Para Fernando Peregrino, vice-presidente do Conselho Nacional das Fundações de Apoio às Universidades, esse é o principal avanço da nova lei 13.243/2016
Vindo de Belém, onde participou do II Encontro Norte-Nordeste das Fundações de Apoio às Instituições de Ensino Superior e de Pesquisa Científica e Tecnológica (Ennfaies), Fernando Peregrino chegou a Natal para também falar sobre o Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação. Em entrevista exclusiva ao Nossa Ciência, ele detalhou alguns aspectos da nova lei como os principais avanços e as novidades que ela traz para o cenário nacional, sobretudo para as fundações de apoio às universidades e a aceleração da inovação no Brasil a partir de novas formas de cooperação universidade/empresa.
Mestre e doutor em Engenharia de Produção pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o paraense Fernando Otávio de Freitas Peregrino é vice-presidente do Conselho Nacional das Fundações de Apoio às Universidades (CONFIES) e diretor executivo da Fundação COPPETEC. Ele integra o conselho da Fundação Darcy Ribeiro e atua na COPPE/UFRJ, desenvolvendo estudos para o Mestrado e Doutorado sobre modelos das organizações sociais para o setor de ciência e tecnologia, e os impactos do fator Confiança na implementação de políticas públicas.
De acordo com Peregrino, o objetivo do Marco legal é acelerar as mudanças no país, além de regular a integração entre agentes públicos e privados que compõem o sistema de ciência, tecnologia e inovação, incentivar a pesquisa e o desenvolvimento científico e tecnológico brasileiro a partir da redução da burocracia, aproximando as universidades das empresas, dinamizando a pesquisa, o desenvolvimento científico e tecnológico e a inovação no país.
Nossa Ciência: Qual o principal avanço que este Marco está trazendo para o cenário científico do país?
Fernando Peregrino: Pela primeira vez há uma lei que decorre de uma revisão constitucional, que ocorreu há um ano, que põe a inovação como uma função de Estado. Anteriormente, na Constituição de 88, o capítulo da ciência e tecnologia dizia que o Estado deveria promover a pesquisa científica, a formação de recursos humanos e dar apoio aos que dela se ocupavam. Agora não, a revisão que nós fizemos com o Parlamento, digo nós, pois foram mais de 70 entidades que colaboraram durante quatro anos com essas revisões da legislação, atualmente o capítulo da ciência e tecnologia da constituição põe a inovação como uma função de Estado, não só mais a ciência, porque a ciência pela ciência ela fica circunscrita a um certo universo. A inovação já é um produto a mais do conhecimento, dos avanços do conhecimento. Eu acredito que tanto a revisão constitucional, a Emenda Constitucional 85/2015, que foi promulgada em fevereiro de 2015, quanto lei 13.243, chamada Marco da Ciência e Tecnologia, elas promovem o aparato legal de colocar a inovação como uma meta de todos os agentes, públicos e privados, estaduais, federais e municipais, todos tem a obrigação de contribuir com isso. Então, essa é uma boa notícia.
NC: O Marco vai ajudar a aproximar as universidades das empresas e vice-versa? Teremos mais cientistas empreendedores e empreendedores cientistas?
FP: A ideia é essa, é desobstruir o caminho da universidade com o sistema empresarial e essa desobstrução está durando muito tempo, mas acho que ela só vai ocorrer na sua plenitude quando alguns parâmetros da nossa economia andarem, pois por enquanto o Brasil é um país que não demanda por inovação no seu sistema empresarial, visto que grande parte dos nossos produtos, cujo insumo principal é a tecnologia, vem de fora. Além do que, o incentivo ao investimento empresarial que é vital para a inovação se completar, esse investimento é desestimulado pelas políticas macro econômicas vigentes há muitos anos. Por exemplo, essa alta taxa de juros faz com que o empresário ao invés de colocar recursos na inovação e completar uma pesquisa que vai virar um produto final, ele prefere colocar num título do tesouro que vai remunerá-lo, sem risco nenhum, 15% ao ano. Essa é uma taxa de retorno muito elevada, poucos empreendimentos tecnológicos vão dar um retorno dessa monta, além do que um empreendimento tecnológico requer risco, pode ser que não dê certo. Então, esses fundamentos macro econômicos se não mudarem nosso país ainda ficará em péssima colocação como está hoje, 70º lugar em inovação, em relação a outros países.
NC: Em 2010, a comunidade científica criticou o Marco dizendo que ele era fragmentado e não dialogava harmonicamente com o restante da legislação, você concorda com isso?
FP: O Marco na verdade é uma revisão, uma consolidação de um conjunto de leis, são nove leis que ele revisa, a lei de inovação, de importação, de licitação, do estrangeiro, entre outras. Ele revisa e consolida, reafirma conceitos. Na legislação anterior havia muita ambiguidade, o Marco reafirma conceitos para deixar tudo pacificado entre os agentes públicos e privados e os órgãos controladores, pois há órgãos controladores que podem interpretar o oposto do que eu estou pensando. Então, a lei tem que convencê-los, senão nada vai dar certo. O Marco veio para reafirmar e melhorar coisas e poucos conceitos novos.
NC: Você falou em órgãos controladores, isso lembra burocracia. O Marco vai ajudar com os entraves da ciência brasileira?
FP: A burocracia, depois desse fundamento econômico equivocado que o Brasil trilha das taxas de juros muito elevadas, é o segundo problema que eu vislumbro. A burocracia, a formalidade, a rigidez, o excesso de controle nessa atividade ela é muito perniciosa, porque a inovação é produto das mudanças e de uma velocidade altíssima. Nós não estamos mudando passo a passo, mudamos dez passos de uma vez. A inovação é muito veloz, então como eu vou criar um dispositivo legal agora que não servirá mais daqui a pouco? Se não tivermos flexibilidade, nós não vamos dar conta da inovação como ela deve ser, como os outros países estão fazendo. O controle tem tornado muito rígida essa atividade, tem atrapalhado e dificultado muito a vida dos pesquisadores.
NC: O país vive um momento difícil, qual sua análise sobre essa crise?
FP: Nós estamos vivendo uma crise econômica muito grave, não se recupera uma economia de uma hora para outra. Nós já vínhamos descendo há muito tempo. Aproveitamos um período muito especial chamado “ciclo das commodities” onde a nossa economia se remunerou bem, porque os países grandes estavam crescendo, estavam comprando os nossos produtos, mas a partir desse momento, que não temos mais isso, nós estamos em grandes dificuldades. Nós não fizemos nosso dever de casa que é criar uma economia mais autossustentada, menos dependente das estruturas externas, menos vulnerável, portanto.
Para saber mais sobre o Marco legal da Ciência, Tecnologia e Inovação acesse aqui.
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