Ao introduzir uma complexidade maior na sopa genética, especialistas esperam aumentar as possibilidades de identificação de vida para além da terrestre
O DNA (ácido desoxirribonucléico) é um composto orgânico que armazena todas as informações genéticas que definem as características de qualquer ser vivo no planeta – cada um de nós recebe um gene (segmento de DNA) da mãe e outro do pai. A estrutura deste material foi desvendada por James Watson e Francis Crick em 1953, sendo seus elementos básicos as bases nitrogenadas, um açúcar (desoxirribose) e fosfatos. Desta forma, duas cadeias de fosfato passam a ser unidas por ligações de hidrogênio entre bases nitrogenadas: adenina (A), guanina (G), citosina (C) e timina (T). Para a organização do DNA, as desoxirriboses ficam ligadas e dispostas como o corrimão de escadas circulares enquanto que as bases nitrogenadas ocupam a posição de degraus. Neste caso, adenina é ligada à timina por duas ligações de hidrogênio, enquanto que a guanina faz uso de três ligações de hidrogênio para se juntar à citosina. Com isso, toda a ligação entre os blocos de sustentação de nosso DNA e a sua manutenção como uma dupla hélice são feitos pelas quatro bases, representadas por letras ACTG.
Em artigo publicado no mês passado na revista Science o grupo de pesquisadores liderados pelo norte-americano Steven Benner introduziu uma complexidade maior nesta sopa genética, adicionando quatro novas letras no código do DNA (Z, P, S e B). Este DNA de oito letras (do japonês DNA Hachimoji) mostrou estabilidade ao ponto de ser sintetizado e ligado a uma proteína luminescente.
A diferença básica entre as ligações das bases Z, P, S e B relativamente às A, C, T, G se refere à utilização das propriedades hidrofóbicas destas bases, posicionando-se intercaladamente às bases naturais.
A etapa seguinte dos estudos com DNA Hachimoji se refere aos ensaios com células vivas. A construção de novos elementos como proteínas com novas funções além da própria replicação deste DNA são etapas críticas que prometem revelar grandes saltos científicos em um futuro próximo.
Neste ponto, o leitor já pode ter feito a pergunta: mas para que produzir um DNA tão estranho?
Além do interesse da NASA em sintetizar um “DNA alienígena” – expandindo o numero de bases de 4 para 8 e aumentando as possiblidades de identificação de vida para além da terrestre, este processo pode permitir com que o DNA sintético possa ser ligado a outras moléculas e ajude-nos a resolver problemas bem mais sérios, como a cura do câncer. À medida em que mais propriedades deste novo bloco de construção venham a ser conhecidas, mais próximos estaremos de implementar aplicações mais revolucionárias.
E mesmo na era de DNA alienígena, a velha máxima científica continua válida: a ciência básica sempre à frente da ciência aplicada e esta, por sua vez, segue à frente da tecnologia.
Artigo na revista Science – Hachimoji DNA and RNA: A genetic system with eight building blocks
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Helinando Oliveira é Professor da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf) desde 2004 e coordenador do Laboratório de Espectroscopia de Impedância e Materiais Orgânicos (LEIMO).
Helinando Oliveira
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