Para o professor Gláucio Brandão os empregos formais estão com os dias contados, a Indústria 4.0 busca por startups
Muito já se fala sobre a Sociedade sem Empregos, fruto da automatização dos processos, da capacitação humana em série e unipolar, na qual as escolas tentam desenvolver habilidades iguais nos pupilos para que estes resolvam problemas diferentes e concorram pelas mesmas vagas; do crescimento populacional; da falta de investimento na cadeia produtiva em troca da especulação financeira; da virtualização de muitas coisas que antes eram físicas: jornais passando para o mundo digital, hotéis deixando de serem construídos e dando espaço ao aluguel de casas ociosas; ensino a distância multiplicando os instrutores exponencialmente etc. etc. etc., mas não se fala muito sobre “o fim dos problemas” e, como consequência, “o fim do trabalho”!
Então temos que pensar assim: “o fim dos empregos” não é sinônimo de “o fim dos trabalhos”. Ufa, ainda bem! Então, o que foi trocado e como devemos nos adaptar?
O profissional de ontem
Há algum tempo atrás, a forma de contratação das empresas se dava através da busca por super-seres, capazes de se adequarem à empresa em 24h, resolverem qualquer problema da empresa pré-existente, proporem novos produtos em 48h, criar um “delta” de lucro em 3 meses, levarem as crianças do chefe para escola e passear com o cachorro, e ainda voltarem a tempo de salvar o mundo, desde que não encontrassem kriptonita pelo caminho, claro. Era necessário ter uma formação ímpar e currículo impecável, moldada à base de feldspato e ao mesmo tempo flexível como água.
Brincadeiras à parte, este super-ser era buscado justamente porque a empresa não tinha condições de moldá-lo. Através de processos caros, a empresa contratava o que de melhor aparecesse, agradecendo aos demais competidores com um insosso “Cadastro de Reserva”. E, claro, este super-ser estava limitado a não poder ocupar o lugar do chefe, este em uma categoria maior, chamada de Chefia, tendo assim uma vida profissional cujo ápice do desejo seria estar nessa outra categoria dentro de uns 20 anos. Frustrante!
O profissional de hoje
Na era moderna passamos por quatro grandes revoluções industriais: na primeira (1760-1840), deixamos os processos artesanais para as máquinas mecânicas, movidas a vapor. Na segunda (1850-1870), aumentamos a eficiência fabril utilizando máquinas a combustão e motores elétricos, favorecendo a produção em série. Na terceira (1960-201x), na qual ainda estamos imersos, as comunicações digitais colaram as máquinas próximas a nós a outras máquinas bem longe de nós, criando redes, das quais a maior é a Internet. Agora, segundo a German Academy of Science and Engineering, embarcamos na quarta revolução industrial, ou Indústria 4.0, a era das Fábricas Inteligentes. Isso mesmo! Conceitos como os de Sistemas ciber-físicos, Internet das Coisas e Computação em Nuvem ficarão mais comuns do que pendrive, CD player e pipoca Boku’s.
Todas as revoluções promoveram reformas sociais dantescas, pois os envolvidos não se deram conta do momento, levando a um grande hiato inercial até à adaptação que custaram empregos e, até onde se sabe, vidas. Entretanto, estamos por perceber este momento. Precisamos (Academia) nos mexer mais rápido do que a Indústria. Assim, todo profissional hoje terá de começar a entender estes conceitos, pois temos que continuar mais inteligentes do que as máquinas e o próprio contexto. Desde as áreas sociais às humanas. Não vejo a Universidade brasileira abordando adequadamente essas questões. Tem-se que abrir espaços hoje para uma reforma não curricular, mas de postura, como o sugerido por mim num artigo sobre o novo mindset: Precisamos de estudantes 7.5.
Este é o profissional imprescindível para a nova era: aquele que se antecipa aos problemas que a Indústria ainda não sabe que vai ter e, de quebra, entrega as respectivas soluções.
A nova relação negocial
Mas como se resolve “Problemas que a Indústria ainda não sabe que vai ter”? Vou explicar!
Dando uma rápida navegada na Internet, descobrimos facilmente como as grandes corporações estão aumentando sua competitividade em tempos hodiernos. A Alphabet, holding que contém a Google, foi criada por esta última para facilitar as relações negociais entre as empresas que vêm comprando dia após dia. A Tesla, uma das empresas mais inovadoras do mundo, acabou de comprar a empresa alemã Grohmann Engineering para aprimorar sua própria automação. A IBM acaba de comprar a Red Hat, com intuito de avançar na computação em nuvem. A gigante Microsoft comprou o jogo (que eu adoro) Minecraft, criado por um único “cara”, por U$ 2,5 Bi. E, por estas bandas, existe um grande player do petróleo que está investindo em – adivinhem? – startups. Sim, a Petrobras está investindo alguns bilhões, não no recrutamento de pessoas, mas em empreendimentos inteligentes. Vou parar por aqui, pois vocês já sabem onde quero chegar.
O que eu quero dizer é que não adianta mais só colocar uma placa de “Departamento de Inovação” em uma grande empresa e esperar que a inovação aconteça. A criatividade das corporações possui limite. Hoje, até as pequenas empresas estão se fundindo a outras de mesmo porte. As novas relações estão deixando de ser de trabalho (patrão-empregado) e passando a ser negociais (empresa-startup). Ou seja: os dias dos empregos estão contados. Os dos problemas não! Trabalho não vai faltar, desde que estejamos preparados para ele.
Assim, quando eu falo que se pode resolver problemas que a Indústria ainda não sabe que vai ter, falo em observar o mundo à sua volta e criar um empreendimento para resolvê-lo; criar Mercado novo; criar um empreendimento que possa ser comprado, ou tocado. Isso pode e tem de ser feito em tempo-de-universidade e vale para produtos, processos ou serviços. Ou seja: quando as grandes corporações olharem para aquela pequena startup ou empreendimento universitário verão o problema e a nova solução que ela mesma criou. A isso damos o nome de Nicho de Mercado. E dirão: nós queremos esse problema e, claro, a solução junto! E, de quebra você ainda pode ser o próprio CEO desse Departamento de Inovação recém adquirido!
Temos que pensar em criar empreendimentos que geram soluções de alta-intensidade, e não tecnologias de alta-intensidade exclusivamente. Fornecemos alguns caminhos. Nosso Mestrado de Inovação é um deles.
Respondendo ao título: as grandes corporações não estão mais atrás de super-seres, imunes à kriptonita. Elas choram por startups!
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Leia a edição anterior: Inovação aberta, a evolução da Universidade e da Indústtria
Gláucio Brandão é gerente executivo da inPACTA, incubadora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Gláucio Brandão