Qual o diferencial para seu produto ser escolhido? Veja os caminhos apontados pelo colunista para criar aquela diferença "matadora"
Imagine as seguintes cenas. Vou dedicá-las a alguns negócios típicos, só para estabelecer o ponto de discussão.
Cena #1. Para os fornecedores de produtos em gôndolas. Você está lá, abastecendo uma prateleira com seu produto “A”, lotada de similares ao seu. Vamos nos deter apenas ao produto em si, desconsiderando, por exemplo, estratégias do marketing que utilizam locutores de promoções, local das gôndolas, posição do produto na prateleira para ficar mais à vista do cliente e outros truques, por exemplo. Aí um cliente chega e apanha o produto “B”. Um segundo cliente se aproxima e saca o produto “C”, vizinho ao seu. E, pra acabar de “matar”, um terceiro cliente se aproxima, pergunta se ainda tem o produto “X” ou, na negativa, onde poderia encontrá-lo! Você pensa: “muita cara de pau!”.
Cena #2. Para os desenvolvedores de app. Você desenvolveu um app (aplicativo) e acaba de lançá-lo no Mercado. Certo dia, você senta ao lado de alguém e vê essa pessoa utilizando um aplicativo similar ao seu (do ponto de vista dos requisitos, of course). Em uma atitude simpática e “desinteressada”, você pergunta ao vivente se ele já ouviu falar em um ótimo app, o Otimix (seu app, naturalmente) e escuta de seu interlocutor a seguinte resposta: “esse app, o Bomix, é bonzinho, resolve o que eu preciso, já sei utilizá-lo, nunca deu bronca e já está instalado. Por qual motivo eu iria mudar de aplicativo?”. Você pensa: “odeio essa pessoa!”.
Cena #3. Para as fazedoras de bolo (serve também para outros profissionais liberais: artesãos, engenheiros, médicos, jornalistas, sites, blogs etc.). Comemoração de final de ano (tá na época), você deseja receber a galera com um bolo de “Morte a 2019” e “Vida longa a 2020”. Criativo! Aí, quem você procura? Perguntando aqui à minha parceira, que adora procurar por estas coisas, ela fala que vai direto ao “Insta”. Chegando lá (ela anda com as pontas dos dedos), busca pelo produto (qualidade da foto, aspectos de “engenharia” do bolo, limpeza e organização dos produtos etc.), encontra a(o) profissional e vai atrás dos comentários. Vê críticas sobre preparo, gosto, formas de pagamento, tempo de entrega etc. E, como muitas vezes acontece, as “confeiteiras” empatam em todos os requisitos. Então, qual profissional escolher? Minha esposa também não soube responder. Vamos ao cara e coroa.
Cena #4. Para donos de escolas. Final de ano, novas matrículas, rematrículas e mudanças de escola. Esta última instância é a única que dói, para a escola, claro. Mas quando você, gestor de escola fundamental, procura saber qual o motivo do check-out do estudante, você vai aos pais, não aos alunos e nem aos docentes. E nesse momento a escola percebe que possui três clientes: aquele que paga, aquele que usa e aquele deveria advogar pela instituição. Aí você começa a pensar: a quem você deveria ter oferecido uma proposta de valor aderente, agradável, engajante, funcional, durante o período letivo, já que o preço médio das escolas não são lá tão diferentes? E não falei do corpo técnico-administrativo para não complicar ainda mais! Clientes diferentes, problemas diferentes, propostas de valor não condizentes!
Cena #5. O primeiro amor. Na adolescência, procurávamos pela menina mais popular, aquela que possuía uma horda de pretendentes. Do ponto vista dela, era uma disputa competitiva. Do meu, disruptiva. Sem chances para mim. A abordagem então não poderia ser a mesma. Teria que fazer algo diferente pra sair daquele oceano vermelho, cheio de tubarões, e levar minha “desejada” a um oceano azul, de modo que pudesse nadar sozinho com ela e mostrá-la o quão fantástico eu era. Me vestir melhor, malhar para apresentar um corpo sarado, usar perfume, tirar boas notas? Tudo isto também estava ao alcance dos outros tubarões. Qual seria o efeito “Jaca na Cabeça” que eu poderia apresentar? Como me tornar visível?
Todas as quatro primeiras cenas, embora comerciais, são análogas à quinta cena. No caso das meninas, “Se todo namorado é igual, porque escolher tanto? Vou pegar aquele ali mesmo, é o jeito!”. Já para os meninos, “Como posso ser escolhido?”. E a resposta, venho aprendendo aos poucos, está no próprio Mercado: os meninos buscam apresentar diferenciais competitivos, quando deveriam promover diferenciais disruptivos. Só estes últimos são enxergados ou ouvidos.
Problema na origem: a diferença entre preço e valor
Voltando ao Mercado, o problema não está aí, na cena final. Ele vem de muito antes, quando você optou por promover uma vantagem competitiva, ao invés de uma vantagem disruptiva. Quando se tem produtos, processos ou serviços (PPS) similares, o preço é o único diferencial. Embora a opinião do cliente seja matadora, a escolha é efêmera e culminará sempre de forma binária: ou esse ou aquele. Você tem de criar diferenciais “matadores” para fazer a escolha pender para você antes de o produto chegar à gôndola.
Uma opção para se sobressair na briga por preço seria aplicar o dumping comercial, a tática predatória de vender abaixo do custo para prejudicar a concorrência. Porém, até que ponto você poderia promovê-lo, sabendo que esta situação artificial teria de ser temporária? Viraria uma briga comunista: todo mundo quereria nivelar por baixo, isso se transformaria numa briga de nanicos, aí viria um gigante e quebraria todo mundo! Exemplo: mercadinho de dona Maria disputando preço com a quitanda de seu João. O Walmart, para atrair seus clientes, como já fez muitas vezes, venderia chuchu a um centavo e atrairia todo mundo para lá! Nem dona Maria, nem seu João.
Um exemplo de onde encontrar os 2,5%.
Uma conhecida, dona de uma loja de acessórios para celulares em Parnamirim, assistia suas vendas minguarem ao mesmo tempo em que via as de seu concorrente, bem próximo, decolarem. Ambas as lojas possuíam mascates (camelôs) à porta. Sabe qual foi a sacada do “cumpadi”? Não usou Canvas, SWOT, inbound, outbound etc., etc., etc., foi mesmo no effectuation, aprendendo no próprio meio. Pois bem, ele estava vendendo seus produtos exatamente para os camelôs. Percebeu quem era seu melhor cliente. Como esse cumpadi conhecia o caminho da importação, estava, inclusive, com encomendas certas para os camelôs. Usando de esperteza, transformou seus concorrentes em distribuidores. Claro que não deixou de vender seu produtos diretamente no balcão, mas diversificou o negócio. Inclusive, quando não podia dar desconto em dado produto, indicava o camelô como um opção. Cartelização, trust? Não tenho como avaliar o mérito legal, já que até mesmo o CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) permite que as grandes façam a mesma coisa. As megafusões de bancos, supermercados, telefônicas etc., atestam isso. O que posso dizer, em meio a essa guerra, é que o nosso “cumpadi” achou sua vantagem disruptiva. Os camelôs continuam na “competitiva”.
Caminhos a seguir
Voltando lá pras cenas, não existe fórmula mágica para você criar uma vantagem disruptiva. Porém, deixo aqui cinco dicas:
Finalizando…
Para as cenas de #1 a #4, tenho certeza que ficou claro que algumas das cinco dicas podem ser aplicadas ao seu modo de pensar o negócio. Para a cena #5 – dirigindo-me aos meninos especificamente – a estratégia, por incrível que pareça, também é uma abordagem de negócio. O garoto deve procurar se aproximar dos pais da garota antes mesmo de se aproximar dela. Preparar o terreno antes. Deve abordar sua cliente indiretamente. Estudar as amigas dela pra entender o que ela gosta e, através delas, procurar saber onde os outros aventureiros erraram antes. Aí você fica pronto pra dar o bote. Prepare o oceano azul sem que ela perceba, aí é só empurrar. Ah, ia esquecendo: malhar, estudar, se perfumar, se vestir bem etc., são obrigatórios. São as ações “normais”. Não falei que estes itens são dispensáveis. A vida é dura, meu filho!
Um 2020 empreendedor e “roxo” para todos nós.
Referência:
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Leia a edição anterior: Colocando uma jaca na cabeça
Gláucio Brandão é gerente executivo da inPACTA, incubadora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
Gláucio Brandão
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