A contaminação dos ambientes aquáticos com antibióticos tem implicações potenciais e preocupantes na saúde pública acerca da crescente resistência bacteriana
“(….) Os microorganismos resistentes são os novos assassinos em série. Mais de 33.000 europeus morrem por ano em decorrência desse fato. Um impacto maior que o da AIDS, tuberculose e gripe. Em quase metade dos casos (39%), as bactérias letais eram imunes aos antibióticos mais recentes. Por outro lado, se não forem criados novos antibióticos, as pessoas morrerão aos 50 ou 60 anos, como antes”. Quem faz esse alerta é a cientista Ada Yonath, ganhadora do Prêmio Nobel de Química em 2009, em entrevista concedida ao El País no final de maio desse ano.
Esse alerta pode soar como exagero, contudo descobertas recentes reveladas por pesquisadores da Universidade de York, no Reino Unido, durante a reunião anual da Sociedade de Toxicologia e Química Ambiental (SETAC), em Helsinque, mostram que o problema parece ser mais sério do que se imagina. Os pesquisadores procuraram 14 antibióticos comumente utilizados em rios de 72 países, o que totalizou 711 locais distribuídos nos seis continentes. Os resultados revelaram que esses antibióticos foram detectados em 65% dos locais testados. O antibiótico metronidazol, por exemplo, que é usado para tratar infecções bacterianas, incluindo infecções de pele e boca, excedeu os níveis de segurança pela maior margem, com concentrações 300 vezes maior do que o nível “seguro” em um local em Bangladesh.
Esse estudo pioneiro e de escala global mostrou ainda que o antibiótico trimetoprim, que é utilizado no tratamento de infecções do trato urinário, foi encontrado em 307 dos 711 locais testados. Esses resultados mostram, na verdade, que a contaminação dos ambientes aquáticos com antibióticos tem implicações potenciais e preocupantes na saúde pública acerca da crescente resistência das bactérias aos antibióticos, o que acende um alerta de sinal vermelho tanto na comunidade científica quanto nos formuladores de políticas públicas.
O artigo de notícias publicado na prestigiada revista americana Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS) e intitulado, em tradução livre, de “Interessado em avaliar a saúde de uma população? Olhe para o esgoto”, cai como uma luva para a questão da contaminação dos ambientes naturais, tanto para os antibióticos quanto para as mais diversas substâncias químicas, o que inclui as drogas. Segundo o autor, John Carey, o exemplo mais emblemático vem do Canadá. Querendo avaliar a dimensão do uso da maconha por cidadãos canadenses após sua legalização para fins recreativos, ocorrida em outubro de 2018, o governo se voltou para uma fonte de dados rica, embora muitas vezes pouco apreciada − o esgoto.
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Thiago Jucá é biólogo, doutor em Bioquímica de Plantas e empregado da Petrobrás.
Thiago Jucá
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