A Transformação Digital já é uma realidade galopante e esmagadora. Sendo curto e grosso: promova-a ou morra!
Vamos a alguns dados que coletei visitando na semana passada (01.08.2019) a fábrica de automóveis mais moderna do mundo: The Jeep Factory (em inglês para dar um toque global), no município de Goiana-PE. A planta de lá possui 13.600 colaboradores. Entrega 1000 carros por dia. Se fizermos um cálculo bem “simplesinho”, podemos dizer que em 13 dias, 14 horas e 24 minutos, a fábrica expulsa de seus “fornos” 13.600 veículos, entre Renegade, Compass e Fiat Toro. Para simplificar, admitindo lunch, coffee e “pipi” breaks, vou arredondar esse tempo para 14 dias, ou 14d.
Qual o por quê deste cálculo curioso, GBB-San? E a resposta: posso dizer que, em termos da persona-colaborador, uma única pessoa da fábrica consegue montar um Jeep em 14d. É mole? Se eu te desse um rolo de aço, alguns peças, pneus, tinta etc., você fabricaria um Renegade World Class Manufacturing (WCM, Manufatura de Classe Mundial), como eles dizem lá na Jeep, em duas semanas, ou 26 carros bacanas em um ano??? Impossible, Gafanhoto! Ou seja: escala possibilitada pela automação Lean!
E não é só isso: a Jeep, na verdade, são 16 fábricas, formando um complexo e magnífico supply chain de parcerias. Quer um pneu, a Pirelli faz para você, bem ali, no seu quintal. Precisa de um bico injetor? Sem bronca: a Magneti Marelli te manda daqui a pouco! Tudo de forma sincronizada. A linha produz os três tipos de carros aleatoriamente. Quer mudar a cor: 3 segundos são suficientes para limpeza dos bicos aspersores e troca da tinta, que na verdade é um pó por adesão eletrostática, cujo resíduo ao final da pintura é zero! Todos os carros produzidos na Jeep já estão vendidos: “Just in Time, Just in Sequence”, foi o canto da sereia que o assessor de comunicação, Mister Manuel, um boy de 20 e poucos anos, fez bater em nossos ouvidos. Cooperação, brother!
Tudo acontecendo em um interior de Pernambuco, onde só se produzia cana-de-açúcar. Na verdade, eles fizeram um trabalho de reflorestamento tão supimpa que praticamente triplicaram a quantidade de plantas nativas que encontraram quando lá chegaram, que quase já haviam sido dizimadas pelo plantio da própria cana. E as pessoas? Gente que trabalhava na lida canavieira, semi-analfabeta, sendo convertida em operários, gerentes de linha, colaboradores em diversas funções em um período de 2 anos. Mais de 50% do pessoal da planta era das redondezas. 95% do próprio estado. Estão desenhando uma outra supply chain ali pertinho, em Igarassu. A meta é ter perto de 80% de todas as peças de cada modelo do carro produzidas em solo pernambucano. Escrevi PRODUZIDAS, não apenas montadas.
Juntando tudo: pessoas + processos + inovação + automação + cooperação + meio ambiente dá o que eu chamo de Transformação Digital. Alguns apelidam de Industrialização 4.0. Nota: não quis colocar nenhum item que lembrasse política para não enfeiar a frase, mas deve ter havido algum tipo de colaboração, ou não atrapalhamento!
Entenderam que estamos – RN e boa parte do Brasil – muito ruins na fita, enquanto não acionarmos a mentalidade para promoção da transição de analógico para digital, não aprimorarmos os processos, não capacitarmos apropriadamente as pessoas e não cooperarmos entre nós? Estaremos, como diz o ditado, “em briga de anões”. Aí, o gigante vem e, de uma pisada só, nos manda pro caixão!
Sei que a Transformação Digital, vou abreviá-la por TD, não acontecerá fácil, principalmente se não colocarmos as esferas “ponto COM”, “ponto EDU” e “ponto GOV” pra girarem em hélice.
Caminhos
Nesta aula condensada de número 54, proponho caminhos de teste para as empresas. Sugiro dois. Em primeira instância, a criação de um centrinho, pequenininho, de baixíssimo custo, que trate a inovação da empresa. Vou chamá-lo de Laboratório de Inovação.
Tá a fim não? O caminho number two vai na linha de uma associação com um centro de inovação que ajude sua empresa a trabalhar a transformação digital de forma profissional, não puramente acadêmica. Pessoas que gostem muito da Ciência como uma unfair adavantage, aquela vantagem que eu falo em Modelo de Negócio versus Modelo de Ideia, que estejam sempre atentas ao Mercado, pensem como startups, não primem por fazer estoque de patentes e não sejam orientadas a artigos. Afinal, papel já produzimos demais e isso não é ambientalmente correto!
Uma ou outra aposta vai, minimamente, despertar uma cultura latente, premente e imprescindível em sua empresa: a de que a mudança é inevitável! Promovê-la de modo proativo vai custar menos e possibilitar melhores retornos do que agir de modo reativo. Nesse segundo caso, a queda de seu negócio será irreversível!
Assim, inspirado pela Jeep, mando aqui alguns recadinhos. Vocês podem ignorá-los, mas eles não vão ignorar você.
Recadinho #1. Imagine sua empresa com um laboratório de inovação…
O que o Google, Facebook, Tesla, Apple, CESAR têm em comum? Incríveis laboratórios de inovação. Vários nomes: aceleradoras, incubadoras, centros de pesquisa, fablab, CesarLabs etc., e várias empresas, inclusive aqui no RN, estão criando os seus. Mais da metade das empresas de serviços financeiros criaram seus próprios espaços criativos. A Montenegro Contabilidade & Associados, de um brother nosso, é uma delas. Parece até a sede da Google, em uma menor escala.
O problema, porém, reside no fato de estas unidades de algumas inovação não possuírem uma estratégia clara alinhada com a das empresas, o que provoca um descompasso em relação ao Mercado, porque as idéias desses laboratórios estão desconectadas das necessidades reais do cliente, uma vez que faltam cabeças criativas, mais com o pé no chão, capazes de levar as idéias do seu nascedouro até a implementação. Promovem, portanto, para aqueles que apostaram nessas unidades, frustração e o sentimento de investimento perdido. Ou a perda do emprego!
Recadinho #2. É necessário um plano de inovação
Deve-se pensar nas implicações de tocar a inovação. Decidir como ela impulsionará o que já existe ou “matará” negócios já prospectados. É difícil, para a nossa cultura convencional, determinar como novas ideias serão executadas. Isso começa com algumas considerações. Uma delas é a de que 75% das maiores empresas do mundo do ano de 2030 ainda não nasceram. Você deseja estar entre elas ou apenas admirando-as?
Recadinho #3. Simule ou deixe alguém simular sua ideia: Virtual Twin!
O que acontece quando uma ideia é validada e precisa continuar crescendo fora daquele ambiente empresarial? Para onde vai a ideia sem apoio? As opções podem incluir voltar ao negócio principal ou ir a um laboratório da própria empresa ou um de “aluguel”. Inovações potencialmente disruptivas podem ir para algum lugar fora da organização central, onde podem ser mais desenvolvidas e, ao mesmo tempo, protegidas de todas as intempéries inerentes ao meio corporativo. Nesse caso, quando a empresa está receosa de investir mais na ideia por falta de time, estrutura ou cultura organizacional, pode-se propor o amadurecimento dela em um centro disposto a isto. Um centro de inovação profissional poderia tocar a ideia criando spin-offs a partir de virtual twins. Jogue sua proposta para alguém trabalhar. Você poderá, além de ver o circo pegar fogo, treinar um bocado de gente que está neste momento ocioso, como por exemplo em dezenas de universidades que conheço!
Recadinho #4. Inovação é densidade, é movimento. Se dá pelo choque de ideias entre pessoas!
Grande estruturas ociosos facilitam a dispersão, dificultando a interação! Tudo começa e termina por pessoas. Seu laboratório de inovação deverá apoiar os intraempreendedores, deixando-os livres para fazer o trabalho árduo de apresentar novas ideias e executá-las na empresa? Como o laboratório facilitará conexões próximas com os usuários finais ou clientes para os quais essas ideias resolverão um problema? As pessoas, juntamente com suas paixões e propósitos, estão no centro das iniciativas de inovação de maior sucesso? Dê poder às pontas, como disse a Head RH da SambaTech, em uma referência à atitude da empresa de ouvir até o mais novo estagiário, o ASG etc.
Recadinho #5. Meu reino por números
A inovação precisa ser impulsionada por muito mais do que sonhos, café ou artigos científicos. Executivos precisam de balizamento. Laboratórios de inovação que não têm ou não conseguem gerenciar as métricas são configurados para falhar. Dêem uma olhadinha em Métricas: meu reino por números e em Inovação: conceito que a Universidade não compreendeu ainda e vejam alguns balizadores. As empresas e as universidades devem acordar para o fato de que a inovação tem de ser mensurada todo o tempo.
Já se perguntou: Qual são as métricas de sua empresa? Você pretende melhorá-las? Quem são seus concorrentes? Poderiam se tornar parceiros? Quanto cada colaborador seu é capaz de entregar?
Recadinho #6. Nada do grande comer o menor. Agora o mais rápido come o mais lento!
Já viram no Discovery Channel quem ganha aquela briga entre o boi e a piranha, né não?
O lugar da criatividade está em toda parte. Os laboratórios de inovação são úteis porque podem fornecer treinamento, redes e outros recursos para ajudar os empreendedores a obter sucesso – independentemente de onde eles trabalham na empresa. E, idealmente, deve haver células de inovação (geralmente dirigidas por esses intraempreendedores) em toda a organização. É assim que mudanças reais começam a ocorrer, alterando o DNA cultural da empresa para tornar todo o negócio mais parecido com um laboratório de inovação.
Não estão convencidos de que precisam de uma laboratório de inovação? Ok, então comecem a ter medo daqueles bandos de garotos e garotas brincando em suas garagens! Eles são os rápidos de que eu falo. Estarão sempre arriscando e vão, com toda certeza, ganhar em qualquer momento, pois não têm nada a perder! A história tecnológica recente está cheia de exemplos. Não vou citá-los.
Fechando…
A Jeep não teve medo de inovar no Brasil. Hoje é uma fábrica de nível mundial e abastece toda América Latina.
Pegando um gancho nas palavras de Abraham Lincoln, trocando “Educação” por ‘Transformação Digital-TD” e Lincoln por GBB-San:
“ Mas GBB-San, a TD é muita cara. Experimente então a não-TD, Gafanhoto”.
Boa TD para vocês! Aos que não apostarem nela, Boa Sorte!
Referência
A coluna Empreendedorismo Inovador é atualizada às quartas-feiras. Gostou da coluna? Do assunto? Quer sugerir algum tema? Queremos saber sua opinião. Estamos no Facebook (nossaciencia), Twitter (nossaciencia), Instagram (nossaciencia) e temos email (redacao@nossaciencia.com.br). Use a hashtag #EmpreendedorismoInovador.
Leia a edição anterior: Para o que você não foi formado?
Gláucio Brandão é gerente executivo da inPACTA, incubadora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Gláucio Brandão
Bom dia!
Excelente artigo sobre uma experiência incrível que tivemos. Parabéns por ter conseguido expressar a pulsação em alta velocidade que a inovação corre naquele estado (PE). Fica em nós o sentimento que estamos muito distantes dessa realidade que iniciou com um projeto há 20 anos atrás. Eles caminharam 20 anos, e como está proposto à mesa, estão dispostos a partilhar essa realidade para não precisarmos de 20 anos para implementar e mensurar o resultado aqui no RN. Afinal, PE é um verdadeiro laboratório de inovação e tecnologia.
À nós cabe um: mãos à obra, já!!!
Saudações, minha cara companheira de viagem!
Seu relato foi preciso. Se conseguirmos aceitar esse exemplo e avançarmos na maturidade, andaremos muito mais rápido e sofremos menos.
Grande abraço.