Embora imprescindível, a TI, Tecnologia da Informação, não é tudo! Disruptiva

quarta-feira, 24 abril 2019

O professor Gláucio Brandão nos apresenta a TechnoCommodity: conceito, atributos e aplicações

Nessa Aula Condensada de nº 39 (obrigado Prof. Severo pelo termo!), convido os leitores a uma reflexão sobre uma das principais ferramentas que trouxeram o Mundo ao patamar evolutivo em que se encontra hoje: a Tecnologia da Informação e das Comunicações, ou simplesmente TIC! A principal é o Algoritmo! Como assim? Explico ao longo deste texto longo!

Em nosso contexto, e de modo amplo, a TIC será utilizada para indicar toda a tecnologia que envolva hardware e software, massa ou energia (coloquei estas duas últimas palavras pra dar um ar mais científico, mais charmoso) usados para processar, armazenar e transportar informação em forma digital! Utilizarei, ao invés de TIC, seu apelido mais popular, TI.

Dou o pontapé inicial à reflexão sobre TI com a seguinte, e não muito simpática, sentença:

Traga-me uma ideia, e encontro um(a) desenvolvedor(a) pra fazer a ideia andar por conta própria. Traga-me um(a) desenvolvedora(a), e não saberei o que fazer com ele(a)”. (Gláucio-San, MMXIX)

Vou cortar os “(a)” de todo o texto para não ficar enfadonho. Daqui pra frente, assumam que tudo se aplica a todos os gêneros.

Meu “testemunho” vai ancorado em uma experiência de mais de 30 anos programando em assembly. Para quem não entende o que essa palavra significa, o Mundo foi construído em linguagem assembly; depois veio a C e sua irmã vitaminada, a linguagem C++, chegada a objetos. Minha capacidade de programação parou aqui. Na sequência, a cosmopolita tomadora de café que anda em qualquer terra, a Java. A coisa emborcou para a WEB e fez nascer a dinâmica PHP e a Ruby, seguidora de scripts, finalizando na linguagem universal atualmente mais aceita: o Facebook!

Olhando para trás, penso hoje na TI como a extensão de uma ideia, como seu complemento. Pode ser enquadrada como uma grande ferramenta de presente e futuro, mas não o próprio futuro em si… e nem o presente. Aqui que a confusão começa.

Hoje TI não é mais inovação, não é fim, porém um meio de se chegar a ela. Uma Commodity – explicarei mais adiante. Tenha uma ideia, tenha um tema, e conseguiremos “arranjar” recursos em um ecossistema para dar corpo a ela. Tenha apenas desenvolvedores, os famosos e raros DEV, e tenha somente mão de obra custosa e qualificada. Necessária, claro, mas se não tiver um rumo orientado à inovação, tornar-se-ão desenvolvedores de serviço, centros de TI sem temas, sem estratégias, apenas locais especializados em ferramentas. Sem propósito definido que guie estes centros, tenderão a se transformar em estruturas a-temáticas (Esse termo existe?). E, como qualquer empreendedor aqui sabe, todo planejamento estratégico é guiado pela missão do negócio. Sem ela, a sustentabilidade passa a ser a coisa mais perecível.

Ideias, algoritmos, linhas de código e programação

Diferentemente do que se pensa, todos sabemos desenvolver algoritmos. Pegando o conceito na WEB, conceito o qual atesto, dada à minha cátedra inicial na carreira do magistério e pelos quatro anos seguintes, pode-se confiar:

“Conjunto das regras e procedimentos lógicos perfeitamente definidos que levam à solução de um problema em um número finito de etapas” (Dicionário online)

Assim, todos nós temos condições de “algoritmizar”, de criar receitas. Dado um problema qualquer, o algoritmo é a resposta natural a ele. Exemplo: crie o algoritmo [Escovar os Dentes]!

Algoritmo Escovar Dentes. Fonte: eu mesmo, todos os dias, por volta das 5h00.

De uma forma muito parecida, a jovem cientista e engenheira elétrica Katie Bouman, desenvolveu o algoritmo (repetindo, a-l-g-o-r-i-t-m-o) capaz de “tirar” uma foto de um buraco negro, 100 anos depois do cientista Albert Einstein, que não programava nem sabia o que era TI, ter previsto sua aparência. (Por questões de espaço, e somente por isto, não vou fazer aqui o algoritmo de minha colega!). As linguagens de programação que a Cientista Katie Bouman utilizou não diferem das que utilizamos em problemas físico-matemático aqui na UFRN. Podem perguntar ao professor Marcelo Nogueira (ECT-UFRN), que tem uma formação muito parecida com a dela!

Traduzir o algoritmo [Escovar os Dentes] em linha de código é o que chamamos de codificação ou programação. Acreditem em mim: não é difícil! Pode ser feita em qualquer linguagem das que citei no começo do texto. Já existem ambientes que aceitam codificação por voz e até conversam com você. O Cloudia é um exemplo. Em breve, os programadores serão uma classe extinta. Ou seja: quem conseguir pensar vai conseguir programar. Simples assim!

Katie Bouman: aos 29 anos, ela liderou uma equipe de 200 cientistas (MIT/Divulgação)

A sequência é então essa:

Problema – Ideia – Algoritmo – Codificação – Programa (ou App)

E aí faço o link com o título: a codificação vem depois do algoritmo! Portanto, quem liga a ferramenta à ideia, ao tema, é o algoritmo. Não faz sentido programar se não há um algoritmo, produto de um pensamento, de uma ideia, de um propósito. Um programa (App) sem algoritmo é a-temático (não achei esse termo ainda na Internet!). Levado esse pensamento à grande estrutura, desenvolver centros especializados puramente em TI não garantirá sustentabilidade. Exemplos não nos faltam. Vamos pegar um vizinho. O Porto Digital (Recife) começou como um parque tecnológico em TIC e ampliou para a Economia Criativa (EC). Fazia sentido no começo, pois havia uma demanda reprimida. Assim que começou a perder “sustância” implementou o Portomídia que, ao ser “exportado” também para Caruaru e Petrolina mudaram em menos de cinco anos ambas realidades locais. Em Caruaru ganhou o nome de Armazém da Criatividade transformando minha cidadizinha (emoção!) no 2º maior polo de EC de Pernambuco, perdendo apenas para o próprio inenarrável Recife.

O Vale do Silício já começou criativo: as soluções em TI vieram na esteira de problemas de hardware e portabilidade (dos PCs), educação, comunicação (Internet), robótica, medicina, questões bélicas etc. A TI foi a ferramenta da “consequência”, não da causa! Geralmente os problemas estão no algoritmo, não na codificação. Sendo transversal, poderia ser vista como um commodity. Por que não?

Porque não pensar a TI como uma espécie de commodity tecnológica, uma TechnoCommodity?

Em maio de 2016, sem nada pra fazer, comecei a “serendipar” em torno da tríplice hélice: “Por que não roda aqui? Será que posso desenvolver uma ferramenta de medição das forças que deveriam unir as três esferas da inovação prescritas por Henry Etzkowitz?”. Certo de que essas forças deveriam ser medidas em termos de artefatos tecnológicos, e de que o “sangue” que alimenta a inovação é, indiscutivelmente, a TI, pensei: “Se a TI é o catalisador da inovação e ela, a TI, está tão consolidada no globo, deve ser tratada como uma espécie de commodity. Sendo a TI tecnologia e commodity, deve haver um termo que reúna essas palavras. Vou “Googlar”! Passei os dedos no teclado em busca dessa palavra híbrida e nada encontrei. Pensei: “Será possível que o Google não consegue achar essa palavra?”.

Documento de registro da TechnoCommodity, ou TC.

Busquei no Yahoo, Bing, DuckDuckGo, StartPage, Qwant, SearX, Peekier, Firefox e nada! Decidi: “É minha. Ninguém tasca!”. Não acreditava que poderia ter inventado uma palavra que fazia algum sentido (Acho que vou registrar a-temático?!). Muito agitado, passei a descrevê-la:

“Definimos este elemento como TechnoCommodity ou TC, formado pela justaposição das palavras provenientes da língua inglesa Techno, contração de Technology, e Commodity, cujos conceitos individuais são conhecidos. A TC tem por atributos:

  1. Atomicidade: é indivisível e pontual.
  2. Portabilidade: uma mesma TC deve ser de fácil aplicação a diferentes contextos.
  3. Escalabilidade: quando houver necessidade de replicação, esta será de baixo custo.
  4. Inflexibilidade: cada TC é única!
  5. Perecibilidade: a tecnologia é altamente mutável, o que faz com que a TC herde esta característica.
  6. Proposta de Valor Contextual. Cada TC deve ser negociada conforme a aplicação.
  7. Ser de base tecnológica, desde baixa a alta intensidade.
  8. Resolutiva: tem de resolver um problema ou parte dele.
  9. Toda TC tem de ser do bem.”

Tem mais coisa: variantes, instâncias, modo de operação etc., mas isto é papo para outro dia!

Entrei na plataforma de meu “cumpadi” Valdecir “HoodId” Fontes  e fiz o registro com um bônus que ele havia me dado (Foi mal, brother. Achou que eu não usaria, né?). Aproveitei para depositar minha ideia “estupenda” na Wikipedia, registro que caiu por falta de manutenção. Mas a TC voltará com força total na plataforma IncaaS, pois servirá de criptomoeda para o circuito de jogos. Aguardem!

Assim, de hoje em diante, trato a TI como uma espécie de commodity (não ouso falar oficialmente em TechnoCommodity, pois carece de aprovação de pares e certificadores), já que hardware, linguagens, a codificação, o exercício de programação, são métodos padrão, diferindo em poucos aspectos. O que muda são os algoritmos, as ideias, o que reforça meu pensamento dela, a TI, como ferramenta e não fim.

Sendo a TI uma commodity, o que tem que ser feito então?

Investir em gente; em educação criativa, empreendedora; em educação algorítmica!!! Do mesmo jeito que a formação em TI deveria ser obrigatória em todos os cursos de todas as áreas do conhecimento, a formação em algoritmos também. Algoritmos e TI deveriam ser oferecidos em disciplinas separadas. O algoritmo cola a ideia às linhas de código! Algoritmo é criatividade, planejamento. TI é execução. A TI não é tudo: ela automatiza o algoritmo! Quem você acha que vem antes de quem?

As instituições de capacitação têm de flexibilizar suas grades (são prisões mesmo) disciplinares, de modo a permitirem a entrada do ar da inovação, coisa que já bati aqui em O que falta aos cursos das Sociais Aplicadas e Engenharias? . Quer mudar a Educação, pai, mãe, gestor, autoridade competente ou incompetente? Quer dar um tema à sua software house? Então comecem pelos algoritmos. Depois falamos em TI! (emoji com olho piscando aqui, rsrs). Sua avó já fazia algoritmos de bolo antes de você nascer! Refazendo a frase lá de cima, do “filósofo” medieval mais alto do vale da inPACTA:

Traga-me um algoritmo, e encontro um desenvolvedor pra convertê-lo em linhas de código.

Traga-me um desenvolvedor, e não saberei o que fazer com ele”. (Gláucio-San, MMXIX, Versão 2.0)

Referências

A coluna Empreendedorismo Inovador é atualizada às quartas-feiras. Gostou da coluna? Do assunto? Quer sugerir algum tema? Queremos saber sua opinião. Estamos no Facebook (nossaciencia), Twitter (nossaciencia), Instagram (nossaciencia) e temos email (redacao@nossaciencia.com.br). Use a hashtag #EmpreendedorismoInovador.

Leia a edição anterior: Lições tiradas do café empreendedor nº73

Gláucio Brandão é gerente executivo da inPACTA, incubadora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

 

Gláucio Brandão

6 respostas para “Embora imprescindível, a TI, Tecnologia da Informação, não é tudo!”

  1. Gilson Gomes disse:

    Muito bom texto professor, parabéns! Acredito que essa ideia de comoditização (ou comodificação) da TI tenha surgido quando Nicholas Carr escreveu um artigo para a Harvard Business Review intitulado: IT doesn´t matter (‘TI não importa’ ou ‘Isso não importa’) em 2003 e hoje em dia com o conceito de TI-Bimodal, traduzem bem a noção que TI é ferramenta BÁSICA e não DIFERENCIADOR COMPETITIVO das empresas.

  2. Excelente e provocador Amigo Glaucio.
    Pensava muito nisso há anos …
    A profissão do programador está se mantendo a mais anos do que imaginava.
    As criancinhas já começam a fazer em seus tablets.
    Nunca encarei TI como atividade FIM.
    A velocidade dos programas em busca da simplificação ainda vai aumentar em muito.
    Pensamento Crítico e Visão Sistêmica vão ser os diferenciais competitivos das pessoas.
    É o que sinto aínda com uma boa dose de ignorância na área.
    Renovo meus parabéns.
    Abs

  3. Pablo Lima disse:

    Vi uma vez uma pesquisa que apontava que 80% dos problemas de software são problemas de comunicação, o cliente pede uma coisa, o analista entende outra, o gerente de projetos, projeta outra, o arquiteto do software molda outra, o programador desenvolve outra… E se o cliente tivesse contato direto com quem desenvolve? Isso seria legal, o problema é que a maioria dos programadores foram fabricados para lidar com máquinas, não com pessoas… Se TI é meio para outras áreas inovarem, pq não aproximar os profissionais de outras áreas do mercado, para aumentar a empatia (e simpatia) dos programadores…

    Por outro lado, sempre é necessário que tenhamos profissionais com alta capacidade de foco, e para resolver problemas complexos, são necessárias longas horas atrás de um editor programando… Quem idealiza a inovação na maioria dos casos tem foco na embalagem, quem realiza (desenvolve) geralmente tem foco no produto, ambos são extremamente importantes… Particularmente tento andar no limiar entre embalagem e produto, entender como o produto será desenvolvido e como alcançará o público, isso as vezes me dá uma sensação estranha, nem sou tão bom programando, nem sou tão bom me relacionando com clientes e parceiros… Acredito que seja normal que em alguns profissionais sejam mais introvertidos, o que não é necessariamente um “defeito”…

  4. Gláucio Bezerra Brandão disse:

    Obrigado Gilson!
    Não conhecia o trabalho de Nicholas Carr . Agora que você me indicou, vou refinar meu pensamento com ‘o rapaz’.
    Grande abraço,
    Gláucio.

  5. Gláucio Bezerra Brandão disse:

    Grande amigo Amando, saudações!
    Esses são os novos focos: Visão sistêmica, Pensamento crítico e Criatividade.
    Você, como economista, tem uma visão de mundo muito mais ampla do que a minha, mas estou aprendendo.
    Grande abraço brother!

  6. Gláucio Bezerra Brandão disse:

    Isso mesmo, Mestre Pablo: ainda (nossa Educação) não aprendemos a definir sequência, problema, planejamento e execução. Mas estamos começando a abrir os olhos, por bem ou por mal.
    Vamos em frente!
    Grande abraço.

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