilitar a ditadura, etc., tudo isso pode até agradar parte do seu eleitorado, seguidores nas redes sociais, mas não serve para ampliar sua base de apoio dentro e fora do Congresso Nacional e abre espaço para se discutir alternativas, como o parlamentarismo.

O ativismo nas redes sociais ajuda mais a manter a polarização política e ideológica – que o ajudou a se eleger – mas não contribui para a construção de um consenso mínimo visando garantir a governabilidade. Não se pode ou não se deve governar um país como o Brasil através das redes sociais e desperdiçar tempo com questões irrelevantes.

Hoje, ao que parece, o único projeto do governo é a (polêmica) reforma da previdência e há uma grande dificuldade de convencer tanto a sociedade – inclusive os que votaram nele – como o Congresso Nacional de que a proposta encaminhada pelo governo é a única alternativa. Quem de fato serão os beneficiados? Para convencer, precisa além de argumentos consistentes (o que são apresentados e defendidos são sujeitos a discussões e contestações), precisa de propaganda e esta segundo levantamento feito pelo UOL em matéria publicada no dia 8 de abril de 2019 “já consumiu R$ 183 milhões em campanhas publicitárias, pesquisas e até em sites que não existem mais (…) esse valor foi contratado durante a gestão do ex-presidente Michel Temer (MDB), mas o governo do presidente Jair Bolsonaro também já autorizou o  gasto de mais R$ 12 milhões em campanhas sobre o tema”.

A desarticulação do governo no Congresso Nacional para aprovar reformas levou a derrotas, como a PEC do Orçamento Impositivo, aprovada no dia 26 de março de 2019 pelo Plenário da Câmara dos Deputados, em dois turnos de votação. Ela determina a execução obrigatória de emendas parlamentares de bancada.

Foram 453 a favor e 6 contra no 2º turno e aprovada também no Senado no dia 3 de abril de 2019. O texto foi votado em regime de urgência e passou pelos dois turnos exigidos pelo regimento. No primeiro, 58 senadores votaram a favor e 6 contra. No segundo, 59 votos a favor e 5 contra.

A Proposta de Emenda à Constituição prevê que, em 2020, a aplicação de recursos seja limitada a 0,8% da Receita Corrente Líquida (RCL) do exercício financeiro anterior. A partir de 2021, passa a ser de 1%.

Resumidamente, a aprovação do Orçamento Impositivo tira do governo a margem de manobra para contingenciamentos e/ou para investimentos em outras áreas.

É nesse cenário de dificuldades que segundo matéria publicada no jornal Folha de S. Paulo por Raquel Landim no dia 5 de abril de 2019 cresceram as articulações de grandes empresários junto a líderes do Congresso, que buscam isolar Bolsonaro e implementar um ‘parlamentarismo informal’ “Nas últimas semanas, cresceram as articulações diretas dos grandes empresários junto aos principais líderes no Congresso, com destaque para o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, para instituir um parlamentarismo informal. O objetivo é viabilizar a reforma da previdência e na sequência, a reforma tributária e isolar o presidente Jair Bolsonaro (PSL), deixando o titular da Economia, Paulo Guedes, como uma espécie de “primeiro-ministro”.

O objetivo dos empresários, é aprovar uma reforma da previdência (que, obviamente atendam aos seus interesses), assim como uma reforma tributária (com os mesmos objetivos), isolar o presidente e o ministro Paulo Guedes, atuar como espécie de “primeiro-ministro”. O difícil nesse caso é convencer o Congresso Nacional e a sociedade, incluindo os seguidores do presidente, de que esta será a melhor solução para a crise política.

Segundo a matéria, o clima entre os empresários é de exasperação com tantas polêmicas desnecessárias e há muita insatisfação com alguns ministros (em especial com os “olavistas”) assim como a falta de articulação política do governo. Uma Pesquisa divulgada no dia 8 de abril de 2019 pela XP Investimentos revela que a aprovação do presidente da República entre agentes do sistema financeiro caiu 58 pontos porcentuais em três meses, passando de 86% em janeiro para 28% em abril os que consideram “ótimo” o governo. Os que consideram regular ou péssimo o governo são 72%.

A crise política reativa o debate sobre implantação do parlamentarismo no Brasil e nesse sentido alguns parlamentares querem aproveitar o momento e propor ao presidente da Câmara dos Deputados, deputado Rodrigo Maia, a criação de uma comissão para debater com profundidade a possibilidade da sua adoção. É o que afirma Daniela Lima, em matéria publicada no jornal Folha de S. Paulo no dia 24 de março de 2019: “Deputados veteranos dizem que os recentes episódios confirmam a tese de que o modelo presidencialista se esgotou e não atende mais às demandas do país”. No entanto salienta que como não dá para “trocar a roda com o carro andando”, o objetivo seria uma mudança de regime político que passe a valer a partir de 2022, com o fim da atual gestão.

No entanto, a possibilidade de mudanças nesse sentido no Congresso Nacional, neste momento, a meu ver, é muito remota, mesmo com todos os problemas do governo com o Congresso. Da mesma forma que ocorreu em outros momentos quando propostas como a do parlamentarismo foram encaminhadas tanto na Câmara dos Deputados como no Senado que sequer foram votadas em plenário.

Mas os desdobramentos de uma crise política são imprevisíveis e pode levar a mudanças de posição. Tudo depende de como o governo irá se comportar.

O parlamentarismo não é um tema que tenha amplo apoio popular (até porque a maioria do eleitorado não deve ter muita clareza quanto às diferenças entre um regime e outro) e encontra muitas resistências no Congresso Nacional, apesar de sucessivas crises. A saída seria aprovar uma emenda que convocasse um plebiscito, mas esta possibilidade embora remota tivesse o mérito de ampliar o debate, esclarecer diferenças, analisar sua adoção tanto no Brasil como em outros países, e assim o eleitorado poder votar de forma consciente, sem manipulações e propagandas, como ocorreu em 1993, quando o presidencialismo ganhou com larga margem, mas sem que houvesse um amplo e qualificado debate sobre o tema: venceu quem fez a melhor propaganda.

Referências

(https://www1.folha.uol.com.br/colunas/raquellandim/2019/04/empresarios-buscam- isolar-bolsonaro-e-implementar-parlamentarismo-informal.shtml)

(https://painel. blogfolha. uol.com. br/2019/03/24/crise-politica-reativa-debate- sobre-implantação-do-parlamentarismo-no-brasil/)

Homero de Oliveira Costa é Professor Titular (Ciência Política) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

Para saber mais sobre parlamentarismo, leia:

Parlamentarismo, agora?

Leia o artigo anterior:

Sobre o presidencialismo de coalizão

Homero de Oliveira Costa

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