O professor Helinando Oliveira mostra como a ciência pode ser acessível às nossas crianças
Os shoppings centers de todo Brasil descobriram uma forma fácil de ganhar dinheiro – oficinas de slime. Com mistura de cola, gliter, água borada e outros componentes, as oficinas levam crianças de todas as idades a fazer Química. E elas nem percebem. Enquanto esperava em uma destas filas, imaginei como a ciência pode ser acessível às nossas crianças. E o quanto de empolgação elas têm em fazer ciência.
A grande dificuldade é adequar a linguagem da ciência aos termos que mantenham a atenção delas. Motivado por minha filha de 4 anos que concluiu que meu trabalho é receber papéis dos meus alunos para riscá-los, resolvi então montar um experimento para meus filhos e na coluna de hoje quero compartilhar com vocês. Afinal, como explicaríamos a uma criança no ensino fundamental, por exemplo, o que é nanotecnologia?
Os átomos de carbono dispostos em folhas monoatômicas formam os grafenos, que ao serem dobrados (tal qual pequenos charutos) formam os nanotubos – que podem ter paredes simples, poucas ou múltiplas. Cada uma destas estruturas abre um leque enorme de aplicações que seguem desde a eletrônica até a engenharia de alimentos. Atualmente já é comum tratar a nanotecnologia como sendo uma área consolidada e importante para a vida de todos nós, embora muitas pessoas tenham dificuldade em entender o conceito básico. Afinal, para que coisas tão pequenas?
Certamente não falaremos de Mecânica Quântica nem tão pouco das escalas submicrométricas para explicar este fenômeno. Precisamos de exemplos práticos. O cálculo da área superficial pode ser um deles.
Para provar isto, podemos partir de um pote de massa de modelar ou mesmo o slime. Sabemos que a área superficial de uma esfera é 4πR2. Então, se produzirmos uma esfera de 2 cm de raio de massa de modelar precisaremos de 16π cm2 de tinta (ou seja, algo em torno 50 cm2) para cobrir toda a esfera com tinta guache. Se tomarmos, no entanto, o mesmo volume de massa de modelar (32π/3 cm3) e dividirmos em duas partes iguais de volume 16π/3 cm3, veremos que cada uma delas passará a ter uma área de aproximadamente 31,65 cm2. Se quisermos pintar as suas superfícies com tinta guache precisaremos de 63,3 cm2. Perceba que tínhamos 50 cm2 na primeira esfera, que foi dividida igualmente em duas – o que aumentou a quantidade de tinta necessária para pintura.
Se dermos mais um passo com esta brincadeira e dividirmos o volume inicial em 4 partes iguais (cada esfera teria 8π/3 cm3) veremos que a área superficial de cada uma passara a ser de 19,93 cm2. Se quisermos pintar todas estas esferas precisaremos de quase 80 cm2 de tinta!
Ou seja, quanto menores as esferas, mais tinta se faz necessário para pintá-las. Ao invés de falar em área pintada, podemos simplesmente pesar a tinta que sobrou no pote e mostrar que mais tinta foi usada para cobrir as esferas cada vez menores.
E por indução podemos fazer uma tarefa imaginária, supondo que se esta divisão continuar a ser feita, muito mais área estará disponível na superfície das bolinhas de massa de modelar. Ou seja, quanto menor o raio, mais área teremos para fazer o que quisermos – pintar ou decorar com outras coisas pequeninas.
Não é à toa que Feynman dissera: “Há muito espaço lá embaixo”.
Ou seja, o segredo da nanotecnologia está na área disponível que se tem ao manipular átomos. Quanto menor os blocos, mais área para aproveitar os diferentes mecanismos nesta escala.
E daí surgem os novos sensores biológicos, marcadores, baterias, supercapacitores, célula combustível e tudo mais.
E deste mergulho nas coisas pequenas, as grandes descobertas passam a se revelar. Há o infinito das estrelas e o infinito das coisa pequenas. Se olharmos para baixo veremos um céu tão estrelado quanto este lá de cima. O micro e o macro, juntos.
A coluna Ciência Nordestina é atualizada às terças-feiras. Leia, opine, compartilhe e curta. Estamos no Facebook (nossaciencia), Twitter (nossaciencia), Instagram (nossaciencia) e temos email (redacao@nossaciencia.com.br). Use a hashtag CiênciaNordestina.
Leia o texto anterior: O Brasil de Darcy Ribeiro
Helinando Oliveira é Professor da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf) desde 2004 e coordenador do Laboratório de Espectroscopia de Impedância e Materiais Orgânicos (LEIMO).
Helinando Oliveira
Deixe um comentário