Queria ser professora de Química e ganhou prêmio nacional como pesquisadora Entrevistas

quarta-feira, 21 setembro 2016

Elisama Santos propôs nova fonte energética para método de descontaminação de solos e foi laureada no programa Para Mulheres na Ciência

O Perfil do Pesquisador dessa semana foge um pouco à regra das matérias já publicadas. Com apenas 29 anos de idade, a química Elisama Vieira dos Santos é recém contratada da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como professora da Escola de Ciências e Tecnologia.

Apesar da curta carreira, Elisama foi a única pesquisadora, que atua em instituição sediada no nordeste laureada no prêmio Para Mulheres na Ciência (PMC) com o trabalho Descontaminação de solos contaminados com pesticidas e metais pesados por remediação eletrocinética acoplados aos processos oxidativos avançados. Na área de Química foi a única brasileira premiada. O PMC é uma iniciativa da L’Oréal Brasil em parceria com a Unesco e a Academia Brasileira de Ciências (ABC), é voltado para mulheres cientistas e é destinado a sete pesquisadoras. O Programa, que está completando 11 anos no Brasil e 18 no mundo, tem como motivação a transformação do panorama da Ciência, favorecendo o equilíbrio dos gêneros no cenário brasileiro e global, incentivando a entrada de mulheres no universo científico.

Licenciatura

Quando optou pela Química como área de atuação, a pesquisadora não tinha a Ciência como meta. Seu objetivo era seguir a carreira dos pais e ser professora, por isso escolheu a licenciatura. Mas já na graduação, por volta do 5° período, despertou o gosto pela pesquisa: “quando eu entrei na Universidade e tive a oportunidade de ver o mundo da Iniciação Científica, eu fui me apaixonando pela pesquisa”, revela. A oportunidade de que fala foi o estágio no Laboratório de Métodos Analíticos e Meio Ambiente, da UFRN, sob a supervisão da professora Nedja Suely Fernandes, já no enfoque ambiental. Terminada a licenciatura, a pesquisadora decidiu reingressar, desta vez para fazer Bacharelado. O Mestrado e o Doutorado foram os passos seguintes.

A contaminação de solos é uma realidade em muitos lugares e os agentes promotores da contaminação têm origens diversas. A tese de Doutorado em Química da professora Elisama, defendida em 2015, na UFRN, teve como finalidade a aplicação de tratamentos eletroquímicos para a descontaminação de solos e águas por vazamento de derivados de petróleo. O problema a ser resolvido era a adequação dos postos de combustíveis de Natal/RN às normas de segurança ambiental. A remediação de pesticidas em solo foi uma contribuição dos estudos que ela fez na Espanha em conjunto com os professores do Laboratório de Engenharia Eletroquímica Ambiental, da Universidade de Castilla-La Mancha, sob a orientação do professor Manuel Andres Rodrigo. Para o PMC, Elisama agregou a possibilidade da descontaminação por metais pesados. A professora explica a escolha: “Ao escrever o projeto, pensamos em metais pesados, porque nós vivenciamos um acidente ambiental no ano passado em Minas Gerais, e até hoje nós não temos ideia da dimensão e do quanto vai nos afetar.” A referência é o rompimento da barragem da mineradora Samarco, em Mariana/MG, em novembro de 2015.

Eletrocinética

Com o uso em escala pré-piloto já estabelecido e estudado em centros da Holanda, Estados Unidos e Espanha, a remediação eletrocinética, ou seja o uso da tecnologia eletroquímica é uma entre várias para descontaminação de solos. O funcionamento é descrito pela pesquisadora: “Durante a aplicação da tecnologia, nós necessitamos de distintos materiais eletrocatalíticos empregados como eletrodos (placas), e esses eletrodos poderão estar diretamente acoplados no solo ou em repartições que contenham líquido. Eles são conectados e alimentados por meio de uma fonte de energia elétrica, então corrente é passada entre os eletrodos. Na remediação de solos é aplicado corrente, favorecendo que os contaminantes sejam mobilizados na forma de espécies carregadas ou partículas. A corrente aplicada mobiliza as espécies carregadas eletricamente, partículas ou íons no solo.”

A grande contribuição da professora Elisama, que lhe garantiu o prêmio, foi o acoplamento da energia renovável a essa tecnologia, que tem o gasto energético de energia elétrica como fator limitante. O trabalho laureado no PMC propõe como objetivo secundário, a utilização integrada de fontes de energias renováveis, tornando o processo mais econômico. “No nosso estado a produção de energia renovável tanto eólica, quanto solar vem crescendo. A remediação eletrocinética tem um consumo de energia alto, porque ela não ocorre do dia para a noite. O solo terá que estar conectado com os eletrodos por muitos dias e nesses eletrodos estará passando corrente diariamente”, justifica.

Antes mesmo de concluir o Doutorado, a química já tinha interesse em concorrer ao prêmio da Unesco, mas entre os requisitos de participação está o de ter o título de doutora há pelo menos cinco anos e estar no exercício da docência. Ao ser contratada na UFRN, a professora buscou financiamento para dar andamento à pesquisa. “Como eu não tinha recurso financeiro para dar continuidade na pesquisa, fui buscando meios de conseguir verba e me interessei pelo PMC. Além do incentivo a nós mulheres, tem o apoio financeiro para dar continuidade na pesquisa, para que meus alunos também fiquem entusiasmados”, garantiu, a pesquisadora ao afirmar que os recursos do prêmio no valor de R$ 50 mil serão integralmente investidos na pesquisa de remediação ambiental.

Financiamento

Assim como pesquisadores com carreiras já consolidadas, Elisama aponta o financiamento ou a falta dele como o principal problema enfrentado para se fazer Ciência no Brasil. Acrescentou, entretanto, que apesar dos poucos recursos, existem bons trabalhos no nordeste. “Principalmente para a nossa região nordeste, então temos praticamente que fazer malabarismo para fazermos bons trabalhos, para atuar na pesquisa. Mas ainda assim, na UFRN temos diversos tipos de pesquisa que são reconhecidos nacionalmente.” Na opinião da vencedora, iniciativas como a da L’Oreal, em patrocinar o prêmio, podem estimular a outras empresas a também investirem em pesquisa contribuindo para que os pesquisadores desenvolvam soluções para os problemas da sociedade.

“Nós dependemos dos alunos para fazer pesquisa, nós professores não atuamos sozinhos.” O desabafo da professora se justifica pelo que ela afirma “estar de mãos atadas” em relação a recursos humanos. “Temos um conjunto de professores que colaboramos uns com os outros, mas ao mesmo tempo são necessárias bolsas para alunos de Iniciação Científica, Mestrado e Doutorado.” O prêmio, na opinião da professora Elisama, vai levar os alunos a ficarem mais atentos, a compreenderem que é possível se fazer boas pesquisas no nordeste e que eles podem fazer bons trabalhos e terem trabalhos premiados.

A cerimônia de premiação será no dia 20 de outubro, no Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro/RJ.

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