O crescimento da pobreza no Brasil Artigos

segunda-feira, 29 abril 2019
A ampliação da pobreza e o aumento da pobreza extrema foram agravados pelos cortes de programas sociais e pela piora da atividade econômica.

Indicadores apontam crescimento da pobreza e aumento da desigualdade e também que as piores condições são para pretos, pardos e mulheres

Por Homero de Oliveira Costa

No dia 5 de dezembro de 2018, foi divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), dados que indicam o crescimento da pobreza e da extrema pobreza no país entre 2016 e 2017. A base desse estudo são as informações da pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) (Síntese dos Indicadores Sociais).

Conforme os índices do Banco Mundial, a linha de pobreza equivale a menos de um terço da renda média da população, considerando o rendimento médio mensal domiciliar per capita. Nos seus parâmetros, seguidos pelo IBGE, são pobres as pessoas com renda domiciliar inferior a R$ 406,00 por mês e R$ 140,00 para os considerados de pobreza extrema.

Em 2017, em termos numéricos, eram 54,8 milhões as pessoas que estavam na faixa de pobreza. Em 2016 eram 52,8 milhões, um acréscimo de 2 milhões e a pobreza extrema passou de 13,8 milhões para 15,2 milhões.

Os dados também mostram que há diferenças e desigualdades regionais. No Nordeste, 44,8% dos 57 milhões de habitantes estão abaixo da linha de pobreza. São 25,6 milhões vivendo com menos de R$ 406 mensais. A Região é a que apresenta a maior desigualdade na qual os 10% mais ricos ganhavam cerca de 20,6 vezes mais que os 40% mais pobres.

Esses índices se relacionam com a trajetória negativa tanto da renda quanto do emprego e não tem relação direta com o PIB (Produto Interno Bruto). Ele pode aumentar como ocorreu em 2017 (1,0% na primeira alta após dois anos consecutivos de retração: em 2016 e 2015, o PIB recuou 3,5% sobre o ano anterior), no entanto esse pequeno aumento não significou redução da pobreza.

Como diz Marcio Pochmann, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), é necessário analisar o que levou ao crescimento do PIB para que se entenda o aumento da pobreza. Para ele “Essa evolução resultou de uma expansão de 13% da agropecuária, um setor com pouco impacto no emprego e renda. A indústria não cresceu, e os serviços variaram 0,3%. Comparativamente, tivemos uma redução do crédito nesse período, que é fundamental para qualquer recuperação econômica e expansão”.

O relatório se refere a quatro tipos do que chama de inadequações. São elas a domiciliar, as características físicas, as condições de ocupação e acessos a serviços e a presença de bens no domicílio. Os dados mostram que em 2017, cerca de 27 milhões de pessoas, viviam em domicílios com pelo menos uma das quatro inadequações. A inadequação domiciliar foi a que atingiu o maior número de pessoas: 12,2 milhões. Isso significa o que é considerado como “adensamento excessivo”, ou seja, quando há residência com mais de três moradores por dormitório.

A pesquisa revela o que já se sabia existir: um país profundamente desigual seja por diferentes regiões, por gênero – as mulheres ganham bem menos que os homens mesmo exercendo as mesmas funções – por raça e cor: os trabalhadores pretos ou pardos respondem pelo maior número de desempregados, têm menor escolaridade, ganham menos, moram mal e começam a trabalhar (quando existe trabalho) mais cedo.

Na média nacional, os mais ricos chegam a receber 17,6 vezes mais que os mais pobres.

Em relação à concentração de renda, o levantamento divulgado no dia 5 de dezembro de 2018 pelo IBGE evidencia o quanto permanece desigual a distribuição de renda no Brasil. Na média nacional, os mais ricos chegam a receber 17,6 vezes mais que os mais pobres.  Esses dados não só confirmam que o Brasil é um dos países mais desiguais do mundo – o que pesquisas anteriores já indicavam– mas também mostram o alto grau de concentração de renda.

A precariedade no mercado de trabalho faz a concentração de renda se aprofundar. No quarto trimestre de 2018, a desigualdade, quando observada à renda domiciliar per capita, atingiu o maior patamar desde 2012, segundo levantamento do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV).

Segundo a pesquisa, em 2018 o país registrou 4,73 milhões de pessoas que haviam deixado de procurar emprego por achar que não conseguiriam: 13,4% a mais que em 2017, quando havia 4,17 milhões. Destes, 2,86 milhões eram do Nordeste, sendo os dois maiores a Bahia, com 820 mil e Maranhão, com 492 mil pessoas.

Às vésperas do Fórum Econômico Mundial, realizado em Davos, Suíça, em janeiro de 2018 a Oxfam (“uma confederação de 19 organizações e mais de 3000 parceiros, que atua em mais de 90 países na busca de soluções para o problema da pobreza, desigualdade e da injustiça, por meio de campanhas, programas de desenvolvimento e ações emergenciais”) publicou um relatório no qual, em relação ao Brasil, afirma-se que “a distribuição de renda estagnou, a pobreza voltou com força e a equiparação de renda entre homens e mulheres, e negros e brancos, que vinha acontecendo ainda que timidamente, recuou. São retrocessos inaceitáveis para um país cuja maioria é justamente de pobres, negros e mulheres. E essas desigualdades de renda, raça e gênero são reforçadas – e retroalimentadas – por nosso injusto sistema tributário, que cobra mais justamente de quem menos tem. Isso não pode continuar”

Segundo o relatório (Bem público ou riqueza privada?) no Brasil, 42 bilionários tinham uma riqueza total de US$ de 176,4 bilhões em 2018.

A lacuna entre ricos e pobres é gigantesca. Apenas cinco bilionários brasileiros possuem, juntos, o mesmo patrimônio que a metade da população mais pobre do país.

Outro relatório (Terra, Poder e Desigualdade na América Latina) afirma que 45% de toda a área rural do país estão nas mãos de menos de 1% da população “Apesar disso, mesmo sem acesso a recursos e a créditos no campo – que mais uma vez ficam nas mãos desse 1% – os pequenos produtores são responsáveis por produzir mais de 70% dos alimentos de todo o país”.

Há também diferenças de renda entre brancos, negros e pardos. Os dados do IBGE revelaram que entre as pessoas que estão na faixa com 10% de menores rendimentos, a parcela da população de pretos ou pardos chega a 78,5%, contra 20,8% de brancos. No outro extremo, dos 10% com maiores rendimentos, pretos ou pardos respondiam por apenas 24,8%.

Em termos de taxas de desocupação, as da população preta ou parda foram superiores às da população branca em todos os níveis de instrução e em todas as faixas.

A precariedade no mercado de trabalho faz a concentração de renda se aprofundar.

Em 2019, a taxa de desemprego no Brasil aumentou para 12% no trimestre móvel encerrado em janeiro, atingindo 12,7 milhões de pessoas, segundo dados divulgados do IBGE. Trata-se do maior número de desocupados desde agosto de 2018.
Há diversos fatores explicativos, mas há uma clara relação quanto à expansão do emprego e extensão do acesso a postos de trabalho para garantir renda. Ela pode ser atenuada ou erradicada com políticas de investimentos em infra-estrutura, como ocorreu entre 2000 e 2010, quando houve uma diminuição da pobreza no país principalmente nas áreas rurais e nas regiões Norte e Nordeste.

Nesse sentido, um aspecto que certamente contribuiu para ampliar a pobreza e o aumento da pobreza extrema foram os cortes de programas sociais e a piora da atividade econômica e com isso a tendência é o crescimento do desemprego, e como conseqüência, menor renda, crescimento da pobreza e da pobreza extrema, mantidos os níveis de desigualdades e concentração de renda e riqueza.

Como diz o relatório da Oxfan “Não tem que ser assim. A desigualdade não é inevitável. Nenhuma lei da ciência econômica diz que os mais ricos devem ficar cada vez mais ricos enquanto as pessoas em situação de pobreza morrem por falta de remédios. Não faz sentido haver tanta riqueza em tão poucas mãos, quando esses recursos poderiam ser usados para ajudar toda a humanidade. A desigualdade é uma escolha em termos de política e de políticas”.

Referências

https://www.oxfam.org.br/tags/concentracao-de-renda.

https://www.oxfam.org.br/sites/default/files/publicacoes/2019_bem_publico_ou_riqueza_privada_pt-br.pdf

Homero de Oliveira Costa é Professor Titular (Ciência Política) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

Leia outro artigo do mesmo autor:

O povo contra a democracia

Homero de Oliveira Costa

Os comentários estão desativados.

Site desenvolvido pela Interativa Digital