Cientista potiguar apela para governadora mudar os rumos da instituição que deve fomentar a ciência no Estado
Em artigo para o Nossa Ciência, o professor titular da UFRN e coordenador de um Comitê no CNPq, John Fontenelle aborda a falta de apoio do Governo do Estado à pesquisa. Ele classifica como desvio a atuação da Fapern. Em nível federal, no entanto, há um cenário mais promissor, com novas políticas de fomento à ciência. A esperança é que esses avanços também impactem positivamente o RN e garantam mudanças necessárias para o futuro da pesquisa científica no estado.
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Você, que agora lê esse texto, talvez nem conheça algum cientista no Rio Grande do Norte (RN), mas, para a sua surpresa, somos muitos. A culpa não é sua, mas do mito de que os cientistas são quase sempre homens, brancos, pessoas excêntricas, vestidas em um jaleco branco e cabelo não penteados. Mas a realidade é outra.
Há exemplos do passado, como o engenheiro Augusto Severo. Ele foi um grande cientista e reconhecido internacionalmente. E no presente, a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) tem cientistas de ponta em diversas áreas.
Na Física, eu destaco os astrofísicos que estudam os planetas fora do sistema solar. Na Neurociência, o Instituto do Cérebro, da UFRN, tem quatro dos principais neurocientistas brasileiros, conforme importante ranking mundial. Na área de engenharia dos materiais, temos também grandes pesquisadores.
A ciência do RN se orgulha de ter grandes cientistas trabalhando fora do nosso estado. Um exemplo é o professor Jessé Souza, um dos maiores cientistas políticos da atualidade no Brasil, e que atualmente está na Universidade Federal do ABC.
E tem mais, neste ano de 2024, duas teses de doutorado produzidas na UFRN ganharam o Prêmio CAPES de Tese. Este é um quadro pequeno em relação à quantidade e à qualidade da ciência do RN.
Procure lembrar que durante a pandemia do Covid-19 se falou muito da importância da ciência. Você deve ter ouvido muito a expressão; “estas medidas são baseadas em evidências científicas”. Embora isto pareça valorizar a ciência, não é uma verdade absoluta, afinal, várias medidas foram tomadas como respostas à economia ou interesses que, às vezes, nos pareceram obscuros. Todavia, temos de afirmar que foi exatamente o avanço da ciência, em especial no desenvolvimento das vacinas, que permitiu o controle da pandemia evitando assim milhões de mortes em decorrência desta doença.
Investimento do RN está abaixo do necessário, afirma SBPC
No RN, a ciência também tem contribuído em muito com a melhoria da qualidade do ensino superior. O reconhecimento da UFRN como uma das melhores universidades brasileiras se deve, em muito, às ações dos seus cientistas. São eles que criam condições humanas e materiais para a realização de ensino superior moderno e de qualidade.
E nessa reflexão sobre como anda a ciência, e olhando para o RN, posso afirmar que a ação do Governo do Estado em relação ao apoio à pesquisa é lamentável e isso é preocupante.
A Fundação de Amparo e Promoção da Ciência, Tecnologia e Inovação do RN (Fapern) não tem cumprido o seu papel de apoio à ciência. Ela tem assumido um desvio de sua função, quando utiliza recursos para pagamentos de bolsistas para exercerem função burocráticas do estado. De todos os estados brasileiros, a Fapern está em penúltimo lugar em repasse de recursos para o apoio à ciência e à tecnologia. O dado foi apresentado pelo presidente do Conselho das Fundações de Amparo à Pesquisa (Confap), professor Odir Dellagostin. O RN fica na frente apenas de Roraima, conforme mostra o gráfico que abre este texto. Para um estado que tem uma das melhores universidades do Brasil, como a UFRN, esta realidade da Fapern é uma vergonha.
Parafraseando o Presidente Lula, entendemos que usar recursos públicos para a ciência não é um gasto, é investimento. É preciso que os nossos governantes entendam que sem ciência não há como aprimorar e renovar o ensino e formar professores adequadamente e nem como equipar e renovar a infraestrutura de escolas estaduais. Aqui em nosso estado, também não tivemos grandes avanços na educação, e sem uma educação ampla e de qualidade não teremos ciência, afinal, sem educação não teremos jovens motivados para a careira científica, para a vida e mesmo para a cidadania.
Com estas considerações, podemos dizer que a professora Fátima Bezerra, já na metade do seu segundo mandato como governadora, foi reprovada na disciplina de ciência.
Mas nem tudo está perdido. Afinal, em nível federal temos bons ventos que estão soprando na vela da ciência. Embora este vento ainda seja fraco, ele está produzindo um deslocamento dos nossos veleiros em uma rota para um futuro melhor para a atividade científica no Brasil. Tivemos o lançamento de diversos editais pelo CNPq, tivemos aumento nas bolsas e uma reorganização da estrutura científica em nível nacional com o objetivo de superar as desigualdades regionais e de gênero.
As ações do Ministério de Ciência, Tecnologia e Informação, MCTI, principalmente através do CNPq e Finep estão mostrando um maior volume de recursos para financiamento de projetos de pesquisas. Destacamos também que estas ações estão sendo mais transparentes e orientadas para uma maior inclusão social na ciência.
Como eu sou um otimista de carteirinha, tenho a esperança de que os ventos da atual política nacional de ciência e tecnologia promova a consolidação de uma nova política de fomento para a ciência e que este vento venha até o RN e contamine as ações política do governo estadual. Quem sabe, em 2025 teremos muito a comemorar no dia 8 de julho, o Dia Nacional da Ciência. Mas isto vai depender se a nossa governadora mudar os rumos da Fapern.
John Fontenele Araújo é professor titular da UFRN e coordenador do Comitê de Assessoria de Psicologia do CNPq
John Fontenele Araújo
Parabéns pela coragem de relatar o que vem ocorrendo há mais de uma década na FAPERN, Prof. Fontenele!
Obrigado pelo incentivo, precisamos construir uma verdadeira política de fomento a ciência no RN