A mudança climática em curso nos adverte que não será fácil contar a história da ciência daqui a 150 anos
A edição comemorativa faz um convite à comunidade científica para olhar para frente − para o futuro. Os editores chamam a atenção dos leitores, por exemplo, para as mudanças mais emocionantes e dramáticas, que serão aquelas que não podemos imaginar hoje. E advertem: prever o futuro é notoriamente difícil. Eles reforçam essa ideia ao citar o escritor William Gibson, que em seu romance Neuromancer de 1984, previu uma forma de terapia com células-tronco e até uma sofisticada inteligência artificial, mas não conseguiu prever os telefones celulares. E citam outro exemplo: o das publicações eletrônicas, que mesmo no início dos anos 90 poucas pessoas foram capazes de prever, e muito menos que elas colocariam em risco o futuro dos periódicos impressos.
Novos tempos? Certamente. O futuro para as cientistas, por exemplo, mostra-se bem diferente do passado, quando estas heroínas encontravam ambientes extremamente hostis e fechados, fosse em jornais, em universidades, na sociedade e nos lares. A própria revisão por pares – uma espécie de pedra fundamental da publicação científica − introduzida na Nature somente depois de 1966, hoje tem diante de si novas tendências, novos desafios. Vide o caso dos preprints.
E o que dizer das novas fronteiras colaborativas? À medida que as fronteiras entre as disciplinas se relevam e a pesquisa se torna cada vez mais multi e transdisciplinar, as ciências naturais abraçam cada vez mais as ciências sociais, por exemplo.
Por outro lado, é preciso questionar as invenções que “mudam o mundo”. Muitas dessas tecnologias, como o motor de combustão interna e os agroquímicos sintéticos, por exemplo, melhoraram a qualidade de vida de centenas de milhões de pessoas; mas, ao mesmo tempo, também danificaram o meio ambiente e levantaram sérias preocupações éticas e de segurança. É urgente, portanto, reconhecer e implementar a responsabilidade da comunidade científica perante a sociedade.
150 anos depois, a natureza é a mesma de antes? Quem será afetado pelos produtos da pesquisa e da tecnologia? São duas perguntas retóricas muito interessantes dos editores aos leitores.
A mudança climática em curso no planeta Terra acionou o alerta vermelho de uma forma nunca antes vista; nunca antes tínhamos nos deparado com um desafio tão iminente. Tamanho é o desafio que não apenas a geração atual, mas a futura, isto é, a que ainda está por vir, já tem diante de si um desafio hercúleo.
Talvez o grande desafio do século XXI seja subir nos ombros do gigante, ou melhor, da gigante mãe Terra e não deixá-la sucumbir.
Referências:
Nature at 150: evidence in pursuit of truth. Nature 575, 7-8 (2019). doi: 10.1038/d41586-019-03304-x
Daily briefing: 150 years of research and discovery
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Leia o texto anterior: Os 150 anos da revista Nature: o passado (parte 2)
Thiago Jucá é biólogo, doutor em Bioquímica de Plantas e empregado da Petrobrás.
Thiago Jucá
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