A lição de empreendedorismo é de Lucimar Lima, que está patenteando um produto inovador contra piolhos, enquanto cursa o Mestrado Profissional na ECT/UFRN
A vida de Lucimar Lima sempre foi marcada por desafios. Após interromper os estudos quando criança, viu na profissão de cabeleireira a oportunidade de voltar a estudar e crescer profissionalmente. Mas, ela não poderia imaginar que uma receita caseira a levaria ao desenvolvimento de um produto inovador contra piolhos – o Capit-X – e ao Mestrado Profissional em Ciência, Tecnologia e Inovação da Escola de Ciências e Tecnologia (ECT/UFRN). Em entrevista ao Nossa Ciência, essa potiguar de 40 anos contou sua trajetória empreendedora e seus planos para o futuro.
Nossa Ciência: Como você tomou a decisão de voltar a estudar?
Lucimar Lima: O que me levou de volta a sala de aula foi a insistência do meu esposo, ele falava que eu deveria continuar os estudos, pois eu seria uma ótima advogada. Além disso, eu desejava fazer um curso técnico de estética, porém a exigência principal era o ensino médio completo. Então, decidi aceitar a sugestão. Enquanto eu estudava o meu marido cuidava das crianças, que ainda eram muito pequenas. Cursei parte do ensino fundamental na Escola Municipal João Paulo II, em Natal(RN), através do Projeto Acreditar e parte na Escola Estadual Professora Maria Araújo em Pium, no município de Parnamirim, próximo a Natal.
Iniciei o ensino médio na Escola Estadual Professor Crisan Simineia, onde conheci a assistente social Danilma de Medeiros que na ocasião estava divulgando o ensino técnico integrado na modalidade EJA (Educação de Jovens e Adultos). Ela me desafiou a participar do processo seletivo e eu aceitei o desafio. Passei e no segundo semestre de 2009 comecei a estudar no IFRN – Instituto Federal do Rio Grande do Norte – no Campus Natal – Zona Norte. Em 2011, participei do Enem e obtive o certificado equivalente ao ensino médio, mas eu precisava do conhecimento, então continuei os estudos no IF ao mesmo tempo em que me matriculei no Curso Tecnólogo em Estética e Cosmética na UnP – Universidade Potiguar. Daí, ficou assim: pela manhã laboratório, à tarde ensino médio e à noite universidade, a rotina só pôde ser mantida devido ao trabalho de equipe que minha família (esposo e filhos) desempenhou.
NC – E sua trajetória profissional? Que trabalhos já se dedicou?
Lucimar: Eu enfrentei muitos desafios por não ter nem o ensino fundamental completo. Encontrar um emprego era muito difícil, então precisei me virar para ajudar ao meu esposo com as despesas da casa. Fui babá, fotógrafa (profissão do meu esposo quando o conheci), costureira, diarista, salgadeira (fazia salgado juntamente com o meu esposo), caseira, técnica em máquinas fotográficas (segunda profissão do meu esposo), pedicura e manicure, atualmente atuo como cabelereira e esteticista. Nos finais de semana e feriados eu trabalho no meu salão de beleza.
NC – Como você chegou ao mestrado na ECT/UFRN?
Lucimar: O mestrado foi um presente de Deus, como tudo em minha vida. Eu fiquei sabendo do processo seletivo através do meu orientador e parceiro de pesquisa, professor Roberto Lima. Ele me comunicou que um médico pesquisador estava interessado no meu projeto. Ele me orientou a participar da seleção do Mestrado Profissional em Ciência, Tecnologia e Inovação da ECT/UFRN. Não havia passado pela minha cabeça que um dia eu chegaria tão longe, não na academia. Participei de todas as etapas do processo seletivo e fui aprovada em todas, graças a Deus.
NC – De onde surgiu a ideia do produto contra piolho?
Lucimar: No sétimo período do curso Técnico em Comércio os alunos são convidados a desenvolverem um produto ou serviço que consista em uma inovação tecnológica. No inicio eu não sabia o que fazer, mas enquanto aguardávamos o início da aula de química no laboratório, eu ouvi o professor Roberto dando instruções a um grupo de pesquisa que desenvolvia produtos biodegradáveis. Então, acendeu aquela luzinha! Lembrei-me de uma receita de família para combate ao piolho e logo comecei a perguntar ao professor, se havia a possibilidade de transformar a receita em um produto para ser apresentado no encerramento da disciplina de Estratégia Empresarial. Falei para ele da dificuldade que as mães enfrentavam para catar os piolhos e lêndeas e o novo produto poderia ajudar a resolver esse problema. Ele me pediu calma, pois quando voltasse de um evento para o qual estava de partida me ajudaria a desenvolver o produto. Eu não pensei que aquela simples receita que eu aprendi no dia a dia me levaria tão longe.
NC – O que é e como funciona seu produto?
Lucimar: O produto se chama Capit-X e o ativo principal dele é a quitosana. Este ativo é obtido da quitina, componente que compõe a carapaça dos crustáceos. É fungicida que é aplicado no cabelo em forma de loção, após alguns minutos o solvente evapora e o produto se transforma num gel que aprisiona os parasitas, dificulta a movimentação dos parasitas e facilita a soltura dessas lêndeas, desses ovos dos fios de cabelo.
NC – Ele foi patenteado?
Lucimar: Sim, o depósito de patente foi realizado no final de 2015. Meu professor disse que o processo de uma patente não é algo simples. Ele explicou que a cada 5 anos numa universidade, um doutor consegue registrar uma patente, então não é coisa que acontece todo dia e toda hora.
NC – Qual a diferença (a inovação) desse produto em relação ao que há no mercado atualmente?
Lucimar: O Capit-X é produzido a partir de ativos biodegradáveis, biocompatíveis, atóxicos e por isso o produto não oferece risco ao consumidor. Tem tripla ação: combate às formas adultas e ninfas do piolho e impede a reinfestação por remover as lêndeas, tem ação cosmética além de favorecer o processo cicatricial. Não tem ação pediculicida ou ovicida, isso elimina o problema de resistência que os piolhos vêm apresentando aos tratamentos. A maioria dos produtos que existem no mercado são tóxicos, feitos para matar os piolhos.
NC – O que falta para seu produto chegar às prateleiras das lojas?
Lucimar: Antes de disponibilizar o produto para o consumidor, é necessário cumprir com algumas exigências legais. No momento, o projeto será submetido ao comitê de ética, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e só depois será realizada a validação do produto junto ao consumidor.
NC – Você se considera uma empreendedora?
Lucimar: Sim, eu me considero uma empreendedora. Pois ser empreendedor é ter criatividade, inovar, ser ousado, ter iniciativa e buscar controlar resultados para obter sucesso em seu empreendimento. E este é o meu perfil.
NC – O que diria para alguém que está pensando em seguir esse caminho?
Lucimar: Eu diria: esteja sempre disposto a aprender, não desista no primeiro obstáculo, mas continue lutando e acima de tudo procure se divertir com as novas descobertas. Descobrir algo novo é fascinante, mas poder transformar o novo em beneficio para a sociedade faz toda diferença!
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