Em tempos de startup, como definimos um produto? Disruptiva

quarta-feira, 14 novembro 2018

O professor Gláucio Brandão explica o longo caminho de uma ideia antes de chegar ao Mercado

Em artigo passado, apresentei um conceito do que entendo por cliente universal, o qual eu abreviei por PATOV. Claro que não é “pato” em russo, mas uma tentativa de tornar explícito quem realmente são os nossos clientes: Paladar, Audição, Tato, Olfato e Visão, aqueles que, ao final do propósito de qualquer startup, pagam pelo pato.

Esclarecido o “pagador do pato”, vamos agora definir os itens que todo bom pato, ou melhor, produto deve ter. Entenda-se aqui produto por qualquer entrega, seja um equipamento, um sistema, um serviço ou um processo. Assim, com um conceito também universal de produto, fechamos os dois lados de um modelo de negócio: “O que” e “Para quem”.

Quem cria um produto precisa saber que ele hoje não está mais contido em sua própria definição, porém em uma conceito mais estendido, o qual eu sempre desenvolvo em aulas ou projetos. Eu utilizo o termo produto como sendo a soma dos elementos Ideia, MVP e Tração. Vamos então a cada um deles.

Ideia

Essa é a parte mais fácil do produto. Os problemas, as oportunidades, as anomalias oferecidas pela mundo nos dão essa ignição. Quando a inércia psicológica trava tudo, existem formas de estimular a criatividade (Como criar criatividade). Assim, ter uma ideia não significa ter um produto. Ter um produto não significa ter um startup. Ter uma startup não significa ter vendas. Tudo isso tem de obedecer a uma logística, a uma conexão com o cliente, a quebras de barreiras, sem contar com desejos e necessidades de um nicho.

Quando as pessoas me procuram para desenvolver um projeto baseado em uma ideia, não rejeito qualquer uma delas, pois elas – as ideias – não possuem tamanho nem grau de importância, além do fato de não sabermos se vingará ou não. Alguma dúvida? Veja o produto, não muito cheiroso, do maior vendedor do ano de 2016 do MercadoLivre: Bosta em Lata. Ou essa ultra tecnologia dura que transformou seu criador em milionário. Voltando às ideias, acato todas as ideias e convido para um bate-papo. Nesse meeting, que não levamos mais do que uma hora, explico “meus conceitos” de produto e cliente e passo uma TPL (Tarefa Para o Lar): tente preencher as nove seções do lean canvas e me mande pela rede. À medida que o interessado vai completando a TPL via uma plataforma de desenvolvimento de modelos de negócio chamada Canvanizer, vou acompanhando à distância até que a sombra de um produto emerja. Chegado nesse ponto, é hora de conversarmos outra vez.

MVP

De posse da ideia, vamos ao MVP, que é a sigla de Minimum Viable Product e significa produto mínimo viável. É uma prática de administração de empresas que consiste em lançar um novo produto ou serviço com o menor investimento possível, para testar o negócio antes de aportar grandes investimentos (Wikipedia). Apesar de muitos confundirem, o MVP não é um protótipo apenas. O protótipo pode ser considerado a primeira modelagem de algo; um primeiro rascunho. Pode-se dizer que o protótipo é feito para que o seu inventor aprenda, se aproprie dos conceitos envolvidos no produto. Já o MVP é feito para que você “aprenda” e entenda o Mercado. Logo, todo MVP tem de conter um protótipo. Nem todo protótipo pode ser um MVP.

Muitos acham que um MVP necessita de um protótipo rebuscado. O Dropbox, por exemplo, conseguiu seu primeiro investimento de U$ 250 milhões apresentando um MVP em Powerpoint a interessados sem sequer ter um protótipo, mostrando apenas suas funcionalidades. Na contra-mão, vários protótipos acabados mostraram-se falhos em testes finais.

Assim, criar um MVP é testar algo junto ao Mercado apresentando a este as funcionalidades imprescindíveis para o seu produto. É ouvir o Mercado. É basear-se em premissas, não promessas.

Bullseye ou Alvo.

Tração

Essa é a parte mais difícil do produto. Como adivinhar o que o cliente quer? Como quebrar as barreiras do Mercado? Como viralizar? Como criar contágio? Como criar uma conexão emocional? Como criar uma marca? Como contar uma estória bonita e que cole? Como convencer influenciadores a apoiarem meu produto? Como transformar meus primeiros usuários em vendedores? Como retê-los? Como criar um modelo de vendas replicável? Como desenvolver a publicidade? Como saber se está dando certo, se estou ganhando tração? Como fazer palestras de aderência? Como me apresentar em feiras? Como desenvolver formulários de validação? Em quais blogs devo disponibilizar meu negócio? Até quanto tenho que investir na tração de meu negócio? Como usar as Search Engine Marketing (SEM), ou “pagamentos por cliques”, cuja plataforma Adwords do Google fatura em torno de U$ 100 milhões por dia? Faz sentido usar email, plataformas sociais, whatsapp, telegram, Twitter, YouTube, SMS ou, resumidamente, Social Ads? Devo investir em mídias offline, rádio, TV, revistas, jornais, páginas amarelas etc.? Tento a fidelização?

Coloquei os possíveis canais de tração em forma de perguntas, pois esse deve ser o procedimento: testar os canais! Bom, se alguém disser que sabe a resposta, olhe com desconfiança, pois é um aventureiro. Entretanto, vou deixar aqui algumas dicas, baseadas na estratégia de Peter Thiel (Facebook e PayPal), chamada Bullseye, ou alvo em inglês. Em rápidas linhas, ele sugere que se deve abordar os canais de tração dos círculos de fora para dentro: Externo (O que é possível); Central (O que é provável); e Interno (O que dá certo).

E como estratificar cada um destes canais em seus respectivos círculos? Bom, testando, falando com empreendedores que já viveram essas experiências e registrando o resultado de cada um deles, para cada estágio das vendas.

Assim, quando alguém disser a você que tem um produto, pergunte: existe tração? Se a resposta for negativa, seu interlocutor só tem um sonho, e o que ele acha que é produto vai, literalmente, morrer na praia.

Referências

A coluna Empreendedorismo Inovador é atualizada às quartas-feiras. Gostou da coluna? Do assunto? Quer sugerir algum tema? Queremos saber sua opinião. Estamos no Facebook (nossaciencia), Twitter (nossaciencia), Instagram (nossaciencia) e temos email (redacao@nossaciencia.com.br). Use a hashtag #EmpreendedorismoInovador.

Leia a edição anterior: Por quem as grandes empresas choram …

Gláucio Brandão é gerente executivo da inPACTA, incubadora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

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